O que é
melhor para o país?
Collor renunciou, mas foi processado pelo Senado
As
possibilidades de abertura de um processo de impeachment passam a ser maiores em função das novas revelações da
Operação Lava Jato e também por conta do relatório do TCU divulgado esta semana
apontando crime fiscal nas manobras realizadas pelo governo para esconder os
rombos nas contas públicas. Mas não devemos estar felizes por isso, mesmo que
contrários e críticos a este governo.
A
instabilidade institucional projeta cenários nebulosos, contraproducentes.
Aumentam as incertezas políticas ao mesmo tempo em que diminuem, no sentido
contrário, as chances de êxito dos ajustes que a equipe econômica começa a
implementar na tentativa de corrigir os desarranjos promovidos no primeiro
mandato.
Como
ter confiança no que está sendo decidido agora se não se sabe quem estará no
comando amanhã? Aliás, quem estará no
comando amanhã, aquele ou aqueles que a Constituição, sucessivamente, determina
como substituto ou substitutos, ou alguém que assumirá o Poder dentro de uma
solução fora do "script"?
Os
30 anos decorridos desde a redemocratização (reconheça-se, o mais longo período
de estabilidade institucional da República) deveriam ser suficientes para nos tranquilizar
quanto à manutenção das "regras do jogo". Contudo, devido ao nosso
histórico nada recomendável (ver ensaio
da último segunda-feira neste Blog), dúvidas, ainda que tênues, são
justificáveis.
Mas
não é só isso: jamais podemos ter certeza se, na hipótese de afastamento, terá
o substituo vontade política ou mesmo competência suficientes para dar
continuidade à difícil tarefa já iniciada.
Impeachments, renúncias e outras "intercorrências
institucionais" são sintomas de imaturidade política. O impeachment, ainda que decidido no curso
de um processo legal e legítimo, com previsão constitucional, revela um vício
de origem que escancara a deficiência do modelo: a má qualidade do eleito, consequência
direta da má qualidade do eleitor.
Mas,
para quem tem ido às ruas achando que o "recall" é saída simples, não deve ter entendido ainda que não
há atalhos. E nem alternativa melhor à democracia. É preciso insistir
permanentemente no aperfeiçoamento do modelo, sem sobressaltos ou retrocessos.
O Impeachment é, digamos, um desses
sobressaltos, ainda que com previsão legal. E o maior drama é que, neste
momento, ele parece ser apenas questão de tempo. É prejudicial ao país quase tanto
quanto seria a manutenção de um presidente comprovadamente responsável por
ilegalidades. Eis a magnitude de nosso dilema!
A
oposição
Parcela
significativa da oposição vive também um conflito não declarado em relação à
questão, porém, mais por razões de sobrevivência do que de princípios. Sabe
que os índices de reprovação do governo, do PT e, mais precisamente, da
presidente da República - hoje em mais de 60%, segundo pesquisa do Datafolha - são
garantia de apoio popular a um eventual pedido de abertura do processo - um
pré-requisito talvez tão importante quanto os pressupostos legais e políticos.
Sabe
também que, se não estiver à frente da iniciativa, ignorando o ronco das ruas,
que soou forte nas manifestações de 12 de abril e de 15 de março, corre o risco
de perder credibilidade junto ao eleitor. Afinal, se a maior parte da população
mostra-se insatisfeita com o desempenho do governo e o responsabiliza pela
corrupção, o papel da oposição (qualquer que seja) é justamente canalizar o
sentimento popular e transformá-lo em ação.
Para
não cair no limbo, portanto, evitando o repúdio popular pela indiferença e
omissão, legendas oposicionistas, PSDB à frente, decidiram esta semana encomendar
um parecer jurídico sobre a questão. Quem coordenará o trabalho é Miguel Reale
Júnior, renomado jurista, que, em recente artigo na grande imprensa, não
escondeu a sua posição: considera haver provas incontestes de responsabilidade da
presidente da República em atos ilegais praticados em seu governo, o que tornaria
a abertura do processo de impeachment
quase que uma obrigação moral do Congresso.
Em
seu texto, Reale Júnior ainda alude, como alternativa à presidente, a renúncia,
a exemplo do que fez Collor para evitar o afastamento compulsório, como
desfecho do julgamento de seu impeachment
pelo Congresso.
Mas
a oposição está visivelmente encabulada. Compreende-se. Ao mesmo tempo em que
não quer dar um tiro no pé - exigindo abertamente um processo que mais tarde
poderia se frustrar sem a efetiva condenação -, está ciente de que, até por uma
questão de sobrevivência, não pode ficar à margem do clamor público.
O
contraponto
Para
que haja abertura de processo é preciso que a presidente da República tenha
incorrido em crime de responsabilidade, conforme as hipóteses enumeradas no
artigo 85 da Constituição Federal, entre elas atos contrários aos preceitos
constitucionais, à probidade administrativa, à lei orçamentária e ao
cumprimento das leis e das decisões judiciais. Ou que tenha cometido crime
comum, cabendo, no caso, ao Procurador Geral da República entrar com pedido de
abertura de processo junto ao Supremo.
Que
este é um governo mergulhado em escândalos de corrupção não restam dúvidas. Mas
as provas concretas da participação direta da Presidente da República nos eventuais
desvios e irregularidades, ou de sua responsabilidade como chefe de Estado e
governo, ainda precisarão ser apresentadas. Compartilha esta opinião - em contraponto
a Reale Júnior - Joaquim Falcão, outro jurista renomado.
Uma
vez apresentadas as provas, a acusação deverá ser admitida pela Câmara dos
Deputadas, com pelo menos dois terços dos votos. Admitida, o julgamento será
feito pelo Supremo, nos crimes comuns, e pelo Senado Federal, nos crimes de
responsabilidade.
Em
suma, é um procedimento e um processo de caráter político. Portanto, o grau de
sustentação do governo no Legislativo e junto à classe política é determinante
para a abertura ou não do processo, assim como o nível de aprovação junto à
população. O atual governo não tem nem uma coisa nem outra.
Por
Nilson Mello
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