quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Artigo

A política econômica da inflação

Celso Pastore e Mendonça de Barros

    A elevada taxa de juros brasileira não é resultado de uma teimosia do Banco Central, lembrou o economista (e ex-presidente do próprio BC) Affonso Celso Pastore, em recente artigo. Não decorre, portanto, de uma má-fé sádica ou de um conluio perverso entre BC e sistema financeiro, em detrimento da sociedade.
A manutenção da taxa de juros em patamares mais elevados - ou, em outras palavras, a manutenção de uma política monetária restritiva - tem sido, na verdade, uma necessidade que decorre da combinação de um contexto desfavorável com um objetivo inalienável, sobretudo para um país que busca o desenvolvimento sustentável.
Esse objetivo é o combate à inflação, e ele se torna inalienável na medida em que reconhecemos que o descontrole de preços atua de forma deletéria na economia, impede o planejamento das empresas, desorganiza contas públicas e privadas, gera insegurança jurídica (porque corrói contratos) e atinge de forma mais severa justamente a população de baixa renda. Vimos isso num passado não muito distante.
Já o contexto desfavorável é dado pelo excesso de gastos governamentais, ou seja, resulta de uma política fiscal frouxa (apesar dos recentes e pontuais esforços), cuja ênfase se dá nas despesas correntes, o que impede que parcelas maiores de receitas sejam destinadas aos investimentos. De volta a Pastore, ele salienta que o governo precisa gastar menos para aumentar a poupança do setor público.
E é preciso lembrar que os investimentos em infraestrutura e produção dependem de poupança. São pré-condição para o desenvolvimento sustentável, pois contribuem para o combate à inflação: eliminam gargalos que pressionam custos e previnem o descompasso entre excesso de demanda e capacidade de oferta.
A alta dos preços, por definição, nada mais é do que o resultado de uma demanda por produtos e serviços acima da capacidade de produção da economia. É claro que quem acredita que os juros são altos por maldade do BC vai dizer também que a inflação é gerada pela ganância do empresário, ávido para aumentar seu lucro. Mas o debate sério sobre economia e inflação exige respeito a princípios da Teoria Econômica e distanciamento dos preconceitos ideológicos fomentadores desse tipo de observação pueril.
Pois bem, o que tem mobilizado economistas e analistas de variadas correntes neste momento é a tentativa de identificar que linha de ação é essa que governo e BC adotaram na política econômica - e procurar entender e verificar a consistência de seus fundamentos. Carlos Alberto Sardenberg encontrou um termo para defini-la: “esquizofrenia”.
Ao que parece – e também tem sido dito por integrantes do próprio governo – o BC, em sintonia com o Planalto, decidiu promover um ciclo de baixa das taxas básicas de juros, a despeito dos evidentes riscos de aumento da inflação, porque aposta numa queda da demanda agregada mundial com a crise financeira global.
Assim, baixará os juros e aguardará os efeitos da crise sobre os preços internos. Ao mesmo tempo, comemora a redução da dívida pública em função da queda de juros, bem como a manutenção da atividade econômica interna em meio aos abalos internacionais.
Sobre essa possibilidade (de derrubada da inflação por fatores exógenos) é oportuna a opinião de outro economista, José Roberto Mendonça de Barro, ex-secretário de Política Econômica: “Seria preciso um derretimento de proporções bíblicas na economia mundial, incluindo Índia, China e toda a Ásia, para que o cenário no qual as autoridades apostam possa ocorrer”.
A alternativa possível, ressalta Mendonça de Barros, “é que o governo esteja disposto a conviver com a inflação”. E é exatamente isso, apesar de todo o discurso em contrário, desde a posse de Dilma Rousseff.

Por Nilson Mello

Nenhum comentário:

Postar um comentário