quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Artigo

Atrás da toga, da farda, do mandato...



    O Poder Judiciário não está imune às mazelas que atingem o Executivo, o Judiciário e a Administração Pública de forma geral. Seria bom que estivesse, mas não está. Os Três Poderes são frutos do mesmo tecido social, integrados por indivíduos egressos do mesmo substrato cultural, forjados na mesma mentalidade.
A declaração da ministra do STJ e corregedora Nacional da Justiça, Eliana Calmon, de que “há bandidos escondidos atrás da toga”, não deveria surpreender tanto. E é mesmo possível que a polêmica tivesse sido menor não fosse a forte reação de alguns de seus pares, em especial o presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso. Mas melhor assim.
A polêmica enseja a oportunidade para dissecarmos o organismo político-administrativo, para vasculharmos o seu intestino em busca da causa da doença. A dissecação (ou confronto com a realidade) pode ser didática e salutar, ainda que dolorida ou desagradável.
“Os bandidos”, para usar a terminologia de Eliana Calmon, aboletaram-se nos legislativos municipais e estaduais, e também no Congresso. Tomaram assento nos altos cargos do Executivo, não raro como ministro, governador ou prefeito. Vestem fardas da Polícia Militar, com alta patente nos ombros.
O cenário de degradação moral nos é trazido pelo noticiário com freqüência cada vez maior. Aliás, nos é trazido pela imprensa para a qual - os que estão “aboletados ou atrás de togas” - pedem “controle social”.
Esta semana – e para ficar apenas nesta semana e em um único exemplo - foi preso um tenente-coronel da PM fluminense acusado de ser o mandante do assassinato de uma juíza que - em contraste com a rotina, ao que parece - punia o crime organizado e os policiais corruptos com exemplar rigor. Sete policiais, já presos, estão envolvidos no crime.
A mentalidade mencionada de início é a “bactéria” na origem do forte odor. Ela é expressa na cultura do jeitinho e da malandragem, que apaga a linha divisória entre certo e errado. Todo o resto é desdobramento.
Por isso quando alguém vem a público dizer que “tem bandido atrás da toga”, ou da farda, ou do mandato, como fez a corregedora Nacional de Justiça, é preciso dar voz ao alerta. O “intestino” putrefato precisa ser brandido, e o seu odor indigesto exalado. É a chance de mobilizar os indignados, de despertar os entorpecidos e, quem sabe?, gerar algum constrangimento, por menor que seja, aos que estão “atrás da toga” mas são bandidos. 
A ministra Eliana Calmon não fez uma generalização, mas uma constatação crítica contundente e responsável. Por outro lado, o pedido de retratação do ministro Cezar Peluso foi descabido, mas colocou em evidência o problema. Alinhou o ventilador no sentido certo.
A ação movida pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) pretendendo retirar do Conselho Nacional de Justiça a prerrogativa de investigar, por iniciativa própria, e punir magistrados envolvidos em desvios, foi o ponto de partido do embate. Uma ação de caráter nitidamente corporativista. Agora, porém, com o ventilador ligado e no eixo do odor, as chances de que a iniciativa não prospere talvez sejam maiores.
O organismo não está doente, já morreu. Lenço no nariz!

Por Nilson Mello

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