(obs: artigo publicado simultaneamente com a revista Portos & Navios)
A preocupação de governos, deste e de
anteriores, em ampliar os investimentos em infraestrutura logística e de
transportes, por meio de privatizações e de novos marcos legais, é plenamente
justificável considerando o grande potencial de crescimento desses setores, bem
como a necessidade de retomada consistente e sustentável da economia no longo
prazo. Investir em infraestrutura significa prevenir gargalos que aumentam custos
e, no sentido inverso, reduzem a eficiência e a competitividade.
Tendo em vista as evidentes
limitações orçamentárias que o país ainda enfrenta, em função da questão
fiscal, é do setor privado que cada vez mais virão os investimentos necessários
ao desenvolvimento. Um dado estimulante é que a taxa de investimento em
máquinas, equipamentos e obras, que em média situava-se entre 16% desde 2015 e
não ultrapassava os 18% desde 2000, em maio deste ano chegou a 22,1%, segundo a
FGV. A economia dá claros sinais de revitalização: a previsão de avanço do PIB
em 2021, de acordo com o mercado, passou a ser de 5,26%, contra 4,85% de poucas
semanas atrás.
Os setores de portos e ferrovias têm
clara participação no melhor desempenho dos investimentos. Nos portos, por onde
passam mais de 95% de nossas exortações, desde 2019 foram concedidas 96
autorizações para terminais privados, que somam R$ 8,9 bilhões em contratos. Somente
em 11 contratos firmados nos últimos dois anos foi garantido mais de R$ 1,4
bilhão em investimentos em terminais portuários, em oito estados.
Os investimentos no setor ganharão um
impulso ainda maior com as desestatizações da Companhia Docas do Espírito Santo
(Codesa), programado para o último trimestre do ano, e do Porto de Santos, em
2022. Somente para a Codesa, cujo modelo de privatização foi publicado no
Diário Oficial da União no mês passado, espera-se mais R$ 1 bilhão em
investimentos.
As ferroviais têm sido outro capítulo
importante. Desde 2019, já foram contratados R$ 31 bilhões em investimentos,
parte deles estruturada em governos anteriores. Vale dizer que os investimentos
no setor saltaram de R$ 420 milhões em 1997 para R$ 6,9 bilhões, em 2020, um
avanço de 1.400% no período, tendo alcançado o pico em 2015 (R$ 7,7 bilhões),
de acordo com a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF).
No período, a movimentação de carga
geral pela malha ferroviária passou de 26,9 toneladas por quilômetro útil (TKU)
para 110,2 TKU, uma variação de mais de 300%. Um fator que torna o setor potencialmente
mais atrativo aos investimentos é a sua pequena participação na matriz de
transportes, comparativamente a outros países.
Dos seis maiores países em extensão
territorial, o Brasil é o que mais emprega o modal rodoviário no transporte de
carga e o segundo que menos emprega as ferrovias. Em regra, comparativamente
aos modais ferroviário e aquaviário, o transporte por rodovias é mais poluente
e menos seguro. Não havendo subsídio ao combustível, será invariavelmente
também o mais caro.
Maior país do mundo, a Rússia utiliza
a malha ferroviária para o transporte de 81% de sua carga. Apenas 8% desse
transporte são feitos por rodovia. No Brasil, 68% da carga são transportados
por rodovias, enquanto apenas 21,5% seguem por ferrovias (ANTF), cabendo o
restante aos modais aquaviário e, em menor participação, aéreo.
Na Austrália e no Canadá, também de
dimensões continentais, as ferrovias têm igualmente grande importância
estratégica, respondendo por 55% e 34% do transporte de carga, respectivamente,
contra 27% e 19% do modal rodoviário. Mesmo nos EUA, país rodoviário por
excelência, as rodovias têm uma participação no transporte de cargas (43% de
sua matriz) menor do que no Brasil, enquanto as ferrovias respondem 27% desse tipo
de movimento.
Entre as seis maiores nações em
extensão territorial, apenas a China transporta menos carga por trem (apenas
14% da matriz) do que o Brasil, dando ênfase ao modal aquaviário (51% da
matriz, a maior entre os seis gigantes) e também às rodovias (35%). Cabe dizer
que somos também, dentre os seis, o país que menos utiliza o modal aquaviário (cerca
de 10%).
Portanto, propostas que venham a
estimular uma maior participação desses dois modais na matriz de transportes
nacionais são sempre bem-vindas. No caso das ferrovias, o governo pretende
estimular, dentro do novo marco legal, o regime de autorizações, mais ágil do
que o de concessões. A ideia pode funcionar. A dúvida é se o melhor caminho é,
de fato, por meio de uma Medida Provisória, como anunciado esta semana, ou
concentrando esforços para que o Projeto de Lei do Senado que trata da matéria (PLS
261/2018) ganhe prioridade na pauta.
Em tese, um Projeto de Lei amplia o
debate, permitindo o aprimoramento do novo marco. Até porque, no caso, o PLS
261 já foi assimilado pelos parlamentares. A premissa vale para todos os
modais, bem como para o setor de infraestrutura. Em meio a essa discussão,
entre projeto de lei ou MP, nunca é demais lembrar que, muitas vezes, uma
providência pontual tem mais efeito para os investimentos no curto prazo do que
a elaboração, trâmite e aprovação de uma complexa legislação.
E esse é justamente o caso do
Reporto, o regime especial de tributação para a importação de equipamentos para
ferroviais e portos, que aguarda mobilização de Executivo e parlamentares para
a sua prorrogação, antes de qualquer novo marco. Esse, sim, pela urgência e por
já ser matéria conhecida, poderia vir por meio de MP específica. Afinal, sem o
Reporto, os investimentos em portos e ferroviais ficam comprometidos, já em
2021. Fiquemos todos atentos à questão.
Por Nilson Mello*
Nenhum comentário:
Postar um comentário