sexta-feira, 19 de dezembro de 2014


Cuba, os EUA e os portos brasileiros
Porto de Mariel, em Cuba: dinheiro brasileiro
 

     Apesar do novo marco regulatório do setor - a Lei 12.815, sancionada em junho de 2013 -, os terminais portuários brasileiros seguem congestionados, elevando os custos para a combalida cadeia produtiva nacional e comprometendo a já baixa produtividade da economia brasileira. As raras exceções são os empreendimentos privados mais recentes, mas mesmo esses têm sua eficiência em parte eliminada pelas precárias interconexões rodoviárias e ferroviárias ou devido à falta de dragagens nos canais marítimos.

Navio parado na “fila” à espera de atracação, como ocorre no Brasil, é sinal de ineficiência – e prejuízo certo. Enquanto nos principais portos do Mundo um navio leva menos de duas horas para embarcar e desembarcar, no Brasil um navio chega a ficar dias à espera da atracação, gerando atrasos em cascata, que subvertem o planejamento logístico e jogam os custos para a estratosfera.

A nova Lei dos Portos, como é conhecida, até eliminou obstáculos que travavam os investimentos (condição para a expansão do setor), como a absurda obrigação imposta aos terminais privativos de movimentar carga própria de forma preponderante – o que, evidentemente, afastava grande parte dos investidores. Ora, se minha razão de ser é a logística portuária, movimentando cargas de terceiros, não posso ter carga própria de forma preponderante, a não ser que deixe de ser o que sou.

A “armadilha”, criada, evidentemente, para resguardar mal disfarçadas reservas de mercado (em especial, a dos terminais públicos arrendados, que teriam que enfrentar novos competidores com uma concorrência ampla e aberta, algo bom para o país, mas ruim para eles), impediu durante longo tempo que uma nova leva de aportes fosse feita em terminais privativos nacionais.

Desfeito este nó, cujos resultados ainda demorarão alguns anos para aparecer, outras barreiras, contudo, sobreviveram ao novo marco regulatório – ou, o que é muito pior, vieram junto com ele. Entre elas estão as elevadas e descabidas exigências de licenciamento para a expansão de terminais já existentes ou as restrições para a ampliação de empreendimentos dentro do Porto Organizado (Porto Público).

É como se o governo acertasse (?) pela metade, anulando eventuais benefícios de suas próprias iniciativas. Não se trata apenas de “determinismo ideológico” – algo que por si só afasta dos gabinetes de Brasília qualquer vestígio de racionalidade econômica -, mas de incompetência pura e simples.

Além de afastar os entraves burocráticos remanescentes, permitindo o aumento significativo dos investimentos privados no setor portuário (algo que está no espírito da Lei 12.815/2013), o governo deveria se ocupar de, paralelamente, investir na melhoria dos acessos terrestres aos terminais. As “filas” de navios e, consequentemente, a ineficiência dos portos são também reflexo do sucateamento da infraestrutura em seu entorno.

Onde Cuba e Estados Unidos entram nesta história? Bem, o Brasil financiou, via BNDES, a construção do porto cubano de Mariel. A obra custou cerca de US$ 1 bilhão – com aproximadamente de R$ 90 milhões dados pelo Brasil a fundo perdido (sem nada em troca). Não se tem notícia de nenhum terminal brasileiro, público ou privado, que tenha recebido aporte tão generoso. Um bilhão de dólares resolveria todos os entraves estruturais – melhoria dos acessos rodoviário e ferroviário e integração intermodal - no Porto de Santos, o maior da América Latina e por onde passa um quarto da balança comercial brasileira.
    Agora que Cuba e Estados Unidos reatam relações, o governo mobiliza a sua propaganda para justificar o investimento em Mariel como uma bem urdida estratégia para se beneficiar do provável fim do embargo comercial à Ilha dos irmãos Castro. Potencialmente, e em tese, o fim do embargo, quando acontecer (pois ainda depende de uma decisão do Congresso americano), pode beneficiar o intercâmbio comercial de todas as nações do planeta com Cuba. E, ainda assim, apenas potencialmente, porque por mais que a demanda na ilha caribenha esteja reprimida, o aumento das transações comerciais depende de uma série de variáveis de mercado.

Navios das rotas internacionais não farão escala em Cuba apenas porque lá tem um novíssimo porto. Não é esta a lógica econômica que determina os negócios. Mas, ainda que tudo dê certo no curto prazo para os cubanos, como esperamos, o Brasil terá sido o único país a pagar US$ 1 bilhão por aquilo que todas as nações terão sem desembolsar um centavo: o direito de livre comércio com a ilha caribenha. Vai entender!

Por Nilson Mello

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