No gráfico, a cotação até o dia 12, de 1,715. Ontem, em 1,72
A “máscara” e as ironias do dólar
A piora do cenário externo - com a crise financeira se prolongando na Europa e os Estados Unidos se arrastando em dificuldades fiscais – aliada à repentina “troca de sinais” na condução da política monetária brasileira produziu uma depreciação cambial (alta do dólar) inédita.
Apenas nos últimos 15 dias a moeda americana teve alta de 8,5%, atingindo a marca de R$ 1,724. Em julho passado, a cotação estava em R$ 1,53. Os jornais desta quinta-feira (15/09) ressaltam que nunca houve uma alta tão prolongada do dólar desde o início do regime cambial de livre flutuação, em 1999.
Os exportadores brasileiros, que vinham se queixando da perda de competitividade gerada pelo real valorizado, devem estar comemorando a mudança de rumo. Mas, a despeito das vantagens pontuais, há motivos para preocupações.
O dólar em queda permite um aumento das exportações, ou melhoria das receitas geradas com o comércio exterior, mas, na prática, mascara todas as ineficiências da economia brasileira (vide o artificialismo argentino).
Em linhas gerais, essas ineficiências são: a forte tributação que incide sobre a produção; a precária infraestrutura (sobretudo nos setores portuário, aeroportuário e ferroviário), carentes de adequada integração intermodal; o excesso de burocracia, que gera custos adicionais e corrupção (por si só fator de ineficiência); a falta de mão de obra qualificada (leia-se ensino deficiente); e a insegurança jurídica.
Essa é a “máscara” produzida pela nova tendência do dólar, que vem acompanhada de algumas ironias. A primeira é que a cotação mais alta da divisa norte-americana vai aos poucos eliminando um dos instrumentos de controle da inflação, justamente no momento em que o Banco Central resolveu baixar os juros apesar das fortes pressões inflacionárias. Perde-se, portanto, duas armas contra os preços. Vale lembrar: produtos importados geram competitividade interna e por isso contribuem para o combate à inflação.
A outra ironia é representada pela própria “máscara”. Na medida em que a cadeia produtiva percebe um alívio com o ganho artificial de competitividade proporcionado pela queda do real em relação ao dólar, esquece-se dos problemas essenciais, que são o combate às verdadeiras ineficiências provocadas pelos fatores já mencionados - forte tributação, infraestrutura deficiente etc.
A propósito, é oportuno ressaltar que, na luta por competitividade, entidades ligadas ao setor produtivo, em particular a Fiesp, sempre preferiram adotar o discurso mais fácil – empunhado bandeira contra câmbio e juros - ao invés de encarar os verdadeiros problemas. Mas câmbio artificial - fixo ou administrado – no final das contas não garante competitividade, além de escamotear os problemas. Não gera eficiência, não atua contra a alta dos preços.
Por outro lado, política monetária mais branda de fato contribui para impulsionar a economia, desde que, é claro, haja a contrapartida de uma política fiscal mais responsável (gastos do governo menores e de melhor qualidade), abrindo espaço a um paulatino aumento da produtividade. Do contrário, o que se tem é inflação e mais ineficiência.
Há ainda uma terceira ironia, representada pelo fato de a valorização do dólar ocorrer justamente no momento em que os fundamentos da economia dos Estados Unidos mostram piora, sobretudo o aspecto fiscal, o que ocasionou, inclusive, o rebaixamento de sua dívida soberana. É que, apesar de tudo, num momento de crise e incertezas, os investidores estão se refugiando no ativo que consideram de menor risco (dólar).
No caso particular brasileiro essa migração é acentuada pela aposta em novas reduções da taxa básica de juros pelo Comitê de Política Monetária do BC (Copom). Reduções que começaram a ser feitas sem que haja condições para tanto, como revelam os indicadores da inflação.
Por Nilson Mello
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