Aonde
vamos?
A
disposição para o embate, traço característico do presidente da República, e a
sua reiterada aposta na polarização, são os fatores que em grande parte
explicam – sem, contudo, justificar – a escalada de tensões na qual o país
ingressou, processo que se agravou no último mês, quando todos os esforços
deveriam estar voltados para o combate à pandemia de Covid-19 e a mitigação de
seus efeitos sociais e econômicos.
Seria
aconselhável que o circulo mais próximo de assessores presidenciais
questionasse o chefe – se é que haverá coragem para tanto – sobre quais teriam
sido os resultados práticos da estratégia de confronto que caracteriza a sua
administração desde o primeiro dia de mandato. Por que arriscar-se sempre a andar
no fio da navalha? A pergunta é pertinente porque os desdobramentos negativos
do embate permanente estão claros para todos, mas ainda assim não parecem
arrefecer o ímpeto beligerante.
Os
desdobramentos se traduzem, por um lado, em uma governabilidade cada vez mais
frágil e, em função dela, na necessidade de se estabelecer aliança com setores
do Congresso reconhecidamente fisiológicos e corporativistas, o que coloca em
dúvida o efetivo cumprimento dos objetivos de uma agenda legitimamente sancionada
pelas urnas.
As
três dezenas de pedidos de impeachment protocolados na Câmara transformam tal articulação
(espúria?) em uma tábua de sobrevivência, realçando a vulnerabilidade do presidente
e, por decorrência, justificando as suspeitas, por parte da sociedade, de que as
promessas de campanha, entre elas o propalado combate à corrupção, poderão não ser cumpridas, ao menos não totalmente.
Por
outro lado, em menos de um ano e meio de mandato, o ânimo pelo confronto,
sobretudo no momento em que o país mais precisava de uma liderança conciliatória,
levou à deterioração de um capital político considerável, representado por mais
de 57 milhões de votos depositados nas urnas em 2018. O que sobrou desse
“patrimônio” foi um alto grau de rejeição[1] (apesar do avanço nas
camadas menos favorecidas, em função do auxílio emergencial), conforme
demonstram as pesquisas, e uma parcela de seguidores cada vez mais radicais, o
que, obviamente, não serve à democracia (além, é claro, dos referidos pedidos
de impeachment). Quem mais tem lucrado é a oposição irresponsável, aquela que
estava desde o início à procura de uma boa razão para expressar as suas
críticas.
Bolsonaro
teria, na pandemia, uma justificativa para o que não desse certo este ano, em
especial para o retrocesso econômico, inevitável[2] e já bastante acentuado. O
respaldo à ciência e às medidas adotadas pela área técnica do Ministério da
Saúde, aliado a um discurso de união em prol da recuperação do país, seria um
salvo-conduto honesto, e por isso o caminho indicado a seguir.
Mas
fez o inverso, acirrando o clima de confronto e levando à demissão três
ministros. Desses, vale lembrar, dois da Saúde, o setor crítico do momento, e o
terceiro, Sergio Moro, da Justiça (e até então um dos mais, senão o mais
emblemático de seus auxiliares), que agora o acusa, em inquérito em curso no
Supremo, de uma ingerência indevida na Polícia Federal.
Como
não é possível identificar ganhos imediatos para o governo com essa estratégia,
e muito menos para o país, é plausível indagar: onde se pretende chegar?
Por Nilson Mello
[1]
Entre essas pesquisas, a XP/IPEST aponta 50% de rejeição hoje, contra 36% em
março, e apenas 25% de aprovação.
[2] A
queda do PIB no primeiro trimestre foi de 1,5%, segundo o IBGE, com previsão de
retração de 6,5% em 2020.
A pergunta é onde vamos chegar nesta marcha?
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