Friedman e as areias do
deserto
Li artigos
recentes na imprensa responsabilizando a Escola de Chicago e, em especial, o
Prêmio Nobel de Economia Milton Friedman pela crise financeira global. O gancho
para a nova onda de questionamento em relação ao liberalismo foi a passagem do
que seria o centésimo aniversário de Friedman, se vivo
estivesse.
O
liberalismo é dessas vítimas prediletas da desonestidade intelectual que,
infelizmente, predomina na imprensa brasileira. Friedman foi um ferrenho
opositor do intervencionismo na economia, justamente por perceber a ineficiência
contaminante do Estado.
Cunhou
frases célebres, como: “Se dessem o Deserto do Saara para o Estado administrar,
em cinco anos faltaria areia”.
Quem
atribui ao livre mercado e, portanto, à Escola de Chicago, onde Friedman se
projetou, à débâcle da economia global desde 2008, esquece-se de que os fortes
impulsos monetários e estímulos ao crédito promovidos pelos governos
norte-americano e europeus durante mais de uma década nada tinham de
liberal.
Afinal,
desde quando um governo liberal, que acredita na eficácia do mercado,
estimularia a concessão de créditos imobiliários de altíssimo risco (ao arrepio
das próprias leis de mercado)?
Mas foi exatamente o que os
Estados Unidos fizeram, por meio das agências de caráter para-estatal Fredie Mac
e Fannie Mae. O resultado deste hiperativismo estatal disfarçado foi, como
sabemos, uma bolha imobiliária de proporções catastróficas que até hoje
compromete o desempenho da economia americana – e do mundo. O que a Escola de
Chicago tem a ver com isso? Absolutamente nada.
Da mesma forma, nada há de
liberal na conduta irresponsável de governos europeus, em especial Espanha,
Grécia e Portugal, em elevar vertiginosamente seus gastos orçamentários gerando
déficits fiscais insolúveis, que só poderiam terminar numa crise sem
precedentes. Qualquer governante de um desses países teria optado pelo controle
fiscal estrito se sob a orientação da Escola de
Chicago.
Na crise, o
sistema financeiro foi apenas o instrumento que os governos utilizaram para
perpetrar suas irresponsabilidades. É até razoável que se discutam providências
para maior controle do setor financeiro. Mas, o mais importante, é estabelecer
regras e mecanismos para controle dos governos irresponsáveis.
Por
Nilson Mello
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