sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Artigo

O irresponsável ativismo do governo


Durante muito tempo, já na era do real, se brigou no Brasil por uma taxa de câmbio que favorecesse as exportações. Essa era uma bandeira empunhada com ardor por entidades como a Fiesp, a Federação das Indústrias de São Paulo. A outra bandeira da Fiesp, como sabemos, era a redução da taxa de juros – ainda que não houvesse ambiente fiscal que permitisse essa redução livre de risco para a inflação.
    A ideia era que uma taxa de juro mais baixa fortaleceria o setor produtivo, enquanto um câmbio depreciado, isto é, o real relativamente mais barato frente o dólar, estimularia as exportações. Os defensores dessa, digamos, estratégia, não conseguiam ver o câmbio valorizado como decorrência de uma economia estável.
Muito bem, depois de um longo período de abrandamento da política monetária, com deliberada redução da taxa básica de juro - processo só revertido recentemente, após persistente pressão sobre os índices de preços - e agora que o real entrou em ritmo acentuado de desvalorização, devido, sobretudo, a fatores externos (como a recuperação da economia americana, o que altera os fluxos de capitais globais), podemos retomar o debate com mais lucidez e sem imediatismos.
O processo de redução dos juros, sem que houvesse em contrapartida compromisso estrito no controle de gastos públicos, estimulou o consumo, mas não garantiu crescimento sustentável. A prova é que a inflação persiste em patamares elevados, acima do centro da meta e quase sempre frequentando o seu teto, sem que a evolução do PIB, em todo esse período, demonstrasse qualquer vigor.
Não há qualquer indício, muito menos garantia, de que a desvalorização do real tenha tido contribuição perene para o aumento da produtividade de nossa economia. Muito ao contrário. Um ou outro setor, uma ou outra empresa, pode estar tendo alívio pontual. Mas continuamos a ser uma economia pouco produtiva e pouco competitiva. Neste aspecto, a mudança no câmbio até mascara o problema.
Cabe ainda lembrar que com a alta do dólar teremos uma preocupação adicional com a inflação, na medida em que: 1. os produtos nacionais não sofrerão de forma tão decisiva a concorrência dos estrangeiros; 2. a nossa indústria de transformação pagará mais caro por insumos importados (como celulose), impactando os preços internos.
Os problemas de competitividade da economia têm caráter estrutural que os “simples” atos de vontade e o consequente intervencionismo do governo não serão capazes de resolver. Estranha-se por isso mesmo que entidades empresariais defendam medidas intervencionistas, quando deveriam lutar por um ambiente econômico propício à produtividade e ao empreendedorismo. Esse ambiente só existe com economia estável, com bons fundamentos.
A notícia boa é que alguns formuladores do que se pode chamar de “política econômica” do governo Dilma Rousseff já reconhecem que o ciclo de valorização do dólar, que tende a ser duradouro, por si só, não criará condições favoráveis para a competitividade brasileira.
Vejamos, por exemplo, o que afirma Luciano Coutinho, presidente do BNDES, segundo os jornais desta sexta-feira (23): “Não podemos basear toda a nossa política de competitividade na taxa de câmbio”. Muito bem, mas, então por que apostamos tanto nisso?
Luciano Coutinho defende a retomada dos fundamentos da economia. Ora, chega a ser irônico, pois foi o abandono paulatino, pelo governo, de fundamentos como a responsabilidade fiscal, o rigor na política monetária e o câmbio flutuante que potencializaram o atual cenário de perda de credibilidade e confiança – outro fator a pressionar a inflação e a cotação do dólar.
Em seu início, esse governo teve cacife político para promover a competitividade e a produtividade da economia. Poderia, por exemplo, ter promovido uma ampla reforma tributária, ou destinado mais recursos para investimentos em infraestrutura. Ou ainda, não ter estabelecido, como o fez, por conta de um ativismo tortuoso, programas assimétricos de incentivos fiscais setoriais, que vão contra a ampla concorrência e a desejada competitividade.
O governo Dilma habituou o empresariado a pedir esmola. Desde quando isso estimula a produtividade e a competitividade? Poderia ao menos não ter desestruturado a política econômica que vinha dando certo. Tudo será mais difícil daqui para frente.
Por Nilson Mello


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