Putin, o enxadrista
Nilson Mello
Putin joga xadrez
diplomático. É hábil e estrategista. Fabricou esta crise com a Ucrânia para
consolidar seu prestígio e para tentar restaurar à Rússia o papel de potência
Global, ou ao menos não relegá-la de vez a um segundo plano. A possibilidade de
esse movimento de fato terminar em guerra (algo que não interessa a ninguém)
sempre foi remota, mas ainda assim a jogada foi arriscadíssima - justamente
porque o conflito armado não interessa a nenhuma das partes, muito menos à
Rússia.
A motivação do conflito
seria o fato de a aliança ocidental (OTAN) estar nas fronteiras russas, hoje
acomodando ex-estados satélites soviéticos, o que, reitera Putin, com muita
eloquência e inteligência, é uma “projeção de poder”, uma ameaça permanente. Seria
quase como se a Venezuela, Cuba ou o México ingressassem numa aliança militar
liderada pela Rússia e permitissem, em seu território, mísseis apontados para
os Estados Unidos.
Ocorre que esses
ex-satélites aderiram à OTAN justamente porque se sentiam ameaçados por Moscou.
Outro dado relevante é que os Estados Unidos não abocanharam, ao menos recentemente,
territórios dos vizinhos. Recentemente, pois, no Século XIX, tomaram do México
uma vasta área que hoje engloba Califórnia, Arizona, Nova México, Montana, Colorado
e parte de outros estados, sem contar o que foi conquistado da França, desde o
Sul do Golfo do México até o Norte do Missouri.
Muito bem, foi a
possibilidade de invasão russa – e não o contrário - que fez o governo de Kiev procurar
o mesmo caminho que seus vizinhos, ensaiando ingressar na aliança do Atlântico
Norte, o que serviu de estopim para a atual crise, lembrando que outro dia
mesmo (2014) a Ucrânia teve parte de seu território (na Crimeia) (re) tomada
pela Rússia. Na Crimeia está uma antiga base naval soviética. O território faz
parte de uma grande região cedida por Moscou a Kiev em meio à estruturação da
URSS promovida pelos primeiros líderes soviéticos. Há também na Ucrânia uma
considerável parcela da população de origem russa, além de atuantes movimentos
separatistas pró-Rússia.
Nenhum desses aspectos
históricos e políticos, contudo, é argumento suficiente para impedir o governo
da Ucrânia, democraticamente escolhido pela maioria de sua população, de escolher
qual aliança integrar. Putin está ciente disso, mas, se aceitasse calado a
entrada da Ucrânia (a mais importante das antigas Repúblicas soviéticas) na
OTAN, seria como se a Rússia renunciasse de vez a um papel geopolítico de
relevância. Como enxadrista diplomático, preferiu o risco.
No cálculo político, até
para o seu “público interno”, ficar inerte traria um prejuízo maior, para si e
para o país que governa. Agiu ciente de que não precisaria ir às vias de fato.
E por essa razão, não deve haver qualquer surpresa em relação ao seu sutil
recuo desta terça-feira, que distendeu tensões e aliviou mercados.
Concordo plenamente Nilson, mas o grande sonho de Putin é anexar todos os outros territórios que faziam parte da ex União Soviética.
ResponderExcluirBastante interessante sua abordagem, claro que um grande líder não quer perder de graça seus aliados. Estratégia perigosa mundialmente falando, mas não o deixa como um desinteressado ou desleixado. Faz parte do jogo fazer firulas.
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