segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

O artigo da última postagem (sexta-feira 09/12) atribui a crise europeia à irresponsabilidade fiscal de alguns países. O link abaixo traz um artigo pertinente, do economista Raul Velloso, sobre a distinção entre o déficit fiscal europeu e o que Brasil alimentava até 1998, quando os governos estaduais foram obrigados a para de usar “seus” bancos para gerar dívida.
A propósito da austeridade fiscal é preciso lembrar que a Alemanha, num momento extremo, também promoveu "impulsos fiscais" e recebeu ajuda externa no pós-Guerra, sobretudo via Plano MacArthur. Mas os recursos foram disciplinarmente aplicados na reconstrução do país e na reorganização de sua economia dentro de parâmetros de mercado.

Link para artigo de Raul Velloso sobre déficit fiscal: http://www.linuxfacil.net/consulcorp/2011/12/12/sem-tempo-para-chorar/

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Artigo

A ideologia e o impasse europeu

   Governos sem moedas próprias são governos desarmados, afirma o cientista político Valter Duarte Ferreira Filho, em texto de conferência proferida recentemente na UFRJ (*). Por essa razão, prossegue, o Fundo Monetário Internacional e a União Europeia propõem-se a “invadir” a Grécia, e também Portugal, Espanha e Irlanda, “com seus empréstimos em dólares e euros, cobrando medidas de austeridade e abertura para outros invasores externos: os comandantes do capitalismo internacional”.
    A discussão é mais do que pertinente tendo em vista o impasse desta quinta-feira (08/12), em Bruxelas, na reunião de cúpula dos países europeus, organizada para salvar não apenas o euro, mas a consolidação da unidade europeia.
    Para Ferreira Filho, enquanto os países ora em dificuldades continuarem a acreditar no sistema de mercado e no que ele chama de “representação despolitizada do dinheiro” - crença que, segundo ele, explicaria “tamanha imprudência política ao abrir mão da soberania monetária” – permanecerão sujeitos à “manipulação daqueles que podem e melhor sabem fazer uso do dinheiro, praticando o maquiavelismo monetário”.
    Ressalta o autor em seu texto, recorrendo a Alexander Del Mar: “O direito de cunhar moedas sempre foi e ainda permanece a mais inquestionável marca e manifestação da soberania”. Bingo. Passemos, então, aos esclarecimentos.
    Os que sabem fazer melhor uso do dinheiro são economistas, gestores, dirigentes de instituições multilaterais e líderes políticos, entre outros, que reconhecem a importância das regras de mercado, da qual a eficiência é um princípio inerente, no processo de desenvolvimento, ao invés de submeter às leis da ciência econômica (em especial, a da oferta e da procura) aos objetivos políticos, nem sempre límpidos e louváveis.
Valter Duarte Ferreira Filho deixou de considerar em sua análise, que tem 23 páginas e na qual citou ou fez alusão a 24 autores – um mix que vai de Stuart Mill a Marx; de Hobbes e Locke a Weber; de Keynes e Hayek – que uma economia é um sistema demasiadamente complexo para ser planejado por uma instituição central e deve evoluir espontaneamente, por meio do livre mercado.
E quem disse isso foi justamente Friedrich Hayek, Nobel de Economia que escreveu, entre outros, “A Desestatização do Dinheiro”, obra (curiosamente citada por Ferreira Filho) na qual revela sua preocupação com o uso político – ou seria “politiqueiro”? – da moeda e propõe que as emissões sejam feitas por organismos independentes dos governos.
Mas Ferreira Filho desconsiderou aspectos ainda mais importantes. O principal deles é que os países da União Europeia buscam ser, de fato, uma união plena, embora paulatina, e não apenas um conjunto de “soberanias” associadas, como ainda ocorre hoje. Isso está nas entrelinhas. Uma “soberania universal”, aliás, parece ser o caminho inexorável da própria humanidade, em futuro mais distante.
Outra omissão do autor: se os europeus pretendem manter-se unidos por meio de uma moeda forte, cujas vantagens são óbvias, precisam compartilhar, também, os seus pressupostos. Uma conduta fiscal responsável – redução de gastos e gestão eficiente dos recursos públicos – é o principal deles. Foi o que, entre outros fatores, tornou a Alemanha a maior economia da Europa e uma das quatro maiores do mundo, após sair devastada – econômica e moralmente – da Segunda Guerra.
Os países em crise, em especial Grécia, Espanha, Irlanda, Portugal, e agora também Itália, têm o direito soberano de não seguir o modelo. Mas, nesse caso, não terão mais como compartilhar um euro forte. A crise deixou claro que a união monetária depende de uma união fiscal, do reconhecimento a parâmetros fiscais mais claros e rígidos. A alternativa é a desestruturação da Zona do Euro e, consequentemente, o gradual enfraquecimento da União Europeia. É legitimo que Grécia, Portugal, Espanha, Irlanda possam querer esse desfecho. Mas é mesmo esse desfecho que querem? Claro que não. Não estão na UE e no euro por imposição, mas porque é vantajoso.
A origem da crise, ao contrário do que o texto de Ferreira Filho pode nos induz a pensar, está justamente no descompromisso fiscal desses países cujas economias agora precisam ser resgatadas, sob o risco de a Europa mergulhar numa crise mais aguda e prolongada, com reflexos negativos em todo o mundo. Ocorre que, para colocar dinheiro na mão desses governos, que muitas vezes demonstraram desprezo pelas regras de mercado, gastando mais do que podiam, é preciso lhes impor certas condições. Ou o mundo deve assinar um cheque em branco à irresponsabilidade?
Eis uma das questões que Ferreira Filho não procurou responder. Talvez porque não tenha entendido que o mercado não é uma ficção ideológica, fruto de um gênio maniqueísta ou maquiavélico, como prefere. O mercado é apenas uma expressão genuína das relações econômicas, inerentes ao homem. Seu surgimento data do início da história da humanidade. E continuará a existir mesmo que a ideologia tente decretar o seu fim.
A crise europeia tem uma lição a nos dar. Mas é preciso franqueza intelectual para aprendê-la.

Por Nilson Mello

* Artigo “Dinheiro: a política e a guerra por outros meios ou Maquiavelismo Monetário”, publicado no Volume 4, Número 2 Outubro 2011/Março 2012 dos Cadernos da Escola da Magistratura Regional Federal da 2ª Região, Volume 4, Número 2 Outubro 2011/Março 2012 - Fenomenologia e Direito.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Artigo

A compulsão intervencionista

            Não há estímulo melhor à qualidade do que a concorrência. E quem mais lucra com ela é o consumidor final de produtos e serviços. A Lei de Reserva na Informática (Lei 7.232/84), que perdurou de 1984 a 1991, sob a justificativa de proteção a uma (supostamente) florescente indústria nacional do setor, impôs ao país um atraso tecnológico que até hoje representa um handcap ao seu desenvolvimento.
Os “usuários”, tanto empresas quanto pessoas físicas, tiveram que arcar com os custos adicionais gerados pela baixa eficiência dos produtos – hardwares e softwares – feitos naquele período.
     Um grande jornal brasileiro dá claros sinais de decadência e de significativa perda de qualidade no que diz respeito ao seu conteúdo. Sintomaticamente, o maior concorrente desse veículo fechou as portas há pouco tempo. Agora, é provável que boa parte de seus leitores esteja procurando informações em outras fontes, na busca de mais qualidade.
Os automóveis brasileiros já foram acertadamente chamados de “carroças” por um ex-presidente que, em meio a um governo desastroso sob vários aspectos, teve o mérito de promover a abertura da economia – o que permitiu ao consumidor brasileiro acesso a produtos, incluindo carros, de melhor qualidade. A propósito, já foi dito aqui que até os piores governos deixam seu legado.
     Mas a concorrência externa não é benéfica apenas porque força a busca da melhoria dos produtos nacionais, ou porque dá ao país acesso a tecnologias de ponta, por meio do intercâmbio comercial, o que é pressuposto para o seu desenvolvimento. A concorrência é também importante porque contribui para o controle da inflação.
Na verdade, a própria abertura comercial - e não especificamente a concorrência que dela decorre - ajuda no combate à inflação na medida em que aumenta a oferta de produtos, atendendo à demanda e diminuindo a pressão sobre os preços.
Tudo considerado, como avaliar a recente proposta, em uníssono (ver link abaixo), dos economistas e professores Luiz Carlos Bresser Pereira, Maria da Conceição Tavares e Carlos Lessa para que o governo promova a desvalorização do real e estabeleça salvaguardas protecionistas para a indústria brasileira conquistar competitividade, sobretudo face aos chineses?
Recordemos. Conceição Tavares defendeu o Plano Cruzado de Sarney (por sinal, elaborado por três de seus ex-discípulos) e, mais tarde, o Plano Collor (parte da má herança daquele governo). Chegou a chorar ao defendê-los, em ocasiões distintas, em rede nacional de TV. O Plano Cruzado interveio nas relações econômicas, desconsiderando as leis de mercado. Congelou taxa de câmbio, salários e preços de bens e serviços. Obviamente, em pouco tempo fracassou na tentativa de debelar a inflação. Afinal, por que alguém vai produzir mais se os preços estão congelados? Qual o estímulo? E se a produção cai, e a demanda se mantém, o resultado é o aumento dos preços.
Bresser Pereira, professor emérito da FGV, produziu o Plano que leva o seu nome, em substituição ao Cruzado, repetindo a receita dos congelamentos, igualmente ao arrepio das leis de mercado. O resultado foi idêntico fracasso. Lessa, ex-presidente do BNDES na gestão de Lula, não teve o seu próprio plano, pois ingressou no governo após a inflação já ter sido debelada pelo plano de seus adversários políticos (Real), que teve êxito justamente por respeitar os mecanismos de oferta e demanda, deixando de lado a ideia fixa de congelamento.
O intervencionismo, na verdade, é uma compulsão. Numa metáfora com o futebol, o economista ou burocrata que defende congelamentos e salvaguardas é como aquele jogador que insiste num drible desnecessário, em passar o pé por cima da bola que já chegava limpa para o companheiro, na cara do gol.
O Brasil pode se tornar mais competitivo se reduzir os tributos. Se reformar a legislação trabalhista, que encarece o emprego. E também se o governo gerenciar de forma adequada os recursos que arrecada por meio da tributação, investindo em estradas, portos e aeroportos, verdadeiros gargalos que elevam os custos da cadeia produtiva. Para completar, pode se esforçar para reduzir a burocracia, fonte permanente de custos e de corrupção.
O curioso é que, ao invés de nos preocuparmos com o óbvio, volta e meia retomamos essas ideias mirabolantes, de congelamento, salvaguardas, reservas de mercado, barreiras etc... Como se o passado não tivesse nos ensinado nada.

COMENTÁRIO DO DIA

Crítica construtiva

    O maior desafio de quem escreve é controlar a opinião compulsiva sobre tudo e todos. Volta e meia perco a batalha. Na semana passada, em mais uma dessas “derrotas” para a pretensão, critiquei (!) o Nobel de Economia Joseph Stiglitz. O efeito positivo é que o atrevimento abriu espaços para comentários críticos pertinentes, como o do economista e professor da UFRJ Luis Otávio Façanha, reproduzido abaixo:

(...) A alusão ao nosso Nobel [Joseph Stiglitz, artigo da postagem da sexta-feira passada do Blog] soou um pouco injusta. Mas, a culpa é dele, que deveria estar protegendo com mais zelo as glórias acadêmicas conquistadas, das quais ele é merecedor, sem dúvida. Como o Akerlof, como o Erik Maskin, como o Myerson e, por que não citar?, o “Mente Brilhante”, que inspirou a todos. Mas os mercados funcionaram! Numa ponta, a farra hipotecária e, de outro, a farra com os derivativos. E os títulos da dívida americana foram comprados, assim como foram comprados os das dívidas grega, italiana, espanhola, com ou sem irresponsabilidade fiscal (devemos falar da guerra do Iraque?, ou do regime fiscal americano, que desonera os mais ricos?) dos respectivos governos. E ganharam muito, muito dinheiro, pelo menos enquanto aqueles países vinham crescendo a taxas retumbantes. Há pelo menos quinze anos, Stiglitz e outros, os economistas que consolidaram a teoria da informação (menos pomposamente, a teoria da desinformação) no âmbito do pensamento econômico, vêm nos alertando para a possibilidade da seleção adversa num caso, e do risco moral de outro, estourarem o sistema (estou me referindo mais ao caso americano). Ortodoxos e heterodoxos sorriam desdenhosamente para o que vinha sendo escrito e difundido. E a proposta não era de regulamentação estrito senso, mas de monitoramento, tarefa (indispensável ao sistema de preços) que deixava de ser exercida de forma eficaz por conta da colusão entre os CEOs (com contratos majestosos) e os auditores (...) - Luis Otávio Façanha.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Artigo

O "market fundamentalism”

Joseph Stiglitz


     Os “banqueiros desregulados” - escreveu recentemente o Nobel de Economia Joseph Stiglitz - são os responsáveis diretos pela crise financeira que sacode o mundo desde 2008. Mas os banqueiros não estariam “desregulados” se governos demagógicos e irresponsáveis não usassem impulsos fiscais para forjar crescimento econômico.
     Os banqueiros, longe de serem vítimas, seriam os responsáveis mediatos. Cúmplices sorrateiros, talvez. Professor de Columbia University, Stiglitz é o maior crítico dos chamados economistas de mercado, a quem ironicamente chama de “market fundamentalists”, em depreciativa alusão ao radicalismo religioso.
A crise agora entrou em sua segunda etapa com a derrocada de economias periféricas da Zona do Euro. Esse aglomerado de países compartilha uma moeda, mas não políticas fiscais uniformes que poderiam garantir estabilidade às suas economias. Alemanha é boa gestora. Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda etc, não. Seus “governos desregulados” chamaram os bancos para a farra e agora a conta não tem como ser paga.
Não é tarefa simples discordar dos economistas - sobretudo de um Nobel da Economia. Mas o fato é que a origem do desregramento está no Poder Público. Está nos estímulos “para-fiscais” à economia, na estruturação de sistemas de benefícios não compatíveis com a geração de renda, na concessão de garantias sem lastro na produtividade e na eficiência, nas políticas de crédito fácil.
Portanto, seriam justamente os fundamentalistas de mercado quem tem razão quando preconizam menos intervenção do Estado nas relações econômicas. Um “market fundamentalist” legítimo teria se oposto à farra hipotecária promovida pelo governo americano por meio das agências de crédito imobiliário Fannie Mac e Faddie Mae – agências, por sinal, controladas pelo governo americano.
Se as regras de mercado, preconizadas pelos “xiitas”, tivessem sido respeitadas, a bolha certamente não teria estourado. Ou surgido. No caso dos periféricos europeus, o Estado de amplos benefícios, onde se trabalha pouco, mas com retorno certo, engendrou uma economia insustentável no longo prazo, com déficits fiscais impagáveis. Obviamente, os “market fundamentalists” jamais concordariam com ambiente de tamanha frouxidão. Deu no que deu.
Na Espanha, simplesmente não há mais emprego. Fecho com o fundamentalismo de mercado: quanto menos regulação e encargos, quanto menor a intervenção de caráter social, maior será o espaço ao empreendedorismo, e consequentemente maior será a oferta de empregos.
Nos Estados Unidos, um presidente eleito pelo que lá se considerada a “esquerda” enfrenta o desafio de levar o país de volta à austeridade fiscal – projeto geralmente associado à direita política. Uma ironia não fosse a gravidade da situação. Aliás, uma “direita política” que inflou a bolha hipotecária quando no governo. E depois promoveu aumentos incessantes dos gastos de Defesa, deixando a conta para o sucessor. Podemos repetir a George W. Bush: “era a economia, estúpido!”
Um defensor do “livre mercado” está pouco se importando se o governo se auto-intitula de direita ou de esquerda. Ele só pede que o governo não gaste mais do que a sociedade é capaz de produzir. Ele não está preocupado com ideologia, mas com eficiência.
No que diz respeito aos europeus, já é possível prever uma fragmentação da Zona do Euro, com a saída dos “irresponsáveis” periféricos. E o enquadramento dos que ficarem. Um mundo onde os direitos e benefícios sociais são amplos e irrestritos, enquanto não há cobrança quanto aos deveres, parece não ser mais factível. Eis o legado da crise. Mas ainda é possível buscar o bem estar material com base nos critérios de mérito e eficiência. O pressuposto é um Estado responsável, zeloso dos recursos que a sociedade é capaz de gerar (tributos), e voltado para tarefas básicas, como a Educação. O Estado é, sim, indispensável. Mas não fazendo besteira.
Estamos no caminho no Brasil? 

Por Nilson Mello

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Artigo

Correntes punitivas


Immanuel Kant 

            A moralidade de um ato depende de suas razões, diria Immanuel Kant (1724-1804). A moralidade de um ato depende diretamente de suas conseqüências, contra-argumentaria Jeremmy Bentham (1748-1832), preocupado que estava em mensurar o prazer e a dor provocados pelas ações humanas; e, a partir daí, estruturar sociedades justas, baseadas em sistemas jurídicos mais consistentes.
Como utilitarista, Bentham entendia que a única razão aceitável para se punir uma pessoa era o fato de a punição ajudar na prevenção ou redução do crime, gerando mais bem-estar para a coletividade (menos dor e mais prazer para todos). A punição estaria em linha com uma didática social.
Acreditava também que só seria aceitável punir de determinada maneira ou em determinado grau levando em conta a capacidade de redução ou prevenção do crime. Por conseqüência, as pessoas não devem ser punidas se a punição não for a melhor maneira de prevenir ilegalidades. Do contrário, a dor causada a um indivíduo seria injusta e não compensaria o prazer proporcionado a outros.
Em contraste - e de acordo com uma visão que privilegia a liberdade de escolha - Kant enxergava o direito de punição como “imperativo categórico”. Seu argumento racionalista era o de que as conseqüências da punição do criminoso são irrelevantes, pois o respeito à própria liberdade do indivíduo é o que pressupõe a necessidade de puni-lo.
A punição deve assim ser infligida ao transgressor por sua intrusão na autonomia do outro; e deve ser associada ao grau e à qualidade de tal desrespeito.*
Pois, afirmou Kant, “um ser humano não pode nunca ser manipulado simplesmente como o meio para os fins de outra pessoa”. A teoria retributiva - defendida por Kant e depois combatida pelo utilitarismo - preconiza que a única razão aceitável para se punir uma pessoa é o fato de ela ter cometido um crime.
Portanto, podemos, por exemplo, punir um ministro envolvido em desvios de verbas públicas de acordo com qualquer uma dessas correntes. Para prevenir novos “malfeitos” (com licença do eufemismo), contribuindo para o efeito didático, ou apenas em deferência à sua liberdade de escolha, ao se livre-arbítrio. Particularmente, sigo a corrente utilitarista.
Mas punir, no caso, sequer é o maior problema. Há leis para tanto. O difícil é entender por que nosso modelo político sistematizou os desvios de conduta. E descobrir se o problema é intrínseco ao modelo e àqueles que estão no Poder ou apenas reflete a corrosão de valores em nossa sociedade.
Eis aí qual deve ser o alvo prioritário de nossas reflexões.

 Por Nilson Mello

*MORRISON, Wayne, Filosofia do Direito – dos gregos ao Pós-Moderno, Ed. Imfe. 

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

COMENTÁRIOS DO DIA


UPP no Congresso
Rocinha

   Em meio às muitas análises sobre a prisão do traficante Nem e a retomada da Rocinha pelo Poder Público, o melhor comentário veio de um zelador, por sinal morador da Favela do Vidigal (também ora pacificada). Disse ele: “falta agora uma UPP no Congresso, porque lá também a Lei não entra”.
    A baixa escolaridade (o zelador em questão tem apenas o primeiro grau completo) não comprometeu a perspicácia. O baixo salário (cerca de R$ 1 mil) tampouco o desviou de parâmetros morais. Prova de que a baixa renda não é justificativa para o crime, ao contrário do que se apregoou durante a década de 1980, quando era comum tratar bandido como “vítima social”. Época em que o governador Leonel Brizola proclamava que a “sua” PM não subia o morro.
    Nem, após ser preso, ensaiou o discurso de vítima do sistema: declarou ter entrado para o tráfico para custear o tratamento de uma filha acometida por doença rara. O argumento é falacioso. A maioria dos pobres – a maioria dos brasileiros – não adere ao crime. Mas seria igualmente falacioso não admitir que a dificuldade de acesso da população à saúde é vergonhosa.
    A prisão de Nem resgata esse debate. E nos permite colocar em discussão também outros aspectos intrigantes. Por exemplo, como um governo que falha em quase tudo que é essencial (saúde, educação, infraestrutura...), como o de Sergio Cabral, pode ter êxito, ainda que parcial, na área de segurança, justamente a mais complexa? E por que foi tudo mais fácil do que parecia?
Retomaremos o tema.


A crise global

    Seria simplismo achar que a crise é estritamente do capitalismo. A crise financeira atual é resultado de políticas populistas adotadas por governos pouco ou nada comprometidos com a austeridade e a responsabilidade fiscal. Governos, portanto, distantes dos critérios de eficiência que pautam as relações de mercado, indispensáveis ao modelo capitalista. A crise financeira de 2008 nos Estados Unidos, iniciada com o estouro da bolha imobiliária, e considerada a primeira etapa da crise atual, teve o mesmo ingrediente: a expansão “artificial” de créditos, resultante de políticas irresponsáveis, de impulsos governamentais.
Ressalte-se que as agências hipotecárias Fannie Mae e Feddie Mac, que promoveram a farra hipotecária, são administradas e controladas pelo governo americano.
Os Estados Unidos podem ser a maior nação capitalista do mundo, mas isso não impede seus governantes de adotarem políticas econômicas populistas estranhas às leis de mercado. A economia é, na verdade, refém de políticos afeitos ao estatismo e ao intervencionismo, promotores, por exemplo, de programas de concessão de crédito inconsistentes. 



O BC e a inflação

    A inflação dá sinais de desaceleração na esteira da queda da atividade econômica. Em parte resultado da crise financeira global. Mantém-se, contudo, ainda em patamares elevados. O Banco Central acertou quando deu início a um ciclo de redução da taxa de juros (dois cortes seguidos de 0,5 ponto percentual), evitando um efeito recessivo desnecessário, ou passou a ter grau de tolerância maior em relação à alta dos preços?
Seja como for, o fato de o discurso do BC e do restante da equipe econômica do governo enaltecer a necessidade de uma política fiscal rigorosa, para que a política monetária não precise ser tão restritiva, pode ser visto como uma evolução. Os indicadores de preços e o comportamento fiscal darão a medida do desempenho do BC nos próximos meses. Saberemos então se o regime de metas de inflação passou a ser simples ficção ou ainda é um objetivo da política econômica.
Não custa lembrar que integrantes do governo e economistas ligados aos partidos que compõe a base governista sempre consideraram a inflação como um mal menor diante da necessidade de estimular o crescimento e manter os níveis de emprego. Como se fosse possível crescer de forma sustentável (mantendo o poder de compra da população, sobretudo a parcela de menor renda) com espiral inflacionária e indexação generalizada.
Espiral e indexação costumam ter início exatamente em períodos de tolerância monetária e fiscal.



sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Artigo

As perguntas em torno de Nem


Agora que Nem foi preso, enfrentemos algumas questões, sem hipocrisia.  A primeira delas é saber quem é o destinatário do "comércio e dos serviços prestados” pelo chefe do tráfico da Rocinha e seus comparsas.  
Sim, a conclusão é óbvia. Todo consumidor é indiretamente responsável pela criminalidade no Rio de Janeiro – ainda que more no “asfalto”, frequente boas universidades e nunca tenha subido o morro atrás de “pó” ou mesmo maconha. Não é possível estabelecer dois mundos paralelos, como se não houvesse conexão entre o consumo e a criminalidade que dele se sustenta.
Passemos à segunda questão. Se há na sociedade forte demanda por esse “comércio”, cujo caráter é ilegal, é razoável inferir que o “negócio” não poderia prosperar sem que houvesse muitos “sócios” - ou “sócios” de peso - no Poder Público.
Também é plausível supor, tendo em vista os valores que o “comércio” movimenta e o número de pessoas que mobiliza, que a banda degradada do aparato policial é apenas o braço executivo do esquema de corrupção necessário à sua prosperidade.  
Eis aí então a terceira questão: se a polícia não está no nível hierárquico mais alto do “esquema”, pois sua ação é vinculada a uma decisão política, quem são os sócios do tráfico nas altas esferas do Poder Púbico? Será possível chegar a eles com a prisão deste que era tido como um dos maiores traficantes do país, ou a contaminação chegou a tal ponto que o "esquema" ainda não poderá ser desfeito? 
A quarta questão está relacionada às anteriores, e a sua simples formulação já comprova a eficácia do “esquema”. Na verdade, a resposta é até dispensável, pois a contundência está na própria pergunta: se a cocaína não é produzida no Rio de Janeiro, por que a ênfase do combate ao tráfico se dá nos morros cariocas e não em nossas fronteiras, bem como nos portos, aeroportos e rodovias, por onde, obviamente, passam não somente as drogas como armas em quantidades de fazer inveja a um rebelde líbio?
Por fim, retomemos a questão inicial, para outra formulação. Se o consumo das chamadas drogas ilícitas (em especial a maconha e a cocaína) é tão alto, não seria o caso de investir mais em campanhas de esclarecimento da população, desestimulando o consumo, bem como na recuperação de viciados? A propósito, as drogas ilícitas são mais nocivas do que as chamdas drogas lícitas (álcool e cigarro)? Pois caso não sejam, não seria o caso de liberá-las, dando um golpe definitivo no tráfico, que perderia a razão de ser?
Em suma, a prisão de Antonio Bonfim Lopes, o Nem, nós dá, principalmente, a chance de fazer as perguntas certas para solucionar o problema da violência no Rio de Janeiro. Mas é claro que algumas respostas objetivas o próprio Nem, personificação do conceito de "arquivo vivo", poderá nos fornecer. 

Por Nilson Mello 



sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Artigo


Nosso Índice de Desenvolvimento Humano


Um Estado forte é aquele capaz de garantir desenvolvimento econômico e condições dignas de vida ao seu povo. Parece óbvio, mas não é.
Muito frequentemente - em boa parte das vezes por ignorância, mas na maioria delas por má-fé – propaga-se a ideia de que o Estado, para ser forte, precisa invadir a esfera privada, não apenas intervindo nas relações comerciais entre indivíduos, ou entre indivíduos e empresas - o que é feito por meio de um “ativismo regulatório” desproporcional -, como atuando diretamente como “Estado-empresário”.
    A prova de que Estado forte não é isso, ou seja, de que excesso de intervencionismo, direto ou indireto, não garante desenvolvimento social, está no Brasil. Nas últimas duas décadas estruturamos um arcabouço legal que ampliou o grau de intervenção do Poder Público na atividade econômica.
O próprio sistema tributário reflete essa tendência. E ele é injusto não apenas porque impõe uma carga pesadíssima (de quase 36% do PIB), mas porque é extremamente complexo – o que gera problemas e custos adicionais para o contribuinte.
    A evidência mais clara desse pseudo-Estado forte está no tamanho de sua máquina administrativa. Ela cresce em progressão geométrica e na razão inversa de sua eficiência. E é sustentada com parcelas cada vez maiores dos recursos obtidos com esses pesados impostos que pagamos, num gigantismo estatal que é ao mesmo tempo contraproducente e perverso – ou perverso por ser contraproducente.
    Serviços públicos de qualidade, condizentes com o que se espera de um Estado responsável, seriam a justificativa para o excesso de intervenção e de tributos. Mas, paradoxalmente, essa qualidade tende a ficar cada vez mais distante com a ineficiência gerada pelo intervencionismo.
O aspecto mais dramático da falácia do “Estado forte” é o uso cínico de seu fracasso para justificar um aumento ainda maior da máquina administrativa, com a contratação de mais servidores – o que naturalmente pressiona a já pesada carga tributária sem que haja efetivos avanços para a população.
Na esteira desse discurso foram criadas mais de 40 estatais na esfera federal desde 2003. Sobre a contratação de novos servidores, os números têm variado, mas fala-se em mais de 100 mil no período. Não se tem notícia de que os setores de educação, saúde, saneamento, segurança e infraestrutura, para ficarmos naqueles essenciais, tenham melhorado em igual proporção – a despeito da extraordinária elevação de custos que esse “turbinamento” da máquina significou.
Por questões de espaço, não vamos sequer considerar o que esse aumento da máquina potencializou em termos de corrupção – outro efeito colateral do gigantismo.
Eis que o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) acaba de divulgar o Índice de Desenvolvimento Humano de 2011. Nele o Brasil figura em 84º lugar entre 187 nações – 20º lugar na América Latina. A posição, já vergonhosa em termos absolutos, é ainda pior se considerarmos que somos a sétima maior economia do mundo.
Cabem as perguntas retóricas: essa máquina pública agigantada serve aos interesses do Estado e, por conseqüência, da sociedade? Ou a ideia de um pseudo-Estado forte tem sido usada para perpetuar práticas patrimonialistas pelas quais grupos políticos se apropriam da máquina pública em benefício próprio, e em detrimento do povo?

Por Nilson Mello

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

COMENTÁRIOS DO DIA

O nosso comunista

   O novo ministro do Esporte, Aldo Rebelo, é figura controversa. Comunista de carteirinha é, também, católico praticante. Defensor de um Estado intervencionista, onipresente e “empresário” - a julgar por sua opção ideológica e partidária - anunciou que pretende preencher os cargos do primeiro escalão – substituindo aqueles afastados por corrupção - com “gente de mercado”, num reconhecimento implícito de que profissionais oriundos do setor privado têm mais capacidade gerencial e produtividade do que aqueles da máquina pública.
Ato-contínuo, contudo, explicou que os salários do setor privado são melhores do que os do setor público (o que não é bem verdade).
Aparentemente, portanto, tentava justificar o menor rendimento do funcionário público. E – aqui vai uma ilação – aproveitava a oportunidade para defender, veladamente, melhores salários para os quadros do ministério.
O papel dos Ministérios hoje é esse mesmo, não é Rebelo? Fazer com que os “quadros” dos partidos que os dominam - dentro da partilha fisiológica que se consolidou no país - tenham vida boa. A custa dos impostos que pagamos, obviamente.
     Aldo Rebelo é um homem bem. Ao menos passa essa imagem, a despeito das contradições. De bem, mas confuso. Nas estantes de seu gabinete “convivem” imagens de Mao e de Nossa Senhora de Aparecida.
Sejamos, porém, condescendentes: não é fácil ser coerente e lúcido pertencendo ao PC do B. Não é fácil defender bandeiras democráticas e ao mesmo tempo uma economia eficiente fazendo parte de uma legenda associada a um modelo político e econômico anacrônico, que fracassou no mundo todo.

Ah, o PC do B não é mais nada disso? Que então mude de nome.

Por Nilson Mello

BC abre mão de sua missão?

    Uma política monetária responsável não deve atribuir o controle dos preços a eventuais fatores externos, como uma possível queda de demanda em função do agravamento da crise mundial.
     Primeiro porque tais fatores são imponderáveis. E segundo porque não há garantias de que, mesmo que se efetivem, possam ser capazes de conter a alta de preços domésticos.
Por suas peculiaridades e sua dimensão, a economia brasileira tem dinâmica própria, sujeita a influência externa apenas relativa.
     A observação foi feita em seguidos artigos e comentários deste blog nos últimos meses. E figura de forma contundente em artigo do economista Paulo Guedes publicado nesta segunda-feira (31) na imprensa.
     “O processo inflacionário depende fundamentalmente dos mercados de bens e serviços domésticos, e não da inflação importada”, alerta Paulo Guedes.
O BC iniciou um ciclo de baixa de juros sem que a política fiscal esteja definitivamente ajustada. A política econômica foi retirada de parâmetros eminentemente técnicos para ingressar na esfera da conjectura. Aposta do BC, que não é técnica, pode dar certo, e a inflação ficar na meta em 2012. Mas como toda aposta, pode não se concretizar.

Ver link de artigo de Paulo Guedes:

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Artigo

Que socialismo é este?
Dinho Ouro Preto
    O socialismo utópico surgiu na virada do Século XVIII para o século XIX, no bojo de ideias e ideais que já haviam desencadeado a Revolução Francesa.  Contemplava a possibilidade de se estabelecer uma sociedade justa e igualitária de forma pacífica e gradual.
Fourrier e Saint-Simon, seus principais teóricos e porta-vozes, reconheciam que o modelo capitalista de produção, centrado na propriedade privada dos meios de produção, concentrava riquezas. Era preciso que desse lugar a um novo sistema de desenvolvimento, do qual emergiria uma sociedade mais harmônica.
Da utopia à prática, foram sucedidos pelo socialismo científico, que teve Marx e Engels como seus formuladores. A partir daí, não bastava idealizar uma sociedade igualitária, e caminhar pacificamente para alcançá-la. Era preciso transformá-la por meio da força.
O materialismo histórico de Marx e Engels - identificador e ao mesmo tempo formulador da dialética de classes como agente transformador - prometeu um futuro promissor para a sociedade, fundado na igualdade, na justiça e no bem comum. Para alcançá-lo seria antes necessário implantar uma ditadura do proletariado, na qual todos os bens de produção estariam na mão do Estado.
Na etapa seguinte à ditadura, o socialismo eliminaria as classes e o próprio Estado, e os homens viveriam harmonicamente. A Revolução Russa tentou levar adiante o projeto. O problema é que a ditadura implantada em 1917 na Rússia - e depois exportada ao longo do século XX para outras partes do mundo - não tinha data para acabar. A prometida sociedade justa tornou-se cada vez mais uma utopia tão distante quanto a imaginada pelos utópicos socialistas originais – ou pela obra inspiradora de Thomas Morus, lá atrás, no século XVI.
Além de não ter prazo pré-estabelecido, esta ditadura foi se mostrando tão o mais totalitária que qualquer outro regime anterior, não apenas por ser uma ditadura formal, do ponto de vista normativo, mas porque desconsiderava e coibia qualquer aspiração do indivíduo em prol de um suposto bem-estar coletivo.
Essa ditadura do proletariado ainda apresentava um defeito adicional. Ao retirar das mãos dos particulares a propriedade dos bens de produção colocando-os nas mãos do Estado, planejador central, e ao substituir o conceito de mérito pessoal pela ideia genérica de justiça distributiva, ela eliminou o estímulo à economia e ao desenvolvimento.
Não foi, portanto, uma ideologia antagônica que deu cabo do socialismo científico, mas sim a ineficiência econômica que lhe foi inerente. A falência resultante de sua incapacidade de gerar riquezas e promover, de fato, o bem-estar material, como “utopicamente” prometido, mostrou, por sinal, que suas bases científicas não eram consistentes, embora tenham lhe garantido nome e fama. Na verdade, não era ciência, mas ideologia.
Aliás, se a dialética de classes fosse científica, não precisaria ser estimulada ou forçada pela revolução.
Isso tudo significa que o modelo capitalista é perfeito? Claro que não. Esgota o ambiente. Esgota o ser humano. Pior: produz um mundo ficcional, em que o consumo passa a ser um “valor” em si mesmo, suplantando os demais, e não um meio para se obter bem-estar material. Mas essa é digressão para outro momento.
No momento o que importa saber é onde estão os idealistas que usariam o Estado para transformar a sociedade? Os partidos de esquerda estão no poder – e certamente há gente de bem em suas fileiras. Mas o que continua a prevalecer são as práticas patrimonialistas – o uso do Estado em proveito de poucos. Parafraseando Dinho Ouro Preto, “Que socialismo é este?”

Por Nilson Mello

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Artigo


Corrupção e controle da mídia

    Uma acusação, se consistente em evidências, não perde validade pelo fato de o denunciante ser, ele próprio, um criminoso, ou suspeito de participação em irregularidades. Sob certo aspecto, se o acusador está envolvido no esquema denunciado, ou em outros semelhantes, praticados dentro de idêntico contexto – ou no mesmo órgão do governo, como tem sido recorrente – a denúncia até ganha força, pois expõe com maior clareza o grau de contaminação da máquina pública.
     O PC do B, legenda da base governista aboletada no Ministério do Esporte, condenou a divulgação das denúncias feitas pelo policial militar João Dias Ferreira contra o titular da pasta, Orlando Silva, por considerar que o “denunciante é um bandido”.
     O PC do B entende que o episódio – não os graves e recorrentes desvios praticados dentro do Ministério do qual se apropriou, mas a acusação feita por um dos envolvidos – realça a importância de se estabelecer um controle “regulatório” da mídia.
Eis o que o partido publicou em seu portal “Vermelho” e que foi reproduzido nesta quinta-feira (20) na imprensa livre: “As calúnias lançadas contra o ministro e contra o seu partido, o PC do B, são o melhor exemplo da necessidade, da imposição, de uma legislação para regular a mídia e democratizar os meios de comunicação (grifo meu)”.
O que o PC do B chama de “calúnias” o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, considera “fatos graves” com base nos quais vai requerer ao Supremo Tribunal Federal a instauração de inquérito contra o ministro Orlando Silva.
O PC do B, o PT e os demais partidos da base aliada gostam de falar em “controle social da mídia”, ou “democratização dos meios de comunicação” (e outros eufemismos mais para a censura), porque sabem que uma imprensa livre de amarras “regulatórias” traz à tona os seus esquemas de desvios de recursos públicos. Simples assim.
Cinco ministros do atual governo já caíram envolvidos em denúncias de corrupção (estou incluindo Orlando Silva na contabilidade). E temos apenas 10 meses de mandato. O que a imprensa tem mostrado é que a máquina pública federal foi transformada num vergonhoso balcão de negócios.
O interesse público virou mera ficção: o que conta são os negócios privados – e necessariamente escusos – que podem ser feitos à custa do erário. A cada partido, o seu quinhão, representado por um ministério, ou grupo de ministérios e seus órgãos vinculados. Tem o esquema dos Transportes, do Turismo, da Agricultura, do Esporte, da Saúde...
Impossível esperar um governo com gestão eficiente, se a máquina pública alcançou tal grau de deterioração. E isso explica porque os gastos governamentais são gigantescos, cada vez maiores, enquanto os serviços públicos prestados à população são ridículos - e desumanos.
 Os partidos de esquerda, que chegaram ao Poder com o primeiro governo Lula - e os que não são de esquerda, mas a eles se associaram no crime, como o pragmático PMDB - aparelharam o Estado em proveito próprio – em proveito de seus dirigentes. Justo os partidos de esquerda! Um eficiente, porém, imoral modelo tributário – que obriga o setor privado a buscas incessantes de produtividade, impondo-lhe uma pesada carga tributária – tem alimentado a farra.
A arrecadação bate recorde após recorde, mas o dinheiro que pagamos em impostos escorre pelos ralos da corrupção. Dá para entender por que os hospitais públicos não funcionam a contento, por que o ensino é ruim?
Bem, e a imprensa? A imprensa, por enquanto ainda livre, denuncia os desvios. Mas isso não tem sido suficiente para inibi-los.

Por Nilson Mello

Comentário do Dia

Aos poucos vai se consolidando - independentemente de correntes ideológicas - a percepção de que a queda de juros, inerente a uma política monetária responsável no controle da inflação, deve estar atrelada a uma política fiscal (controle de gastos públicos) mais austera. Contrário senso, se os gastos forem frouxos, não há espaço para uma queda de juros segura. Estamos ainda longe de uma política fiscal adequada, mas o simples reconhecimento de sua importância para a manutenção da estabilidade econômica já é um alento. E, ainda sem o ambiente ideal, o Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central promoveu nesta quarta-feira (19) outra redução de 0,5% na taxa básica de juro (Selic), para 11,5%. BC e governo entendem que é possível reduzir os juros sem descontrole inflacionário porque a crise mundial dará conta de esfriar a demanda sobre produtos e serviços (e, assim, a pressão sobre os preços) nos próximos meses. Ou seja, a aposta no controle dos preços permanece centrada no desaquecimento externo. Quando a política fiscal estiver no eixo, essa redução poderá ser mais significativa, e sem riscos ou apostas em fatores externos, sempre imponderáveis.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

Segundo Tempo

O que mais chama a atenção neste novo escândalo de desvio de verbas no primeiro escalão do governo não é sequer o possível envolvimento de (mais) um ministro, os polpudos valores embolsados pelos fraudadores ou as evidências de que as ONGs são, em sua maioria, sugadores de recursos públicos.
O que castiga mesmo o senso de dignidade do contribuinte é a comprovação de que os ministérios foram aparelhados pelos partidos da base governista para contemplar seus próprios interesses, e os daqueles que os dirigem, sobretudo.
De 2004 a 2010, as quadrilhas travestidas de ONGs receberam nada menos que R$ 23 bilhões em recursos públicos, para financiar, com o dinheiro que pagamos em impostos, programas de caráter politicamente correto mas conduta incerta, como o Segundo Tempo do Ministério do Sr. Orlando Silva.
O setor privado “rói o osso” para ter produtividade, em meio a um ambiente de pesada tributação, e o resultado é esse: todo o esforço empreendedor, que poderia ser convertido em desenvolvimento por uma correta ação do Poder Público, perde-se na má gestão, na burocracia e na corrupção que lhe é inerente. O interesse público tornou-se mera ficção.
No mais, é ainda lamentável ver o denunciante - um soldado da Polícia Militar do Distrito Federal, ele próprio envolvido até o pescoço em denúncias – posar de moralista e ostentar não apenas farda como condecorações (fotos dos jornais desta terça-feira 18).
Em respeito ao contribuinte, deveriam lhe cassar as condecorações, e lhe tomar a farda. Mas isso tudo é demorado, burocrático. Rápido mesmo no Brasil só os esquemas de corrupção.
Por Nilson Mello

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

Serra na defesa de Tombini

Jose Serra

       O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, 47 anos, doutor em Economia pela Universidade de Illinois (EUA), é extremamente rigoroso nas análises dos indicadores da economia brasileira e internacional. Antes de tomar qualquer decisão que afete a economia do país, sobretudo relacionada à taxa de juros e ao controle da inflação, dedica-se dias ao estudo conjuntural e horas em reuniões e debates com os seus mais próximos colaboradores.
     Eis o perfil que emergiu esses dias na imprensa, no bojo da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de baixar os juros de 12,5% para 12% ainda que a inflação continue a dar fortes sinais de vigor.
Para quem acredita que Tombini segue uma política heterodoxa, sem qualquer autonomia, traçada no Planalto, e não critérios técnicos claros e consistentes, o perfil serviu como desmentido. Nele aprece inclusive uma observação emblemática do presidente do BC, com intuito tranquilizador: “O dilema inflação X crescimento é falso. Você não cresce mais porque tem mais inflação.”
À observação somam-se depoimentos de assessores, segundo os quais Tombini raramente deixa dúvidas quando precisa embasar suas linhas de pensamento e esboçar “seu arsenal de ideias”.
Não faltou nem declaração de figuras proeminentes da oposição como o ex-governador José Serra, contumaz inimigo da política monetária austera desde os governos tucanos, que saiu em defesa do BC em seu blog, questionando: “Um BC só ganha credibilidade quando aumenta a taxa de juros?”
Em síntese, os comentários favoráveis à atuação do Banco Central têm como fio condutor a necessidade de se manter o equilíbrio entre a defesa da moeda (ou seja, estabilidade monetária) e o crescimento econômico.
Tomemos a observação do economista Carlos E. Gonçalves, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, publicada na última edição da revista Dinheiro, como exemplo. Diz ele: “O papel do BC é agir com cautela, e não dar cavalo de pau na economia”.
Esperemos, então, otimistas, que a aposta do Banco Central num desaquecimento da economia global capaz de conter a inflação interna – fundamento que justificou a redução da taxa básica de juros a despeito da alta da inflação doméstica – esteja de fato correta.
Pois está claro que é à crise financeira internacional, com a consequente redução de demanda, e não às suas funções específicas como autoridade monetária, que o BC está atribuindo, informalmente, o controle da inflação.
Lembremos apenas que a inflação dos serviços, de forte peso interno, está descolada das oscilações externas. Aguardemos.
Por Nilson Mello 
     

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

COMENTÁRIOS DO DIA



PM longe da Justiça


     A proposta de se retirar os policiais militares da segurança do Fórum do Rio de Janeiro, substituindo-os por policiais civis, foi apresentada esta semana por um desembargador do Tribunal de Justiça.
A justificativa para a mudança está na participação de (11) policiais militares (incluindo um oficial superior, coronel comandante de um batalhão) na covarde execução da juíza Patrícia Acioli.
Se há grande número de facínoras na Polícia Militar, seus integrantes não podem fazer a guarda do Judiciário. Assim como não se pode ter “raposas tomando conta de galinheiros”, bandidos não podem vigiar bandidos, muito menos proteger aqueles que os processam e os punem.
Com as notícias cada vez mais freqüentes de PMs envolvidos em desvio e crimes escabrosos, desembargadores, juízes, promotores, defensores, advogados e as milhares de pessoas que transitam pelo Fórum da capital diariamente têm, portanto, motivos de sobra para querer vê-los longe da Justiça – literalmente, pois do ponto de vista da conduta já se afastaram há muito.
Trata-se simplesmente do seguinte: a Polícia Militar fluminense não inspira mais qualquer confiança. E o esforço hercúleo de uma minoria honesta dentro da corporação – como o atual comandante e o seu antecessor – na tentativa de reverter o quadro, só realça o grau de degradação a que se chegou.
A questão agora é saber como ficam todos os cidadãos fluminenses que desejam a proteção de uma polícia eficiente e honesta. Pois se a PM não serve para cuidar do Fórum, também não serve para policiar nossas ruas.


Juros e Inflação
Raul Velloso
                                  
     “No momento, mesmo havendo queda aguda na demanda externa nesta segunda rodada da crise, as taxas de juros só podem cair de forma expressiva e sustentada se, da mesma forma, o modelo de gastos correntes mudar. Caso contrário, o desequilíbrio entre demanda e oferta de não comercializáveis volta rapidamente a aparecer, e o BC, mantida a política de metas de inflação, voltará a subir a Selic (taxa básica de juro), frustrando a todos.”
     O trecho entre aspas acima é a conclusão de um artigo do economista Raul Velloso publicado esta semana na imprensa. Ele salienta que a explicação para que os juros sejam tão altos no Brasil está no fato de o setor público ter se tornado um sugador de recursos do setor privado.
Enquanto a política fiscal for frouxa, com excesso de gastos correntes e pouca poupança (essa, pressuposto para os investimentos que garantiriam ganhos de produtividade e contribuiriam para conter a pressão de demanda sobre os preços), os juros jamais poderão cair significativamente. A menos que se abra mão do regime de metas, ou seja, desista-se de ter a inflação sob controle.
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, garante que o regime de metas de inflação não foi abandonado.


O engodo de Amir Kahir

Já o consultor e mestre em Finanças Públicas Amir Kahir – também em artigo esta semana – garante que a crença na Selic (taxa básica de juro) como um instrumento eficaz no controle da inflação é um “engodo”. Ele comemora o fato de o governo (via Banco Central) agora ter se livrado dessa amarra. E afirma: “O Brasil engoliu esse engodo (da Selic no combate à inflação) por 20 anos. Bem-vinda a mudança!”
Se julgarmos que o presidente do BC, Alexandre Tombini, está de fato dizendo a verdade – que não abandonará o regime de metas, para o qual a política monetária, via administração da taxa de juro, é indispensável -, Amir Kahir interpretou mal sua fala.
Em todo caso, na contramão do que prega o consultor, é bom lembrar que a taxa básica de juro dosa a oferta de recursos financeiros para o mercado. Quanto mais recursos estiverem disponíveis, ou seja, quanto mais baixa for a taxa básica de juro (administrada pela autoridade monetária, o BC), mais recursos estarão disponíveis no mercado, pois os agentes econômicos (empresas, indivíduos...) pagarão menos por eles.
Por óbvio, a oferta maior de recursos financeiros “aquece” a economia, faz com que as pessoas e as empresas gastem mais. Se esse aumento de demanda, resultante do “aquecimento”, não for acompanhado do aumento da produção, o resultado será a alta dos preços de produtos e serviços.
Um detalhe importante: quando o próprio setor público exerce grande demanda sobre os recursos financeiros – por conta de excesso de gastos correntes -, naturalmente os juros sobem. Sem política fiscal responsável, não há política monetária branda. Ou há, mas acompanhada de inflação.
Antes de apregoar juros mais baixos, o governo deve fazer o dever de casa. Foi o que Raul Velloso quis dizer quando mencionou o “sugador de recursos do setor privado”.  

Em todo caso...

     A economia brasileira já dá sinais de desaquecimento. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) recuou 0,53% em agosto em relação a julho, informam os jornais desta sexta-feira 14 de outubro. Se também forem considerados os resultados de junho e julho, a média acumulada nos três meses é negativa em 0,19%. São dados que estimulam o BC a abrandar a política monetária. Mas mesmo assim há dúvidas se a desaceleração será suficiente para conter a inflação, que ainda dá claros sinais de vigor.
     O ministro da Fazenda, Guido Mantega, garante que essa “desaceleração” foi programada, e que o país voltará a crescer assim que a equipe econômica quiser.
     Sem inflação. A conferir.