quarta-feira, 6 de julho de 2011

ARTIGO

Cinismo ou genuíno arrependimento e ingenuidade

Ministro Alfredo Nascimento

     O governador Sergio Cabral, cuja evolução patrimonial, embora possa ser lícita, exibe uma celeridade de fazer inveja ao ex-ministro Antonio Palocci - sobretudo se considerarmos que a profissão de jornalista e a função de parlamentar, respectivamente, escolhida e exercida por anos pelo governador, em condições normais, não fazem de ninguém um novo milionário - decidiu instituir um Código de Ética para o servidor público do Rio de Janeiro.
     A decisão foi tomada depois que Cabral reconheceu, timidamente, que manter ligações estreitas com empresários - em especial empreiteiros – não é conveniente. Sobretudo se os empreiteiros com quem mantém suas estreitas relações são recorrentes prestadores de serviços do governo que dirige.
     Sergio Cabral, que até pode ser considerado um governador razoável em relação a antecessores (ressalte-se a base comparativa sofrível), em particular se considerados os avanços obtidos na área de segurança, sentiu-se pungido a fazer a tímida mea culpa e a enquadrar todo o funcionalismo fluminense após a repercussão negativa de suas viagens em jatos executivos cedidos por empresários “amigos” do governo - ou “amigos pessoais”, com licença do pleonasmo.
     Não deixa de ser curioso que, depois de ter feito o que a Ética condena – sem necessidade de Código algum, mas apenas pelo bom senso – o governador seja tomado por um forte arrependimento. Mais curioso ainda é vê-lo dividir o foco e a culpa dos erros cometidos, ou seja, as estreitas e nada transparentes ligações com grandes fornecedores de seu governo, com todo o funcionalismo público. Pois ao lançar a idéia de um Código de Ética para enquadrar os servidores do Estado é exatamente o que faz.
     Seria extremamente injusto nomear a conduta de cínica, posto que todos, mesmo os piores réus (e nem é esse o seu caso, longe disso) merecem o benefício da dúvida. Creditemos, portanto, a medida ao genuíno arrependimento de Cabral. E ao seu ferrenho empenho em estabelecer uma administração pública transparente. Que tenha êxito! Afinal, nós, brasileiros, devemos ter fé. Mesmo, nós, brasileiros ateus.
     Genuína também foi a decisão da presidente Dilma Rousseff de determinar o afastamento de integrantes do segundo escalão do Ministério de Transportes, em função de evidentes indícios de superfaturamento em obras contratadas por órgãos vinculados à pasta. Genuína, porém, ingênua, para ficar no adjetivo mais benevolente, pois manteve no cargo o ministro Alfredo Nascimento (foto). O chefe não pode estar isento das faltas cometidas pelos auxiliares. Se é o chefe, é, em última análise, o responsável.
     Os auxiliares, no caso, teriam sido indicados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (logo ele, que tanto reclamava da herança maldita do antecessor), enquanto Alfredo é da cota pessoal da presidente. (É sempre válido lembrar que, no Presidencialismo de coalizão brasileiro, cada vez mais contrário aos verdadeiros interesses da sociedade, os cargos na máquina pública são loteados, ao arrepio da eficiência e da ética, de acordo com o quinhão de cada partido da base governista, com algumas escolhas de exclusividade do chefe do Executivo).
     A presidente Dilma Rousseff é uma figura pública digna. Nada tem de cínica. Aliás, o tom contundente, seco e direto, que fez sua fama na época da casa Civil, é sinal de franqueza e afasta qualquer suspeita de dissimulação.
Contudo, um presidente da República não tem o direito de ser ingênuo. Nem complacente. Pela mesma razão que um chefe não pode estar isento quando seus subordinados erram – e principalmente se erram tanto, com valores tão absurdos. Se não os coibiu e puniu, é igualmente culpado. Quando se trata de autoridade, a omissão é crime de responsabilidade.
Se a presidente não afastar o ministro, deixará de merecer o adjetivo benevolente para ser considerada conivente – e, portanto, responsável - com os descaminhos de um Ministério (dos Transportes) que há muito se tornou um foco de corrupção em meio a essa degradada, ineficiente e cada vez mais perdulária máquina pública federal.
Por Nilson Mello



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