segunda-feira, 6 de junho de 2011

ARTIGO

   Collor e o verdadeiro crime de Palocci

    O episódio Palocci e a crise política que lhe é inerente expõem um paradoxo. O principal ministro da presidente Dilma representava uma barreira de contenção aos excessos fisiológicos que o presidencialismo de coalizão brasileiro impõe ao governante.
Palocci também era o líder da ala do governo mais alinhada com uma visão de mercado, em contraste com interesses meramente políticos, sobretudo em assuntos econômicos de relevância, como o combate à inflação.
     Sua saída presume-se, portanto, deve dar aos partidos que compõem a ampla colcha de retalhos da base governista – o voraz PMDB do vice-presidente Michel Temer à frente - a chance de alcançar, de forma plena, o seu objetivo.
Quando firmaram o pacto de coalização para eleger o atual governo, essas legendas tinham como meta óbvia uma ampla distribuição dos cargos de primeiro, segundo e terceiros escalões no governo central - bem como em autarquias e estatais – fazendo da máquina pública, como de hábito, um butim a ser partilhado por aliados.
Pela ótica dos partidos, quanto mais ampla essa partilha for, melhor - pois dela depende o seu fortalecimento e a sua luta para se manter no poder. Infelizmente, nesse jogo, o interesse nacional conta pouco.
Nenhuma surpresa. Dentro do atual modelo político essa é a prática possível. Foi assim nos dois primeiros governos de Lula (e mais nitidamente, a partir do Mensalão, em nome da própria sobrevida do primeiro mandato), e também nos governos de Fernando Henrique Cardoso, caracterizado pela “parceria” PSDB-PFL.
Há, contudo, limites ao pacto de coalização. Se rompê-lo significa gerar instabilidade institucional, ultrapassar esses limites significa arriscar a governabilidade não do ponto de vista político, mas da gestão. A Palocci cabia estabelecer os limites ao “botim”, em prol de parâmetros mínimos para a eficiência da máquina pública. Parâmetros por sinal indispensáveis a uma gestão de resultados.
Não é exagero dizer que Palocci está caindo não pelo que fez – um rápido enriquecimento por suposto tráfico de influência – mas pelo que tem deixado de fazer em benefício dos partidos da base governista. Afinal, qual político de notoriedade não enriqueceu rapidamente?
Numa análise realista, podemos dizer que o ministro, antes visto como um hábil articulador, provavelmente “errou na mão”. Os pseudo-aliados, descontentes, o colocaram sob o “fogo amigo”. A oposição, oportunista e sem saber mais qual é a sua razão de ser, ajudou a alvejá-lo.
Seria uma ingenuidade achar que se o ministro tivesse dado esclarecimentos convincentes na sexta-feira passada ao Jornal Nacional conseguiria esvaziar a crise. No contexto, isso pouco importa. Ora, não foi a corrupção que derrubou o governo de Fernando Collor (o que, evidentemente, não quer dizer que não merecesse o impeachment), mas a sua afronta à classe política.
Lula, que é um estudante atento embora avesso aos livros, aprendeu rápido na prática e, quando o seu mandato começou a fazer água com escândalos dignos da era Collor, jogou-se no colo do PMDB. De onde não saiu mais.
Palocci perdeu a sintonia fina. Que substituto poderá exercer com eficiência a tarefa de conter o fisiologismo, viabilizando a gestão administrativa sem comprometer a sustentação política, é uma questão pertinente a partir deste momento.
O certo é que, com ele, mesmo sem indícios “da materialidade do crime”, para usar a sua própria terminologia, o governo Dilma não tem como prosseguir.

Por Nilson Mello

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