sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Artigo

Cientificismo: Rigor de mais ou de menos

A observação criteriosa dos fenômenos naturais e sociais e a crítica moderada são posturas mais do que necessárias à prática da Ciência e à vida acadêmica. É compreensível que cientistas e acadêmicos evitem conclusões apressadas – potencialmente equivocadas – comportando-se com ponderação e responsabilidade.
Mas não deixa de ser curioso – beirando o ridículo – quando, diante de fatos óbvios e corriqueiros, o zelo torna-se preciosismo tolo, cautela infundada. Nesse caso, o que seria uma postura elogiável, digna de acadêmicos maduros, transforma-se em inibição pueril, incompatível com quem, de fato, dedica-se à Ciência e ao estudo de problemas relevantes.
A digressão vem à baila por conta do cuidado exacerbado demonstrado por economistas e cientistas políticos instados a comentar o assombroso aumento da máquina pública nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva.
Para quem não acompanhou o assunto, um breve resumo: o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou estudo indicando que “nunca antes na história do país” [trecho entre aspas nosso] o funcionalismo público federal sofreu um inchaço tão forte quanto no período de 2003 a 2010, sob a batuta de Lula.
O número de servidores civis da ativa naquele período cresceu de aproximadamente 534 mil para 630 mil - acréscimo de cerca de 155 mil (variação de 17%). O número de contratações triplicou no período em questão em relação aos oito anos de governo FHC.  
Com base nos dados, a pergunta feita a alguns economistas e analistas políticos foi se o aumento de contratações teria tido impacto positivo ou negativo, ou seja, se teria representado melhora ou piora da administração pública, em termos de eficiência. Respostas esquivas, sob um manto “cientificista”,  capaz de envergonhar o mais empedernido dos positivistas, procuraram disfarçar o óbvio.
Ora, nenhuma eficiência pode ser identificada como resultado desse inchaço aleatório, que atendeu muito mais a interesses eleitoreiros ou fisiológicos (ou a ambos) do que a legítimas razões de Estado. E não é preciso tese formal para a constatação.
A prova está estampada na porta de cada posto de saúde, de cada hospital, onde as filas crescem quase à mesma proporção do montante que arrecadamos em impostos; ou nos pífios resultados de nosso sistema de ensino; ou ainda no sofrível desempenho de nossa segurança pública. A administração federal, pelo que se tem notícia, tampouco se tornou mais ágil nesses últimos anos. Ao contrário.
E por isso mesmo a corrupção é, sem dúvida, outra faceta desse inchaço. Irregularidades, como desvios de verbas, superfaturamentos, conluio em concorrências, multiplicam-se no bojo da ineficiência, não apenas como resultado da má-fé.
Na verdade, a expansão desordenada do funcionalismo público pode por si só ser atribuída à má-fé. Basta deixarmos o “cientificismo” (ou "cientismo") de lado e encaramos os fatos, sem excesso de “dedos”. Pois do contrário não conseguiremos mudá-los.
Por Nilson Mello

Nenhum comentário:

Postar um comentário