sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Artigo



Os acusados que dão pena


 A Queda da Bastilha, em 1789: não temos um Estado totalitário

    O mais sensato comentário sobre os acusados pelo homicídio do cinegrafista Santiago Andrade veio justamente de quem, pelo drama pessoal, estaria autorizada a assumir um discurso veemente, intolerante e até mesmo revanchista.
Viúva da vítima, Arlita Andrade disse, com serenidade, ter pena do auxiliar de limpeza Caio Silva de Souza e de seu cúmplice, o tatuador Fabio Raposo, colocando em evidência um aspecto desse crime estúpido que só agora começa a ganhar a devida relevância.
Os dois rapazes são coautores de um assassinato (é o que os indícios e suas próprias declarações mostram sem deixar muitas dúvidas) ao mesmo tempo em que vítimas de um processo de manipulação que, a exemplo do homicídio cometido, requer total reprovação da sociedade e exemplar punição da Justiça.
Os protestos que desde junho do ano passado tomaram autêntica e espontaneamente as ruas das cidades brasileiras foram gradualmente degenerando para uma escalada de violência que, à luz do bom senso, só pode ser atribuída a uma ação criminosa ardilosamente coordenada.
Aliás, tanto quanto a morte de Santiago Andrade, por si só dramática e simbólica, surpreende o fato de não ter havido outras tantas em meio ao quebra-quebra insuflado e irresponsável que tomou o lugar dos legítimos protestos.
Uma coisa é uma população cansada dos maus políticos e governantes, dos péssimos serviços públicos e dos excessos de tributos, entre outras mazelas, ir às ruas em paz manifestar o seu descontentamento. Outra bem diferente é transformar justas e pacíficas reivindicações populares numa campanha regular de ataque à autoridade pública (por mais desqualificada que esta seja) e de depredação dos patrimônios público e privado.
Manifestantes que andam encapuzados, buscando covardemente um anonimato que está na contramão da liberdade de expressão que o Estado, por mais imperfeito que seja, procura lhes garantir, perdem a legitimidade e estão, portanto, sujeitos a enérgica reprovação.
Nunca é demais lembrar que a violência revolucionária pode até ter sido legítima contra estados totalitários. Contra o absolutismo de L’Ancien Régime, em 1789, por exemplo, talvez fosse imprescindível. Mas, em pleno século XXI, e num país que mantém uma Constituição com plena garantia aos direitos individuais e demais princípios democráticos, a prática é intolerável. O Brasil não é a Síria ou o Egito, e não estamos e nem precisamos estar em revolução para aperfeiçoar nossas instituições.
   Quanto aos dois jovens, devem agora estar se dando conta que arruinaram as suas vidas e de suas famílias por aderir a uma baderna sem pé nem cabeça e, talvez também, por acreditar em líderes que sequer assumem claramente sua ideologia e seus objetivos. E isso é mesmo triste e de dar muita pena.

Em tempo:
    Os meios de comunicação devem tomar cuidado ao crucificar Caio Silva de Souza e Fábio Raposo. Por mais deplorável que tenha sido o seu ato, eles não tinham por alvo premeditado um profissional da imprensa. Ainda que a tese de dolo eventual, presente no inquérito policial, prevaleça na fase processual (embora bastante questionável, dada a conduta aleatória na ação), o intuito dos rapazes não era perpetrar um atentado contra os meios de comunicação. O exagero compromete a credibilidade da informação e joga para escanteio a crítica de boa qualidade, indispensável em episódios como este.

Por Nilson Mello

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Comentário


“Muito exato o seu artigo (de 08 de fevereiro) sobre a tentativa de Dias Toffolli de alijar o Ministério Público das próximas disputas eleitorais. Você deve se lembrar que há pouco mais de um ano houve manobra para excluir o Ministério Público da investigação de alguns crimes. Não me lembro dos detalhes, mas a manobra foi frustrada. O Ministério Público revela-se uma instituição que foge do controle dos políticos. O concurso público necessário para nele se ter acesso, os jovens advogados imbuídos de ideais que nele atuam e o poder que a Constituição lhes confere combinam para o tornar uma ferramenta de defesa pública muito perigosa para os políticos. Esse golpe que você bem expõe mostra como os políticos são insensíveis à fase pela qual o país passa. A preocupação fundamental é a de manter o status quo que lhes é muito favorável” (...) - Mario Santos, diplomata.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Anote

Inflação - A desacelaração da inflação na virada de 2013 para 2014 é a boa notícia deste início de ano. O aumento do índice oficial (IPCA), medido pelo IBGE, passou de 0,92% em dezembro para 0,55 em janeiro. O ritmo mais lento de aumento de preços já pode ser resultado de uma política monetária mais restritiva. O ciclo de alta da taxa de juros teve início em abril do ano passado. Hoje a taxa Selic está em 10,5% ao ano. O ideal seria não ter juros tão altos, mas para tanto seria preciso que o governo adotasse uma política fiscal mais responsável, com redução significativa dos gastos e despesas, e, paralelamente, melhor critério nos investimentos.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Artigo

O Ministério Público nas eleições




 Ministro Marco Aurélio Mello anuncia revisão.


    O papel peculiar que a Constituição atribui à Justiça Eleitoral, como único órgão com competência para exercer cumulativamente funções administrativas, legislativas e jurisdicionais não lhe garante, obviamente, carta branca para fazer o que bem entender - ainda que na sua esfera de ação, que é o processo eleitoral.
    Com essa certeza e distanciamento é que deve ser vista a resolução de dezembro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – na ocasião sob o comando interino do ministro José Dias Toffolli - que limitou as atribuições do Ministério Público nas eleições, condicionando a abertura de inquérito para investigar possíveis crimes à autorização da Justiça.
    Se a Constituição também garante ao Ministério Público competência para requisitar a abertura de inquérito policial e iniciar “diligências investigatórias”, sempre que houver indícios de crime, inclusive (e por que não?) de natureza eleitoral, o desarranjo no texto da resolução produzida pelo TSE só pode ser furto da sofreguidão que por vezes acomete o serviço público às vésperas de seu recesso de fim de ano.
    Afinal, não é razoável deduzir que a Justiça Eleitoral, a quem cabe zelar pela lisura do processo, tomaria uma medida que é não apenas contrária à sua missão, mas inconstitucional. A rigor, reduzir a ação do Ministério Público equivale a estimular, por via indireta, as infrações eleitorais e, por extensão, a impunidade dos infratores. A quem interessa isso? Certamente não ao TSE.
Vale lembrar que, em resolução anterior, de 2010, sobre a mesma questão, o texto dizia que, além da Justiça, a investigação também poderia ser aberta pelo Ministério Público Eleitoral – trecho suprimido do texto de dezembro. Menos mal porque a resolução será revista ainda no decorrer de fevereiro, como já anunciou o presidente do TSE, ministro Marco Aurélio Mello.
Mas o episódio traz à tona questão talvez mais relevante. O fato de a Justiça Eleitoral ter competência para regulamentar e disciplinar o processo eleitoral, não significa que deva rotineiramente estabelecer novas regras ou alterar as que já foram assimiladas. Pois o ativismo exacerbado acaba produzindo “jabuticabas” como as de dezembro.
Por Nilson Mello

Anote:
    A propósito, informa o jornal O Estado de S. Paulo, em reportagem de Wilson Tosta, publicada em 03 de fevereiro, que a pouco mais de nove meses das eleições, os três principais pré-candidatos ao governo do Estado do Rio já acumulam multas por propaganda eleitoral de cerca de R$ 900 mil. No total, foram onze infrações por divulgação ilegal de candidatura.
 
Anote II:
    A médica cubana Ramona Rodríguez abandonou o Programa Mais Médicos e pediu refúgio no Brasil porque percebeu que vinha sendo garfada em sua remuneração devido a um conluio entre os governos brasileiro e cubano. Com isso, o Ministério Público do Trabalho deverá obrigar o Ministério da Saúde a pagar os salários dos cubanos integralmente no Brasil, ao contrário do que vem ocorrendo. A providência, se concretizada, dará ao menos dignidade profissional a pessoas vítimas de uma farsa.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Anote:

O país cresceu pouco em 2013, o setor industrial se estagnou, as empresas lucraram menos, mas ainda assim a arrecadação federal avançou 12,5%, enquanto as despesas do governo aumentaram 13,6%. No Brasil, o setor público vive às custas da sociedade. Até quando?

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Em tempo:
 
Se o resultado fiscal do governo Central já havia sido decepcionante, conforme o artigo desta sexta-feira 31 (abaixo), o desempenho consolidado do setor público (esfera federal, estados e municípios) em 2013 foi ainda pior. Definido anteriormente no Orçamento como 3,1% do PIB, e depois reduzido para 2,3%, o superávit global do setor público acabou ficando em 1,9% (R$ 91,3 bilhões), o pior desempenho desde 2002. Um golpe a mais na credibilidade, impondo dificuldades ainda maiores na busca da estabilidade. Em outras palavras isso significa que o Banco Central terá que prolongar a política monetária restritiva, sem a certeza de êxito no combate à inflação. É como enxugar gelo. O resultado consolidado foi divulgado nesta sexta-feira pelo Banco Central.