quinta-feira, 30 de julho de 2015

Artigo

O pior ainda está por vir



    Em recente palestra, durante seminário no Rio sobre a (pseudo) "Reforma Política" em trâmite no Congresso, o jurista Aurélio Wander Bastos lembrou, oportunamente, o conceito de Oclocracia, de Maquiavel.
    Não sendo propriamente uma forma de governo,  como as categorias aristotélicas, a Oclocracia (Oklos, de multidão, e Kratos, de poder) sobrevém quando as instituições perdem-se ao sabor do irracionalismo dos governantes ou quando - mais precisamente o nosso caso - os governantes adotam práticas degenerativas de administração, provocando a instabilidade do Estado.
    Ambição, patrimonialismo (pequenos grupos se apossando do que é público, em benefício próprio) e populismo, traços inerentes e marcantes da Tirania, da Oligarquia e da Demagogia, respectivamente, também são, portanto, ingredientes presentes na Oclocracia.
  O irracionalismo e as práticas degenerativas dos últimos anos lançaram o país no impasse econômico de hoje. O populismo demagógico tratou de turvar a realidade, embriagando os desinformados que compareceram às urnas.
   O governo girou 180o graus, mas a impostura intelectual persiste fora dele, em bastiões ideológicos: a forte recessão que o Brasil enfrenta - talvez a de mais difícil reversão de sua história - é falaciosamente atribuída ao ajuste  destinado a reverter o caos parido de uma política econômica irresponsável.
    Desafios conjunturais somam-se agora a obstáculos de ordem estrutural, cuja superação dependeria de condições presentes mais favoráveis, como capacidade de investimento. O tal ajuste, por sinal, pode nem mais acontecer, o que torna qualquer análise quanto às possibilidades de superação da crise - seja em curto, médio ou longo prazo - mero exercício de ficção.
    A meta de superávit primário, ponto central da reconquista da credibilidade, simplesmente deixou de existir.
    De 1,1% do PIB (algo como R$ 66 bilhões), conforme desenhada no início do ano pela equipe de Joaquim Levy, foi reduzida para menos de R$ 9 bilhões (ou 0,15% do PIB), diante da baixa arrecadação por força da recessão e da tímida contenção de gastos públicos obtida até aqui. Um recuo de quase 90% que nos leva a perguntar se, no embate do front fiscal, o ministro já não jogou a toalha ao ringue. E se, diante deste revés, há algo mais a fazer.
    O momento delicado exigiria união em prol do interesse geral, mas o que prevalece é a mais rasteira disputa entre poderes, sem que possa haver vencedores.
    Na impossibilidade de reduzir gastos, afrontado pelo Legislativo (devido à sua própria inabilidade e falta de liderança), isolado na luta do ajuste pretendido, restou ao governo se agarrar, contrariando o que fizera no passado, a uma política monetária restritiva. Tenta não perder de vista a promessa de retorno da inflação à meta (de 4,5%) ao término de 2016.
    Nesta sexta-feira (29), o Banco Central subiu a taxa básica de juros (Selic) em 0,50%, a sétima alta consecutiva, para 14,25% ao ano, o maior nível desde agosto de 2006. Juros mais altos aumentam os encargos da dívida, dificultando a retomada do próprio equilíbrio fiscal e do crescimento.
    A permissividade monetária do primeiro mandato, fruto do voluntarismo e do experimentalismo criminosos no campo econômico - e responsável pela persistente alta da inflação desde então - cobra agora o seu alto preço. O remédio ministrado em doses mais fortes, na tentativa desesperada de curar a doença, coloca o paciente em estado vegetativo.
    Tem sido repetido que "será preciso piorar para melhorar". Ao menos já sabemos que o pior ainda está por vir. Anote este nome: Oclocracia.

Por Nilson Mello

Em tempo:

    1. Com meta de superávit primário reduzida em cerca de 90%, equilíbrio fiscal distante, juros em elevação (aumentando os encargos da dívida) e governo sem qualquer credibilidade, por conta disso tudo, é de se estranhar a possibilidade de rebaixamento da nota de crédito do Brasil (e perda do grau de investimento)? Parlamentares ligados à base governista vieram a público protestar contra as agências de classificação de risco. Ingenuidade? Ignorância? Embuste?  
    2. Ainda que sistematizada, por conta de um projeto de poder - e, por isso, levada ao paroxismo - a corrupção não é nem de longe o maior problema que o país enfrenta. A inépcia administrativa, a incompetência técnica e a má gestão têm causado danos bem maiores.
    3. Artigo desta quinta-feira de José Roberto de Toledo em O Estado de S. Paulo informa que, pelo Índice de Confiança Social do Ibope, a presidente Dilma Rousseff e o Congresso empatam em 22 pontos, numa escala de 0 a 100. A confiança na presidente, caiu pela metade em um ano.
      
   



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