O irresponsável ativismo do
governo
Durante muito
tempo, já na era do real, se brigou no Brasil por uma taxa de câmbio que
favorecesse as exportações. Essa era uma bandeira empunhada com ardor por
entidades como a Fiesp, a Federação das Indústrias de São Paulo. A outra
bandeira da Fiesp, como sabemos, era a redução da taxa de juros – ainda que não
houvesse ambiente fiscal que permitisse essa redução livre de risco para a
inflação.
A ideia era que uma taxa
de juro mais baixa fortaleceria o setor produtivo, enquanto um câmbio
depreciado, isto é, o real relativamente mais barato frente o dólar, estimularia
as exportações. Os defensores dessa, digamos, estratégia, não conseguiam ver o
câmbio valorizado como decorrência de uma economia
estável.
Muito bem, depois
de um longo período de abrandamento da política monetária, com deliberada
redução da taxa básica de juro - processo só revertido recentemente, após
persistente pressão sobre os índices de preços - e agora que o real entrou em
ritmo acentuado de desvalorização, devido, sobretudo, a fatores externos (como a
recuperação da economia americana, o que altera os fluxos de capitais globais),
podemos retomar o debate com mais lucidez e sem
imediatismos.
O processo de
redução dos juros, sem que houvesse em contrapartida compromisso estrito no
controle de gastos públicos, estimulou o consumo, mas não garantiu crescimento
sustentável. A prova é que a inflação persiste em patamares elevados, acima do
centro da meta e quase sempre frequentando o seu teto, sem que a evolução do
PIB, em todo esse período, demonstrasse qualquer vigor.
Não há qualquer
indício, muito menos garantia, de que a desvalorização do real tenha tido
contribuição perene para o aumento da produtividade de nossa economia. Muito ao
contrário. Um ou outro setor, uma ou outra empresa, pode estar tendo alívio
pontual. Mas continuamos a ser uma economia pouco produtiva e pouco competitiva.
Neste aspecto, a mudança no câmbio até mascara o problema.
Cabe ainda
lembrar que com a alta do dólar teremos uma preocupação adicional com a
inflação, na medida em que: 1. os produtos nacionais não sofrerão de forma tão
decisiva a concorrência dos estrangeiros; 2. a nossa indústria de transformação
pagará mais caro por insumos importados (como celulose), impactando os preços
internos.
Os problemas de
competitividade da economia têm caráter estrutural que os “simples” atos de
vontade e o consequente intervencionismo do governo não serão capazes de
resolver. Estranha-se por isso mesmo que entidades empresariais defendam medidas
intervencionistas, quando deveriam lutar por um ambiente econômico propício à
produtividade e ao empreendedorismo. Esse ambiente só existe com economia
estável, com bons fundamentos.
A notícia boa é
que alguns formuladores do que se pode chamar de “política econômica” do governo
Dilma Rousseff já reconhecem que o ciclo de valorização do dólar, que tende a
ser duradouro, por si só, não criará condições favoráveis para a competitividade
brasileira.
Vejamos, por
exemplo, o que afirma Luciano Coutinho, presidente do BNDES, segundo os jornais
desta sexta-feira (23): “Não podemos basear toda a nossa política de
competitividade na taxa de câmbio”. Muito bem, mas, então por que apostamos
tanto nisso?
Luciano Coutinho
defende a retomada dos fundamentos da economia. Ora, chega a ser irônico, pois
foi o abandono paulatino, pelo governo, de fundamentos como a responsabilidade
fiscal, o rigor na política monetária e o câmbio flutuante que potencializaram o
atual cenário de perda de credibilidade e confiança – outro fator a pressionar a
inflação e a cotação do dólar.
Em seu início,
esse governo teve cacife político para promover a competitividade e a
produtividade da economia. Poderia, por exemplo, ter promovido uma ampla reforma
tributária, ou destinado mais recursos para investimentos em infraestrutura. Ou
ainda, não ter estabelecido, como o fez, por conta de um ativismo tortuoso,
programas assimétricos de incentivos fiscais setoriais, que vão contra a ampla
concorrência e a desejada competitividade.
O governo Dilma
habituou o empresariado a pedir esmola. Desde quando isso estimula a
produtividade e a competitividade? Poderia ao menos não ter desestruturado a
política econômica que vinha dando certo. Tudo será mais difícil daqui para
frente.
Por Nilson
Mello
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