O
dilema capitalista e a PEC Emergencial
Gerar empregos e rendas suficientes
para um contingente crescente de seres humanos sem esgotar os recursos naturais
que o meio ambiente nos oferece – e ao mesmo tempo não levar ao esgotamento o próprio
indivíduo – é o desafio que o modelo capitalista de produção se impõe neste
século, seja nas democracias ocidentais ou nas economias que adotam o chamado “capitalismo
de Estado”, como a China.
O retorno a um modelo de produção planificado,
estatizante, está fora de questão tendo em vista a sua ineficácia em prover
bem-estar e qualidade de vida, além de liberdade, como ficou demonstrado, na
prática, ao longo do Século XX. O colapso do Bloco Soviético se deveu às falhas
intrínsecas do modelo, não a uma opção ideológica.
Na verdade, não há “socialismo científico”,
como queiram seus formuladores, do contrário teria sido nesta direção que a
humanidade, dialética e irremediavelmente, caminharia – e evidentemente não foi
o que aconteceu. Tampouco teriam sido necessárias revoluções sangrentas para a
sua implantação. Se fosse científico e irremediável, não seria imposto pela
força.
No final, não foi o capitalismo que sucumbiu em
meio às suas próprias contradições – que realmente existem, estão aí e são gritantes
-, mas o socialismo. Porém, dentre os impasses do capitalismo está a necessidade de
crescimentos econômicos incessantes, em escala global, para prover empregos (e
alimentos) para uma massa de seres humanos cujo aumento é exponencial. A
dinâmica implica um silogismo dramático que passa pela exigência de níveis de
eficiência também cada vez maiores em relação a cada indivíduo, bem como pela
incessante exploração dos recursos naturais disponíveis. Até quando?
A atual população mundial, de 7,8 bilhões de
pessoas, corresponde a 7% de todos os seres humanos que já viveram, afirma o
historiador britânico Niall Farguson*, e a espécie surgiu na Terra há nada
menos que 350 mil anos. É muita gente para pouco emprego. Sobretudo se
considerarmos as mudanças introduzidas nos últimos 50 anos pela tecnologia no mercado
de trabalho, redutoras, em sua maior parte, do emprego em massa, porque
substitutivas do homem pela máquina.
A questão, longe de parecer teórica, tem
relação direta com o momento que o país e o Mundo enfrentam, agravado pela
crise econômica provocada pela pandemia do novo coronavírus. O Brasil tem 32
milhões de trabalhadores subutilizados, informou esta semana o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sem contar uma massa de 13
milhões de desempregados. Essa “mão de obra desperdiçada”, para usar uma
terminologia do próprio órgão, num primeiro momento, continuará precisando de
apoio do Estado, representado pelo “auxílio emergencial” ou por programas
congêneres. A reativação da economia também depende da mão do Estado. E eis aí
a mais evidente contradição do sistema.
Paralelamente, será necessária uma economia
mais dinâmica, capaz de gerar mais empregos e renda, o que significa levar
adiante reformas, como a Tributária, a fim de desonerar a produção; e, no longo
prazo, mas já a partir de agora, investimentos cada vez mais robustos em
educação, não apenas para qualificar esse gigantesco contingente de pessoas
para um mercado de trabalho mais exigente, como para promover o aumento da
conscientização quanto ao controle de natalidade e ao uso racional do ambiente.
O que vale para o Brasil vale para o Mundo.
Contudo, no nosso particular, temos medidas prioritárias a serem adotadas no
curtíssimo prazo. É o caso da PEC Emergencial, a ser votada esta semana no
Senado. Se o auxílio emergencial é imperativo, também é verdade que o benefício
não pode ser concedido sem contrapartidas que obriguem União, Estados e
municípios a conterem seus gastos, como medidas, por exemplo, que congelem os
salários do funcionalismo, ao menos enquanto perdurar a crise. Mas sua aprovação pressupõe um debate transparente que livre o projeto de "armadilhas" que são estranhas às reais necessidade da sociedade neste momento.
A dívida pública brasileira hoje, pressionada
pelos gastos emergenciais feitos no ano passado no enfrentamento da Covid-19,
alcança R$ 6,6 trilhões, o equivalente a praticamente 90% do PIB. Está bem
acima da média dos países emergentes, de 62% do PIB. Dívida elevada significa incertezas
quanto à capacidade de pagamento e, em razão disso, juros elevados, que acabam
retroalimentando o próprio déficit, além de representar um obstáculo adicional para
a retomada do crescimento econômico.
O quadro mostra também o quanto importante é uma
Reforma Administrativa que possa levar o setor público a gastar menos com o seu
custeio, a fim de poder investir mais em setores essenciais como a educação, da
qual depende o nosso futuro.
Por
Nilson Mello
“Civilização
– Ocidente X Oriente”, Ed. Crítica, 2016.
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