A literatura política na ficção
Trotski estava certo ou isso perdeu relevância?
Em O homem que amava os cachorros, o premiado escritor cubano Leonardo
Padura expõe de forma contundente as contradições de uma ideologia que tolhe a expressão
da individualidade na sua autoproclamada e paradoxal busca pelo bem-estar dos
indivíduos.
A repressão dos autênticos anseios pessoais e sua
submissão a projetos ideológicos, em nome de interesses coletivos supostamente
mais elevados, tem sido a fórmula infalível do fracasso de Estados que
acreditam poder refundar a natureza humana por meio da força. Lamentavelmente esse
foi também um ingrediente determinante dos grandes conflitos do século XX.
O marxismo identificou na mais valia - na apropriação,
pelo empregador, de uma parcela do trabalho do empregado e na sua transformação
em lucro - a causa das injustiças sociais. A eliminação das classes, da
propriedade privada e, por consequência, do próprio lucro transformaria a
humanidade.
O diagnóstico vigoroso conquistou o mundo. De forma
subjacente, contudo, a doutrina preconizou, a despeito das evidências em
contrário, algo que nem as religiões monoteístas, fundadas na fé absoluta num
Deus infalível, arriscaram fazer: tornar o homem um ser perfeito, livre de
vícios.
O desmoronamento do Bloco soviético no final dos anos
1980, depois de décadas de promessas originadas na Revolução de outubro de
1917, provou que o bem-estar da coletividade não pode ter como pressuposto o
sacrifício dos projetos individuais. Hoje, quem se livrou do “dogma” percebe
que são as aspirações pessoais a mola propulsora do mundo, porque delas depende
a eficiência econômica. A soma dessas aspirações, dentro de um ambiente regrado,
garantirá os avanços da sociedade em direção ao progresso.
A Lei deve coibir abusos e garantir igualdade de
condições na competição - resguardando direitos aos menos capacitados e às
minorias - sem, contudo, nivelar indivíduos, que são, por natureza, desiguais. Essa
é a verdadeira sociedade justa, e não aquela que, por decisão autoritária de um
Estado onipresente, define o que cabe a cada um.
A força do livro de Padura está no fato de não ser uma
crítica previsível ao modelo. A sua ficção presta uma homenagem à
história. O próprio autor foi forjado no sistema (nem tudo foi em vão, afinal!).
O relato esterilizado da trajetória de Ramón Mercader,
o executor de Leon Trotski que, em nome de um projeto revolucionário, anulou a
sua individualidade e acreditou cegamente no que lhe determinaram, é didático
sem necessidade de recursos a adjetivos ou a conclusões panfletárias. O mesmo
vale para a história entrelaçada de Iván, jovem escritor, atônito com as
diretrizes do regime cubano, às quais tenta, com sofrimento, se adequar.
A grande fome
que resultou da política de coletivização da agricultura promovida por Satlin
(produtores rurais foram expropriados até de seus cães e sementes), entre 1929
e 1933, mencionada no livro de Padura, foi justificável na perspectiva
revolucionária, mesmo tendo levado à morte milhões de pessoas? Ou podemos dizer
que é a propriedade privada e, por extensão, a possibilidade de lucro, o maior
incentivo à produção e a tão almejada segurança alimentar?
De forma mais prosaica, podemos ainda indagar - sem
que isso tenha mais a menor relevância hoje, o que não deixa de ser trágico - com
quem estava a legitimidade revolucionária, com Trotski ou Stalin?
As respostas não estão no livro, mas ele nos ajuda a perceber
que há verdades irrefutáveis transcendentes à luta de classes.
Por Nilson Mello
Em tempo
O PT engrena o ano eleitoral em briga aberta com o
maior partido da base governista e, ao menos em teoria, o seu forte aliado nas
urnas em outubro, dada a sua capilaridade Brasil afora. Dez em dez analistas
seriam capazes de garantir que um revés do PT na eleição presidencial deste ano
está condicionado a uma defecção do PMDB. Isso considerado é difícil entender a
lógica que tem orientado o movimento da cúpula petista nos últimos dias. A não
ser que a mídia esteja exagerando o confronto – o que é bastante provável.
Anote
Se não está à beira de uma crise, como lucidamente
ponderou Armando Castelar Pinheiro, em artigo no Valor desta sexta-feira (07/03), a economia brasileira continua a
dar sinais para preocupação. A piora na balança comercial em fevereiro é mais
um deles. Vale, portanto, repetir a observação de Castelar: “...as reformas necessárias
para acertar o rumo estão ao nosso alcance. Apenas temo que a situação tenha
que piorar antes que elas sejam feitas”.
Exportar a revolução para outros países ou não, parece ter sido o principal motivo da briga entre Stalin e Trotski. De qq forma acho que o emprego da força gera a ilegitimidade de ambos. O Sr. Castelar poderia dizer quais seriam as reformas necessárias para acertar o rumo e o povo se encarregaria de questionar o governo, exigindo o debate político-econômico, inclusive o que chamam de reforma fiscal, trabalhista etc. Ué tem de haver transparência no que estão fazendo. É nosso direito cobrar isto, para sabermos votar!...
ResponderExcluirCaro Fauzi, a questão é que a doutrina comunista se move por meio da luta e da revolução. Está no DNA da ideologia. Obrigado pelo comentário. Abrcs
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