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quarta-feira, 19 de junho de 2019

Artigo


Bertrand Russell e o "Vaza Jato"
 
            As coisas são bem mais simples do que tentam fazer parecer. De um lado você tem o Poder Público brasileiro - Justiça, Ministério Público, autônomo, e Executivo, por meio da Polícia Federal - combatendo e punindo a corrupção, como "nunca antes visto neste país". A eficácia é incontestável, e os robustos valores (bilhões e bilhões de dólares desviados dos cofres públicos) devolvidos pelos malfeitores, agentes públicos e privados, são a maior prova do êxito da Lava Jato.
            De outro lado temos um grupo denominado Intercept que, se utilizando de meios ilegais, espúrios, tenta desacreditar esta vitoriosa estrutura pública de combate à corrupção, sem, contudo, apresentar qualquer prova de que tenha havido manipulação de provas ou outro tipo de irregularidade. Ministério Público, que é, antes de tudo, o Fiscal da Lei, e juízes conversam - e devem conversar - sobre questões processuais e procedimentais.
            o Intercept vale-se de meios ilegais para propagar a sua campanha, mas esse não é o único aspecto a desqualificá-lo. Pela assimetria de suas "revelações", exclusivamente contra àqueles que estão claramente do "outro lado" no espectro político-ideológico - jamais simétrico e imparcial, sempre direcionado, seletivo nas acusações -, o "grupo" não pode gozar de credibilidade, e nem pode ter a pretensão de pautar uma imprensa que se quer livre, democrática.
            Àqueles que, por desejo ideológico, por automatismo dogmático, quase um fundamentalismo religioso, gostariam de ver as acusações do site do Sr. Greenwald lograr êxito, convém repetir os ensinamentos de Bertrand Russel, um dos maiores filósofos e pensadores do nosso tempo:
            "Quando estiver estudando um assunto, pergunte a si mesmo, somente, quais são os fatos e o que os fatos revelam. Nunca se deixe levar por aquilo que você gostaria de acreditar e por aquilo que acha que traria benefícios às crenças sociais que você compartilha".
            O fato é que a Lava Jato é um marco no combate à corrupção no país, uma mudança de paradigma na trajetória republicana. Foram legalmente processados (e continuam a ser) e punidos políticos de diferentes partidos, além de empresários, banqueiros, advogados, funcionários públicos. A crença (dogmática, religiosa), que turva o fato e compromete o exame isento da realidade, é de que a Lava Jato serviu a um "golpe" para afastar do Poder um partido e colocar na cadeia o seu principal líder, o "semi-Deus".
            Contudo, este líder era corrupto, e o seu partido arquitetou e colocou em marcha um gigantesco esquema de desvio de dinheiro público, oportunamente desbaratado pelo Ministério Público e punido pela Justiça. Este é o fato que o Intercept não conseguirá mudar, ainda que, criminosamente, se utilize de meios espúrios para propagar ideologia travestida de notícia.

Por Nilson Mello

segunda-feira, 5 de junho de 2017

História

Resumo da Trajetória Republicana
    Se examinarmos este Resumão abaixo, perceberemos que a trajetória Republicana sempre foi conturbada e que o grande desafio hoje é manter as regras. Na verdade, procuro ver o atual momento de forma positiva, como uma inflexão desta trajetória para um patamar de maior estabilidade institucional e de total intolerância à corrupção.
    Vale lembrar que estamos denunciando , processando e prendendo políticos como nunca antes foi feito, mas tudo obedecendo ao devido processo legal. Afastou-se uma presidente, por crime de responsabilidade (e que também deverá responder por corrupção) observando-se as regras constitucionais, num processo regido pela Corte Constitucional e com autorização do Legislativo.
    O seu substituto também deverá ser afastado e processado, dentro das regras constitucionais. O País está fazendo uma profunda depuração de seu sistema político sem "virada de mesas" ou "quarteladas", ou seja, por meio da Lei. Esta é a prova do fortalecimento das instituições. E a depuração deverá ter sequência na renovação da classe política a por meio do voto em 2018.
Estamos vivendo o mais longo período de normalidade institucional.

Segue o resumo:

6 CONSTITUIÇÕES FEDERAIS
1891
1934
1937
1946
1967
1988
9 MOEDAS
Réis: até 1941
Cruzeiro: 1942
Cruzeiro Novo: 1967
Cruzeiro: 1970
Cruzado: 1986
Cruzado Novo: 1989
Cruzeiro: 1990
Cruzeiro Real: 1993
Real: 1994
6 VEZES CONGRESSO FECHADO
1891
1930 ~ 34
1937 ~ 46
1966
1968 ~ 69
1977
6 GOLPES DE ESTADO
1889 ~ 2016
1930 ~ 34
1937 ~ 45
1945
1955
1964 ~ 1985
13 PRESIDENTES QUE NÃO CONCLUÍRAM O MANDATO
Deodoro: 1891
Afonso Penha: 1909
Rodrigues Alves: 1918
Washington Luís: 1930
Júlio Prestes: 1930
Vargas: 1945 e 1954
Carlos Luz: 1955
Jânio Quadros: 1961
João Goulart: 1964
Costa e Silva: 1969
Tancredo Neves: 1985
Collor: 1992
Dilma: 2016
31 PRESIDENTES NÃO ELEITOS DIRETAMENTE (também considerando posse de interinos)
Deodoro: 1889*
Floriano Peixoto: 1891*
Prudente: 1894*
Campos Sales: 1898*
Rodrigues Alves: 1902*
Afonso Penha: 1906*
Nilo Peçanha: 1909*
Fonseca: 1910*
Venceslau: 1914*
Rodrigues Alves: 1918*
Delfim Moreira: 1918*
Epitácio: 1919*
Arthur: 1922*
Washington Luis: 1926*
Júlio Prestes: 1930*
Vargas: 1930
José Linhares: 1945
Café Filho: 1954
Carlos Luz: 1955
Nereu Ramos: 1955
Ranieri Mazilli: 1961
João Goulart: 1961
Castelo Branco: 1964
Costa e Silva: 1967
Médici: 1969
Geisel: 1974
Figueiredo: 1979
Tancredo Neves: 1985
José Sarney: 1985
Itamar Franco: 1992
Michel Temer: 2016
*Presidentes do Período da República Velha marcado pelas fraudes eleitorais e o coronelismo.
31 REVOLTAS E GUERRILHAS
Golpe Republicano: 1889
Primeira Revolta de Boa Vista: 1892-1894
Revolta da Armada: 1892-1894
Revolução Federalista: 1893-1895
Revolta de Canudos: 1893-1897
República de Curani: 1895-1900
Revolução Acreana: 1898-1903
Revolta da Vacina: 1904
Segunda Revolta de Boa Vista: 1907-1909
Revolta da Chibata: 1910
Guerra do Contestado: 1912-1916
Sedição de Juazeiro: 1914
Greves Operárias: 1917-1919
Levante Sertanejo: 1919-1930
Revolta dos Dezoito do Forte: 1922
Revolução Libertadora: 1923
Coluna Prestes: 1923-1925
Revolta Paulista: 1924
Revolta de Princesa: 1930
Revolução de 1930: 1930
Revolução Constitucionalista: 1932
Revolta Mineira: 1935-1936
Intentona Comunista: 1935
Caldeirão de Santa Cruz do Deserto: 1937
Revolta das Barcas: 1959
Golpe Militar: 1964
Luta Armada: 1965-1972
Guerrilha de Três Passos: 1965
Guerrilha do Caparaó: 1967
Guerrilha do Araguaia: 1967-1974

Normalidade democrática: de 1988 aos nossos dias!


segunda-feira, 13 de abril de 2015

Ensaio

   Aonde queremos ir?


                   Getúlio vitorioso em 1930   
                
    A trajetória republicana brasileira é uma história que pode ser contada a partir da crônica de seus golpes (a começar pelo que lhe deu origem), levantes, deposições, renúncias e impeachments, sejam eles expressos ou brancos. É uma história conturbada, com alguns episódios violentos, apesar do folclore apontando o contrário.
    Nem precisamos retroceder tanto - como, por exemplo, à Revolução Federalista (1893), à Revolta da Armada (1893) ou às "guerras" de Canudos e do Contestado (1897 e 1912/16, respectivamente) - para firmamos esta percepção. Quase todos esses incidentes (ou acidentes) institucionais revelam falta de maturidade política.   
    O antagonismo político exacerbado, que ignora a regra democrática de respeito às diferenças e ao resultado das urnas, sobretudo, tem sido um ingrediente sempre presente na vida política brasileira.
    Tomemos como ponto de partida a década de 1920 e o movimento tenentista de orientação liberal - porém, reconheça-se, de caráter golpista - que seguiu produzindo consequências ao longo de todo o século XX, marcado por crises políticas e quebras da continuidade institucional.
    A partir dali, resumidamente, tem-se, com inspiração e métodos semelhantes, a Revolta de 22 ("18 do Forte"), a Revolução Paulista de 1924 e a Revolução de 1930, que marca o fim da Velha República, com suas cartas marcadas (a política "café-com-leite").
    Contra o arbítrio político, o domínio das elites financeiras e a fraude eleitoral o golpismo é legítimo e justificável? O tenentismo entendia que sim. Logo em seguida, em 1932, tem-se, em resposta, a Revolução Constitucionalista, liderada por São Paulo contra o governo de Getúlio.
    Entre os tenentes revoltosos da primeira metade do Século XX estavam, entre outros, Cordeiro de Farias, Eduardo Gomes, Siqueira Campos, João (Alberto Lins) de Barros, Juarez Távora, Miguel Costa, Luís Carlos Prestes. O movimento tinha o apoio - e a participação destacada - de civis como Getúlio Vargas e Oswaldo Aranha. Estavam entre eles também, vale lembrar, Geisel, Médici e Castelo Branco.    
    Com eles - ou, em grande parte, por causa deles -, à exceção de Prestes, àquela altura já aderente à causa comunista, Getúlio assumiu o poder em 193O. Serviu-se deles e virou-lhes as costas.
    A despeito de visões de mundo e de ideologias distintas - que no decorrer do tempo foram sobressaindo e elevando o grau de antagonismo entre oponentes - havia um desejo comum a unir todos esses nomes, de Prestes a Vargas, passando pelo udenista Eduardo Gomes e o próprio Ernesto Geisel (com sua concepção desenvolvimentista semelhante ao "capitalismo de Estado" ensaiado, veja só!, pelos governos Lula-Dilma).
    O ponto em comum, se é que se pode dizer assim, era a possibilidade de imprimir ao país um choque modernizante capaz de reformar não apenas as suas estruturas políticas, como também as sociais e econômicas. Em resumo, tratava-se de lançar um país eminente agrário e de práticas políticas arcaicas em outro patamar sócio-econômico.
    Sigamos a cronologia da instabilidade. Em 1935, com Vargas no poder, mas o país em situação política instável, quem tentou o golpe à sua maneira foi Prestes. (A "Intentona" ou o "Levante Comunista" que liderou acabou sendo um retumbante fracasso, com falhas do planejamento à execução que ajudaram a desfazer um mito).
    Dois anos mais tarde, quem dá o golpe é o próprio presidente da República, Vargas, instituindo a Ditadura do Estado Novo. Usa como justificativa para a exceção - se é que precisava de uma justificativa - a própria ameaça à estabilidade institucional.  Em 1938, por sinal, quem tenta um levante são os integralistas.
    A ditadura dura oito anos. Em 1945, com o fim da guerra contra o fascismo e os ventos liberalizantes soprando mais fortes no Brasil, Vargas é forçado a convocar eleições. Golpe contra o autoritarismo e a ditadura, ainda que pacífico, é legítimo? Foi o que ocorreu. Mas, redemocratizado, com eleições livres naquele ano, o país não se viu livre das escaramuças institucionais.
    O populismo demagógico e irresponsável, aninhado de um lado, e o conservadorismo obtuso e indiferente aos problemas sociais, entrincheirado do lado oposto, via de regra, dissimulados, respectivamente, em bandeiras da esquerda e da direita, seguiram minando as possibilidades de trajetória estável e de desenvolvimento econômico consistente nos anos seguintes.  
    Voltemos ao retrospecto. Houve novamente o que podemos chamar de intercorrências de constitucionalidade - com menor ou maior gravidade - em 1950, 1954, 1961, 1964 e 1992.
    Em 1950, o embate deu-se em torno da possibilidade ou não da candidatura Vargas (ex-ditador pode se candidatar, se eleger e tomar posse? Oposicionistas, Lacerda à frente, entendiam que não). Em 1954, uma crise política aguda (potencializada pelas oposições), com ingredientes econômicos e denúncias de corrupção, culminou com o suicídio do presidente e ex-ditador, seguido da dúvida quanto à possibilidade ou não de seu vice assumir o cargo. 
    Em 1961, com a renúncia de Jânio, mais um impasse: vice de partido e com programa de governo opostos ao do presidente que deixa o cargo pode assumir o poder? A regra constitucional dizia que sim, a cautela política entendeu que não, criando um parlamentarismo canhestro que durou pouco.
    A regra constitucional, prevendo a eleição de presidente e vice de partidos distintos era incoerente e inconsequente, mas era a regra. O golpe civil-militar de 1964 veio na esteira do ativismo político iniciado pelo movimento tenentista nos anos 1920. Estavam entre os seus líderes, lembre-se, Geisel, Médici, Castelo, tenentistas de outrora.
    Olhando em retrospectiva, 1964 foi  consequência e não causa. E foi civil-militar porque não teria tido êxito sem o apoio decisivo da sociedade - queira-se ou não. Assim como o Estado Novo, via-se como um "projeto modernizante" para o país, daí o termo "revolução" com o qual se auto-intitulou.
    Regimes de exceção não são eternos, embora nem sempre cheguem ao fim pela força. Restabelecida a democracia, após a Constituição de 1988 (precedida pela Campanha das Diretas-Já, de 1984, e pela eleição do oposicionista Tancredo Neves, via Colégio Eleitoral, em 1985), o voto livre, direto e universal levou à Presidência, em 1989, um presidente que acabaria afastado no bojo de um processo de impeachment. (Na verdade, renunciou antes do fim do precesso). 
    O "terceiro turno" das eleições, portanto, não é uma novidade no Brasil. Hoje, o PT acusa seus oponentes de lançar mão dele contra o governo Dilma, mas o partido foi o mentor do artifício.
    Afastar presidente, via processo político, é legítimo? No caso de Collor, parece não haver dúvidas que sim, embora ele jamais tenha sido condenado por corrupção na esfera judicial. Não custa lembrar que foi também a imaturidade política que alçou Collor à Presidência da República.
    O primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva foi fortemente abalado pelo episódio do Mensalão (o esquema montado pelo governo para cooptar parlamentares), em 2005/2006, sem que o seu afastamento tenha sido politicamente viabilizado. As provas eram tão presentes quanto no episódio de Collor, e é difícil dizer se a blindagem decorreu do apoio político dentro do Congresso, da alta popularidade ou de ambos.
    Em que condições então um impeachment é aconselhável? (e nem estamos falando aqui dos requisitos legais, apenas da conveniência político-institucional). Como saber quando a permanência de um presidente que perdeu a credibilidade gera mais instabilidade institucional do que o seu próprio afastamento?
    Porque a questão de fundo é saber se estamos contribuindo para o fortalecimento da democracia ou minando os seus fundamento. A nossa trajetória "republicana", como vimos, recomenda ponderação.
    Mais de 60% dos brasileiros hoje desaprovam o governo Dilma Rousseff. E mais de 63% apoiam um processo de impeachment contra a presidente, segundo pesquisa do Instituto Datafolha divulgada semana passada. As mais de 600 mil pessoas que foram às ruas neste domingo em 152 cidades brasileiras, de 25 estados mais o Distrito Federal, tinham, entre as suas principais bandeiras, o afastamento da presidente.
    Há menos de seis meses, Dilma Rousseff foi reeleita com mais de 54 milhões de votos (51,64% dos sufrágios válidos).  A julgar pelo mau governo que realizou no primeiro mandato - como demonstram, de forma incontestável, os indicadores econômicos e os escândalos de corrupção -, o resultado foi uma prova cabal de falta de maturidade política do eleitorado, que, desinformado, sucumbiu à propaganda.     O despertar veio tarde.  
    Mas é preciso saber aonde queremos ir. Se agirmos com maturidade política, só levaremos adiante a ideia de impeachment se surgirem provas claras do envolvimento da presidente nos escândalos de corrupção que marcaram o seu governo. Até o momento, essas provas não estão presentes.
    Se surgirem, devemos estar cientes de que, embora legal, com previsão constitucional, o processo é traumático e pode significar um novo retrocesso, sobretudo num momento em que o país tem nova condução na área econômica e começa a reconquistar a credibilidade perdida nos últimos quatros anos.
     Não se pode trocar governos a cada fracasso, por pior que sejam (como este foi). É preciso estabilidade de regras. Democracia é assim mesmo: dá trabalho e requer esforço reiterado, com depuração do eleito, via qualificação do eleitor.

Por Nilson Mello

Anote:

. A violência nas revoltas no Brasil - Na Revolta do Contestado, citada no início deste texto, houve sucessivas ocorrências de castração de prisioneiros, de ambos os lados, antes da execução, geralmente por degola ou fuzilamento.
. Os fundamentos do impeachment - Ex-ministro da Justiça, professor titular da Faculdade de Direito da USP e um dos mais respeitados constitucionalistas brasileiros, Miguel Reale Júnior lembra que o crime comum, ao contrário do crime de responsabilidade, pode derivar de ação ou omissão ocorridas no mandato anterior. Neste caso, constatado que Dilma Rousseff sabia dos malfeitos e nada fez para conter o "esquema corrupto" na Perobras, o procurador-geral da República poderia determinar uma investigação de eventual prevaricação da presidente, dando causa, em sequência, ao processo de impeachment. Até aqui, conjecturas.
Prognósticos - O ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, afirmou na semana passada que o modelo de desenvolvimento usado pelo governo no primeiro mandato, centrado no estímulo ao consumo, se esgotou. E que agora será preciso uma agenda "pós-ajuste fiscal", que é indispensável. Clarividência.