Das novas cepas aos investimentos
O surgimento da variante Ômicron,
condicionando a volta de medidas restritivas em vários países, em especial na
Europa, gerou na última semana incertezas quanto a uma recuperação sustentável
da economia global nos próximos meses. As dúvidas aumentam em função da
desaceleração da atividade na China, locomotiva do comércio internacional,
nosso grande demandador de commodities. Ainda é difícil estabelecer o alcance e
a duração das novas diretrizes sanitárias e, consequentemente, prever o real
impacto sobre a atividade econômica no Brasil e no Mundo.
A Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), contudo, assumindo que a recuperação mundial perderá
ímpeto, reviu a previsão de crescimento do PIB do Brasil em 2021, de 5,2% para
5%, assim como o fez em relação a outras economias. A OCDE já errou antes e a torcida
é para que esteja novamente equivocada neste momento em que os dados do fluxo
comercial revelam recuperação.
O comércio global deve atingir a
marca de US$ 28 trilhões este ano, um aumento de 11% em relação aos níveis
verificados antes da pandemia, de acordo com previsão da Agência das Nações
Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Uncatad). Em relação ao depressivo
ano de 2020, o aumento foi de 23%, ou de US$ 5,2 trilhões em valor. Com pequena
inserção internacional, se considerado o tamanho de sua economia, o Brasil
também deverá alcançar um crescimento de 11% em suas trocas internacionais
(exportações e importações) este ano em relação a 2019, aponta a agência.
Em paralelo aos números e à luz da
Teoria da Evolução, o que a Ciência pode nos dizer em relação à Covid-19 é que
novas cepas tendem a ser mais contagiosas, porém, menos letais (o que vale para
qualquer virose), tendo em vista a própria necessidade de sobrevivência do vírus
invasor, cujo sucesso depende da sobrevivência do hospedeiro.
Convém lembrar que o desenvolvimento
de vacinas - algo indispensável e prioritário - em meio a uma pandemia acaba
potencializando variantes mais resistentes, razão pela qual cientistas salientam
a importância de manutenção de ações preventivas (distanciamento, máscaras etc),
bem como a adoção de outras estratégias de combate à doença, em especial o
desenvolvimento de antivirais para o tratamento dos casos menos graves, gerados
pelas novas cepas.
Por outro lado, se a vacinação foi
decisiva na contenção da pandemia, a imunização desigual entre países e
continentes propiciou, igualmente, o desenvolvimento de variantes. Na África,
como um todo, apenas 10% das pessoas estão vacinadas, sendo que, em algumas
regiões, menos de 1% da população foi imunizada, estatísticas que escancaram
não apenas as disparidades econômicas e sociais, como o fracasso das nações
ricas (e da própria OMS/ONU) em estabelecer uma estratégia global e solidária
para o enfrentamento da Covid-19.
O Brasil, onde 80% da população receberam
ao menos uma dose e mais de 60% estão plenamente vacinados, registrou esta
semana dois casos da Ômicron, com outros seis sob suspeita. A nova cepa chega
em meio a dados relativamente mais positivos sobre o emprego e o déficit
público. A boa notícia sobre o emprego é que há mais gente trabalhando no país,
justamente como resultado da melhoria dos indicadores da pandemia, em função do
avanço da vacinação.
De acordo com o IBGE (PNAD/Contínua),
a taxa de desemprego recuou de 14,2% para 12,6% no segundo trimestre, com
nítida melhora das vagas formais, embora ainda haja 13,5 milhões de desempregados
e 30 milhões de trabalhadores subutilizados. A recuperação foi relativamente
rápida, sobretudo se considerado que os dados pré-pandemia, relativos e emprego,
já não eram bons. Mesmo com o aumento das vagas, contudo, a renda mínima do
brasileiro sofreu queda de 11,1%, como consequência da estagnação econômica e
do aumento da inflação. Há mais gente trabalhando, mas sem melhora da massa
salarial.
Nunca é demais ressaltar que, em
relação ao mercado de trabalho, o Brasil enfrenta, a par de questões
conjunturais (exemplo: pandemia), obstáculos de ordem estrutural, representados
pelo ainda alto custo emprego (os altos encargos) e o excesso de burocracia,
apesar de reformas paliativas e pontuais recentes, bem como pela baixa
capacitação profissional, decorrente de um sistema de ensino deficiente e
distante dos desafios econômicos. Esses fatores ajudam a explicar uma alta taxa
de informalidade, de 40% da massa de trabalhadores (IBGE).
A análise deve ainda considerar que o
Brasil teve, entre 2011 e 2020, a pior década para a economia em 120 anos (FGV),
crescendo apenas 0,3% no período. No ano passado, por força da pandemia, o PIB
brasileiro sofreu queda de 4,1%. Um recuo forte, mas ainda assim menor do que o
anteriormente esperado e, nominalmente, desempenho melhor do que a maioria dos
países com relevância econômica, entre os quais Espanha (-11%), Reino Unido (-9,9%),
Itália (-8,8%), França (-8,1%), Alemanha (-5,3%), Japão (-4,8%).
Os dados relativos às contas públicas
refletem igualmente o impacto da pandemia no ano passado e uma melhora este
ano, apesar das incertezas em relação a uma efetiva ancoragem fiscal no
orçamento de 2022, submetido a intenso debate no Congresso. O Banco Central informou
esta semana que o setor público em conjunto, que inclui governo federal,
estados, municípios e estatais, obteve superávit primário (resultado desconsiderando
o pagamento de juros) de R$ 35,39 bilhões em outubro, contra R$ 2,9 bilhões no
mesmo mês no ano passado.
Esse foi o melhor resultado para
outubro desde 2016, graças à maior arrecadação tributária registrada em cinco
anos para o período – o que também revela melhora da atividade econômica. Nos
12 meses contados até outubro, porém, o resultado continua amplamente negativo,
com déficit nominal de R$ 398,7 bilhões, correspondendo a 4,72% do PIB,
lembrando que no auge da pandemia, o déficit chegou a ser de R$ 703 bilhões
(BC).
A exemplo dos Estados Unidos e da
Zona do Euro, o Brasil enfrenta um “surto” inflacionário, o que pode determinar
a manutenção de taxas de juros mais altas, dificultando não apenas a retomada
da economia e como agravando a situação das consta públicas. Essa conjuntura,
aliada às incertezas quanto à possibilidade de novas ondas de Covid-19,
contribui para turvar o horizonte nesta reta final de ano.
Apesar de tudo, de um lado, o fato de
a economia brasileira e mundial ter revelado mais resiliência do que se
esperava nesta crise e, de outro, a certeza de que a Ciência está cada vez mais
preparada para combater a pandemia ainda deixam margem para otimismo. Isso
talvez explique por que as expectativas de investimentos por parte do mercado permanecem
elevadas. Somente no setor portuário, esperam-se aportes totalizando R$ 16
bilhões com a privatização das Companhias Docas e de terminais isolados. Em
saneamento, outros R$ 8 bilhões em investimentos são aguardados, como resultado
do novo marco legal setorial. Não há saída: é continuar trabalhando.
Por Nilson Mello
Excelente resumo desse momento impar pelo qual estamos passando. Cada vez mais aumenta a consciência de que problemas globais exigem soluções globais. Seguir trabalhando com otimismo calcado em fatos é o que podemos fazer. Vamos em frente!
ResponderExcluirExcelente.....
ResponderExcluirMuito bom, mas discordo da crítica à ONU, u
ResponderExcluirA organização intergovernamental que só faz o que países-membros mandarem e financiarem.