Currais
eleitorais?
A vitória do governo no Nordeste
no segundo turno da eleição presidencial por larga margem de diferença (mais de
70% dos votos válidos) nos obriga a reconhecer o impacto dos programas de
inclusão social, em especial o Bolsa Família. O diagnóstico vale também para o
Norte e para estados de regiões mais ricas onde a candidata da situação também
saiu vencedora.
A significativa distância que separa os mais pobres
dos mais ricos no Norte de Minas e nos vastos bolsões de baixa
renda do Rio de Janeiro, principalmente nas comunidades
carentes da Região Metropolitana, foi, como sabemos, igualmente um fator
determinante. Claro que onde há baixa renda, há menos escolaridade e, consequentemente,
mais possibilidade de manipulação. Mas isso nem é o que importa na presente
reflexão.
Ainda que o PT tenha transformado tais ações
sociais em instrumento de um assistencialismo reprovável, dado o viés
demagógico e o pragmatismo político a elas associados, o fato é que, num país
tão desigual como o Brasil, programas de inclusão não são apenas importantes,
mas indispensáveis pelo seu caráter humanitário. Como fomos capazes de
deixar um contingente tão grande de brasileiros sobrevivendo em condições
indignas por tanto tempo?
O PT e este governo que agora se prepara para um difícil
segundo mandato não devem ser criticados pelo Bolsa Família ou por
seus congêneres. Programas de inclusão social são uma obrigação
moral de governos no Brasil. A propósito, não se tem notícia de que o PSDB de Aécio Neves, criador
do Bolsa Escola, seja contrário a essas iniciativas.
A crítica que o PT e o atual governo devem merecer é pelo fato de não terem feito muito além disso. E também por terem
desarmado o que vinha funcionando. Programas sociais são um paliativo e como
tal devem ser transitórios. Quando se tornam ação política a
ser expandida por longo prazo e a perder de vista, algo há de errado – de muito
errado.
Governos realmente comprometidos com a sociedade devem
dar aos programas sociais um prazo de validade, uma vez que a sua
expansão e longevidade são atestados do próprio fracasso do Estado. Ou seja, se
tudo está correndo bem os programas de inclusão social são paulatinamente
reduzidos. Se, ao contrário, são massivamente ampliados, é sinal de disfuncionalidade.
Em 12 anos de “gestão” – dois mandatos de Luiz Inácio
Lula da Silva e um de Dilma Rousseff – os governos do PT falharam em duas
frentes fundamentais: na economia, onde não garantiram a
permanência de parâmetros que vinham dando certo, coma a responsabilidade
fiscal (desarmaram o modelo); na educação, onde não promoveram a
revolução da qual o Brasil precisa. (Deixemos de lado
por ora o problema da corrupção, haja vista o seu DNA nacional e multipartidário).
O Japão do século XIX e a Coreia do Sul do século XX
eram países com grandes contingentes de analfabetos que viriam a se tornar gigantes
tecnológicos e industriais num prazo de duas décadas (o que propiciou um
extraordinário aumento da renda de seus cidadãos) graças aos investimentos em
educação. Por que não tê-los como paradigmas é uma questão que permanece sem
resposta.
É uma falácia dizer que as ações sociais e as medidas “anticíclicas”
(estímulos fiscais e de crédito para atenuar efeitos de uma crise internacional
que, a rigor, há muito já se foi) justificaram ou justificam os excessivos
gastos públicos. A irresponsabilidade na “gestão” das contas governamentais
estimulou a inflação, agora mais difícil de debelar.
Teria sido possível dar sequência aos programas
sociais com mais eficiência, não fosse a notória irresponsabilidade fiscal. Sem uma economia forte e crescimento sustentável, até o Bolsa
Família estará um dia comprometido. Se isso ocorrer, o governo – seja lá qual
for – terá perdido então o instrumento com o qual, na base do assistencialismo,
fomenta “currais eleitorais”. Mas, se chegarmos a este ponto, o retrocesso será
de tal ordem que nem a oposição terá motivos para comemorar.
Por Nilson
Mello
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