sexta-feira, 16 de maio de 2014

Artigo



           A nova matriz macroeconômica 



    “O amor é uma verdade efêmera”, sentenciou Gabriel Garcia Marquez. Tem peso absoluto, incontestável e preponderante sobre outros valores – se é que ainda cabe interpretação diante da já pujante síntese – só que com prazo de validade improrrogável e irrecorrível. É “eterno enquanto dura”, exaltou o poeta brasileiro, com diagnóstico idêntico ao Nobel colombiano, recentemente falecido.
    Na economia, nem todas as verdades são perenes, mas boa parte dos fundamentos é imutável. O hibridismo é fruto da “interseção” da vontade humana com os pressupostos da ciência exata. Se uma equação matemática pode ser universal e insuperável, as manifestações humanas são imprevisíveis e irremediavelmente condicionadas ao tempo e às circunstâncias.
Na condução da política econômica, fatores imponderáveis, relacionados à ação ou omissão do homem, podem e devem ser considerados no seu contexto, sem que, contudo, se sobreponham a verdades matemáticas. Essas não são passíveis de mudança via vontade política.
Não se pode, por exemplo, decretar o fim da lei da oferta e da demanda, por considera-la prejudicial à sociedade, assim como seria inócuo combater a lei da gravidade. Aqui as razões políticas, ideológicas ou religiosas pouco importam – ainda que sejam elevadas, o que nem sempre ocorre.
Pode-se e deve-se reduzir a pobreza e melhorar o acesso dos mais pobres aos bens de consumo, e é o que as pessoas de boa-fé esperam que o governo faça (todos os governos!). O problema é quando, para levar adiante esse objetivo ou qualquer outro, tenta-se recriar uma “ciência econômica”. Verdades matemáticas, ao contrário dos sentimentos humanos - tão bem captados por Vinícius e Garcia Marquez - não são volúveis.
    Processos criativos na esfera econômica têm trajetória errática, evidenciada pela rotina de tentativas e erros, e invariavelmente conduzem um país a desequilíbrio fiscal, descontrole inflacionário, redução do crescimento e perpetuação do atraso e da pobreza que se pretendia combater.
    Tudo considerado é preciso dizer que o atual governo foi ao extremo da criatividade com a sua “nova matriz macroeconômica”, sob a batuta do ministro Mantega.

  Por Nilson Mello

Anote
Os números não mentem, mas é possível mentir com eles, ou dizer apenas parte da verdade. Foi o que fez o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, ao afirmar (jornais desta sexta-feira dia 16) que a inflação no Brasil está há 15 anos sob controle. O IPCA tem se mantido persistentemente acima do centro da meta de inflação no governo Dilma Rousseff. Nos últimos 12 meses registra 6,28% e caminha célere para superar o teto da meta (de 6,50%). Tombini não mentiu, mas disse apenas parte da verdade.

             
Em tempo:
    Quando Garcia Marquez diz que o amor é uma verdade efêmera, não devemos nos frustrar ou desesperar: com sorte, sobreviverá à nossa existência. O que, na prática, equivale à própria eternidade.

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