Que socialismo é este?
Dinho Ouro Preto |
O socialismo utópico surgiu na virada do Século XVIII para o século XIX, no bojo de ideias e ideais que já haviam desencadeado a Revolução Francesa. Contemplava a possibilidade de se estabelecer uma sociedade justa e igualitária de forma pacífica e gradual.
Fourrier e Saint-Simon, seus principais teóricos e porta-vozes, reconheciam que o modelo capitalista de produção, centrado na propriedade privada dos meios de produção, concentrava riquezas. Era preciso que desse lugar a um novo sistema de desenvolvimento, do qual emergiria uma sociedade mais harmônica.
Da utopia à prática, foram sucedidos pelo socialismo científico, que teve Marx e Engels como seus formuladores. A partir daí, não bastava idealizar uma sociedade igualitária, e caminhar pacificamente para alcançá-la. Era preciso transformá-la por meio da força.
O materialismo histórico de Marx e Engels - identificador e ao mesmo tempo formulador da dialética de classes como agente transformador - prometeu um futuro promissor para a sociedade, fundado na igualdade, na justiça e no bem comum. Para alcançá-lo seria antes necessário implantar uma ditadura do proletariado, na qual todos os bens de produção estariam na mão do Estado.
Na etapa seguinte à ditadura, o socialismo eliminaria as classes e o próprio Estado, e os homens viveriam harmonicamente. A Revolução Russa tentou levar adiante o projeto. O problema é que a ditadura implantada em 1917 na Rússia - e depois exportada ao longo do século XX para outras partes do mundo - não tinha data para acabar. A prometida sociedade justa tornou-se cada vez mais uma utopia tão distante quanto a imaginada pelos utópicos socialistas originais – ou pela obra inspiradora de Thomas Morus, lá atrás, no século XVI.
Além de não ter prazo pré-estabelecido, esta ditadura foi se mostrando tão o mais totalitária que qualquer outro regime anterior, não apenas por ser uma ditadura formal, do ponto de vista normativo, mas porque desconsiderava e coibia qualquer aspiração do indivíduo em prol de um suposto bem-estar coletivo.
Essa ditadura do proletariado ainda apresentava um defeito adicional. Ao retirar das mãos dos particulares a propriedade dos bens de produção colocando-os nas mãos do Estado, planejador central, e ao substituir o conceito de mérito pessoal pela ideia genérica de justiça distributiva, ela eliminou o estímulo à economia e ao desenvolvimento.
Não foi, portanto, uma ideologia antagônica que deu cabo do socialismo científico, mas sim a ineficiência econômica que lhe foi inerente. A falência resultante de sua incapacidade de gerar riquezas e promover, de fato, o bem-estar material, como “utopicamente” prometido, mostrou, por sinal, que suas bases científicas não eram consistentes, embora tenham lhe garantido nome e fama. Na verdade, não era ciência, mas ideologia.
Aliás, se a dialética de classes fosse científica, não precisaria ser estimulada ou forçada pela revolução.
Isso tudo significa que o modelo capitalista é perfeito? Claro que não. Esgota o ambiente. Esgota o ser humano. Pior: produz um mundo ficcional, em que o consumo passa a ser um “valor” em si mesmo, suplantando os demais, e não um meio para se obter bem-estar material. Mas essa é digressão para outro momento.
No momento o que importa saber é onde estão os idealistas que usariam o Estado para transformar a sociedade? Os partidos de esquerda estão no poder – e certamente há gente de bem em suas fileiras. Mas o que continua a prevalecer são as práticas patrimonialistas – o uso do Estado em proveito de poucos. Parafraseando Dinho Ouro Preto, “Que socialismo é este?”
Por Nilson Mello
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