Ainda
sobre os portos - Um dos comentários de ontem
deste Blog era sobre o Programa de Investimento em Logística do Governo,
anunciado na semana passada com previsão de construir ou modernizar 10 mil km de
ferrovias e 7,5 mil de rodovias nas próximas duas décadas. As obras, no valor
total de R$ 133 bilhões, serão feitas via financiamento do BNDES e em Parcerias
Público-Privada (as PPPs).
Como mencionado, os portos
deverão estar incluídos na segunda etapa do PIL, a ser anunciada nos próximos
dias. Há grande interesse de investidores privados em construir e operar
empreendimentos portuários no Brasil, justamente devido à forte demanda por
serviços dessa natureza.
Os atuais terminais
brasileiros, tanto públicos quanto privativos, estão saturados. Alguns deles,
como os de Santos, aproximam-se do colapso.
Mas os novos empreendimentos
não se concretizaram nos últimos anos (ao menos não na medida do que era
necessário), a despeito do interesse privado, por conta de um Decreto de 2008
contendo exigências incabíveis. Os interessados simplesmente se retraíram.
Reproduzo abaixo comentário
crítico sobre este marco regulatório, elaborado pelo Centro Nacional de
Navegação (Centronave), entidade que representa as principais empresas de
navegação do mundo em operação no Brasil.
“Criado com o suposto
intuito de incentivar investimentos portuários, a partir da regulamentação da
Lei 8.630/93 - que, com efeito, trouxe modernização aos portos -, o Decreto
6.620, de outubro de 2008 tem, na verdade, cerceado o desenvolvimento do setor.
O principal óbice diz respeito à imposição de licitação pública para qualquer
projeto privado que tenha por objeto a movimentação de cargas.
A obrigatoriedade de
licitação é estendida a áreas particulares, o que significa que o Estado está
licitando patrimônio privado, que não lhe pertence, numa curiosa inovação legal
que, certamente, potencializará intrincados conflitos judiciais – algo que só
contribui para aumentar o chamado custo Brasil.
O aspecto jurídico é,
contudo, um problema secundário - apesar de também gerar gargalos para a
atividade econômica. A questão crucial, de interesse urgente, é que, ao
estabelecer esta imposição, o Decreto afasta investidores interessados em
apostar na força do comércio brasileiro e no próprio desenvolvimento do país.
Afinal, qual o investidor
apostaria num negócio cuja operação estaria sujeita a ser repassada a terceiros,
por força de uma licitação? E o risco existe mesmo que o investidor tenha o
domínio legal da área destinada ao terminal. É isso que prevê Plano Geral de
Outorgas, respaldado no Decreto. A expropriação de áreas particulares será feita
em prol do
Plano Estratégico Portuário.
Na prática, o Plano
funcionará como uma camisa-de-força, impedindo que a iniciativa privada faça os
necessários investimentos em infraestrutura portuária.
Os terminais públicos arrendados, cuja capacidade encontra-se
esgotada, permanecerão protegidos por uma reserva de mercado branca, uma vez que
o Decreto não garante a aberta concorrência.
As licitações onerosas de
áreas privadas, além de cercear a liberdade de investimentos, encarecerão os
novos empreendimentos, contribuindo, mais uma vez para pressionar os custos da
cadeia produtiva. Vale enfatizar que não é o empreendedor que arca com os custos
adicionais, mas sim o exportador nacional e, em última instância, a sociedade
como um todo.
Outro ponto crítico do
Decreto é a imposição de que todo empreendimento portuário seja capaz de
movimentar carga própria de forma sustentável, ou seja, a ponto de garantir por
si só a viabilidade econômica do projeto.
Ora, empreendimento
portuário não tem carga própria, uma vez que a sua atividade-fim não é a
comercialização de produtos, mais sim, justamente, a prestação de serviços de
movimentação de cargas para aqueles que querem exportar e importar. A restrição,
certamente, só contribui para inibir ainda mais os
investimentos.
Não bastasse, o decreto
trouxe ainda outros pontos nebulosos. Na questão da mão-de-obra, estende a todos
os Portos Organizados - incluindo os terminais privativos licitados - a
mão-de-obra avulsa, um modelo anacrônico e pouco eficiente de relação de
trabalho.
No que toca os terminais
públicos hoje arrendados, estabelece que os prazos de concessão ficam sujeitos à
vontade do Poder Público, contribuindo para gerar insegurança jurídica e
aumentar a nefasta ingerência política no setor portuário. E, para completar,
cria uma concorrência assimétrica entre setor público e privado, ao determinar
que a Autoridade Portuária pode prestar serviços de armazenagem – mais um fator
para afugentar investidores.
Passados mais de 200 anos da
Abertura dos Portos, esperava-se que o Decreto de outubro de 2008 pudesse lançar
o comércio brasileiro e o desenvolvimento do país num patamar de Século XXI, com
ampla liberdade de iniciativa. Mas o seu espírito, sem exagero, nos coloca em
direção a um contexto anterior a 1808, de fechamento de portos. Na prática, sem
os investimentos necessários, é o que pode
acontecer.
“O Decreto extrapola a Lei
8.630/93, inovando o ordenamento jurídico e violando o princípio da Legalidade”
– Centronave – Julho de 2009.
O Decreto, como se vê, é um
exemplo claro do desserviço que o intervencionismo e ativismo estatal “prestam”
ao desenvolvimento econômico
Por Nilson Mello
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