Casca de
banana?
O
dia em que o governo e os nossos governantes não ocuparem tanto espaço em nossas
mentes será sinal de que as coisas, finalmente, entraram nos eixos. Boa parte de
nossas paranoias (não todas, é claro) estariam eliminadas. Estamos longe disso.
Os políticos, e em especial os que “estão” candidatos, nos obrigam a um estado
de alerta permanente com suas ideias (?), propostas e, o que é pior, decisões.
Nem
sempre é fácil decifrar o que está por trás daquilo que dizem e fazem. E é
preciso reconhecer que, muitas vezes, somos profundamente injustos ao
interpretar como má fé aquilo que, na realidade, não passa de desconhecimento de
causa ou incompetência administrativa. Sim, às vezes os seus erros nada mais são
do que burrice.
Ocorre,
contudo, que o inventário de malfeitos na trajetória republicana é tão extenso
que realimenta o cacoete paranoide. Portanto, na contramão do benefício da
dúvida para a qual o senso de cidadania muitas vezes nos impele, emerge, claro,
aquela sensação de que estamos prontos a pisar, novamente, numa casca de banana
sob o invólucro de nova norma regulatória.
Apesar de
seu caráter politicamente correto, ou pretensamente correto – o que certamente
visa a desestimular qualquer reação ou questionamento – novas normas não raro
camuflam o que não nos convém. E aqui vamos nós de novo.
Há poucos
dias a presidente Dilma Rousseff esbravejou com o fato de a imprensa - que no
Brasil é livre por força de princípio expresso na Constituição - ter vazado
informações contidas no depoimento do delator da Operação Lava Jato, o
ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.
Na
ocasião, a presidente disse que o papel da imprensa não era o de investigar, mas
simplesmente o de informar – um equívoco (só isso mesmo?) conceitual que mereceu
um longo artigo neste Blog, no último dia 24, sobre o papel da imprensa
(texto mais abaixo). Sem nos alongarmos no que já foi exaustivamente
comentado, vale dizer que o papel da imprensa é, antes de tudo, o de investigar.
Mais: jornal que não opina, só publica versões e transcreve declarações, não
merece ser lido.
Em menos
de uma semana a presidente e candidata retomou o assunto, mas dessa vez sob
outro viés. Não falou em “controle social da mídia” ou “disciplina da opinião
jornalística”, eufemismos já muito empregados por seu partido e que, na prática,
significam censura. Evitou qualquer menção ao conteúdo das notícias ou aos
métodos empregados pelos meios da comunicação – entre os quais a inalienável
investigação – no trabalho de produzir (grifo meu) noticiário. Ateve-se a
uma questão mercadológica.
A forte
concentração de poder econômico, afirmou a presidente, é prejudicial à
democracia. E é verdade. O setor mereceria um choque de concorrência que
promovesse a pluralidade dos meios – e, por consequência, de opiniões (tema
de comentário do dia 25, neste blog). Porque o problema não está em um grupo
de comunicação se opor ao governo. O problema é termos poucos grupos de
comunicação, contrários ou não aos governos.
A
discussão é, mesmo, de regulação de mercado, de capitalismo de mérito: medidas que possam ampliar a
concorrência entre empresas de jornalismo, assim como é feito, por exemplo, nos
segmentos de cervejas ou de aviação.
A questão
é saber se um governo e um partido que sempre se manifestaram contra a imprensa
de caráter privado, por entendê-la como “burguesa” (seja lá o que isso
signifique em pleno século XXI), poderá estabelecer uma regulação do setor que
não acabe por amordaça-lo. O que se pretende é uma saudável concorrência, com
pluralidade de meios e opiniões, não censura oblíqua, disfarçada de norma
econômica. Os exemplos da Venezuela e da Argentina autorizam os nossos temores.
Fiquemos atentos às cascas de banana.
Por
Nilson Mello
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