A má vontade de autoridades e mesmo de setores da sociedade com as redes sociais não é condizente com o fortalecimento da democracia. Em recente sessão do TSE, o ministro Alexandre de Moraes, ao negar a um advogado a sustentação oral em proveito de seu representado, ironizou, em tom desdenhoso, as críticas que poderiam lhe ser feitas numa plataforma digital por tomar tal decisão.
A OAB e outras entidades representativas da
advocacia já se manifestaram em relação ao que pode ter sido um desrespeito às
prerrogativas do advogado ou mesmo uma afronta ao princípio da ampla defesa.
Tratemos aqui então de outro aspecto relevante do
episódio. Menosprezar críticas feitas pelas redes sociais no mundo de hoje
equivale a desqualificar o próprio debate transparente que uma sociedade aberta
exige. Seria como se um arconte tripudiasse da Ágora, o espaço democrático por
excelência na Grécia clássica.
Algum incauto há de dizer: “mas nas redes sociais
proliferam fake news e por isso devem
ser combatidas”.
Nas praças públicas de sociedades democráticas
sempre houve também quem dissesse inverdades ou cometesse abusos. Nem por isso,
em democracias, os espaços de livre exercício do pensamento foram banidos ou
atacados. Para usar um ditado popular, “notícia e boato nasceram juntos”.
As redes sociais são o espaço público do mundo
contemporâneo, e dessa forma devem ser vistas. Os próprios meios de comunicação
tradicionais estão sujeitos a cometer abusos no direito de informar, que é um
desdobramento da liberdade expressão (informar e ser informado). Nem por isso,
em democracias, permite-se combater a liberdade de imprensa, muito menos se
tolera que um magistrado – mais que isso, um integrante do órgão de cúpula do
Judiciário - zombe dos meios de comunicação, por insatisfeito com críticas que possam
afetá-lo. Em passado recente, autoridade pública que seguiu este caminho pagou seu
preço político.
Vale dizer que quem abusa do direito de opinião e
de expressão (cometendo calúnia, injúria e difamação, entre outros) já está
sujeito à responsabilização tanto civil quanto criminal. Não é preciso
demonizar ou censurar (como muitos querem, empregando o eufemismo “regulação
das mídias”) os meios de comunicação ou as redes sociais.
Em democracia, este tipo de atitude merece repúdio.
Quem não gosta de crítica não deve exercer cargo público. Marx dizia que “a
imprensa é o olhar onipresente do povo sobre seus governantes”. Em que pese a
liberdade de expressão jamais ter sido levada muito a sério em regimes de orientação
marxista, a frase é lapidar e oportuna. Entenda-se aqui o vocábulo “governante”
no sentido amplo, de autoridade pública.
Goste-se ou não, as redes sociais são as substitutas das mídias
tradicionais e exercem papel equivalente à Ágora da Antiguidade – a praça
pública da livre manifestação das ideias, onde cada qual responde por eventuais
abusos que vier a cometer, sem necessidade de controle ex ante. Desqualificá-las é inócuo, além de antidemocrático.
(por Nilson Mello)