A autonomia da vontade
O incentivo
que impele o indivíduo a realizar algo é sempre algum desconforto, afirma
Ludwig von Mises, no portentoso Ação
Humana. No conciso, porém, impactante O
mal-estar na civilização, Sigmund Freud lembra que a liberdade individual
não é um bem cultural – na verdade, ela antecede qualquer civilização, e era
bem maior antes, só que sem valor, porque o homem não tinha condições de
defendê-la.
A essência da sociedade, portanto, é
a própria ação dos seus indivíduos, o movimento concorrente de cada um na construção
de um todo. Ninguém jamais pode perceber uma nação sem perceber os seus
integrantes – e os feitos desses.
A principal razão do colapso do
socialismo e a proeminência do capitalismo (mesmo em nações formalmente
comunistas, como a China), pode ser extraída dos ensinamentos desses que são
dois dos maiores pensadores do século XX. Ao limitar ao extremo os impulsos individuais,
o modelo inviabilizou a própria coletividade que pretendia preservar.
Além do fato de compartilharem a
mesma cultura, o Império Austríaco, com pequena diferença de anos, o que não deve
ser mera coincidência, Mises e Freud, cada qual dentro da sua área de
conhecimento – as quais extrapolaram para ser firmar como verdadeiros filósofos
– fortaleceram o ser humano em face da religião, das ideologias, da política e
do Estado.
Na mão de cada homem está o destino da
humanidade. O processo se dá de dentro para fora, e não no sentido inverso,
como pretendem muitas correntes ideológicas, em especial a marxista. Direta ou
indiretamente, sendo, na verdade, bem mais diretos do que indiretos, Mises e
Freud declaram que qualquer modelo pretensamente científico só terá validade se
reconhecer e considerar os anseios do homem, incluindo o de prosperar – e nisso
reside a vitalidade de suas obras.
“Inicialmente, devemos nos dar conta de que
todas as ações são realizadas por indivíduos”, martela Mises. O homem pertence,
na realidade, a várias coletividades e a tentativa de engessá-lo num modelo artificialmente
produzido por uma doutrina mais cedo ou mais tarde fracassará.
“Os
comunistas acreditam haver encontrado o caminho para a redenção do mal”,
escreve Freud em Mal-estar na civilização.
“Se a propriedade privada for abolida, todos os bens forem tornados comuns,
desaparecerão a malevolência e a inimizade... Posso ver que esse pressuposto
psicológico é uma ilusão insustentável. Ela (a agressividade) não foi criada
pela propriedade, reinou quase sem limites no tempo pré-histórico”.
A civilização
é, sem dúvida, o caminho para o aprimoramento – e ambos os pensadores também
concordam neste ponto. Ensinam as teses contratualistas,
na Ciência Política e na Teoria do Estado, que a sociedade foi o pacto pelo
qual os homens aceitaram ceder parte (e apenas parte) de sua liberdade em troca
de mais segurança. Mas que fique bem claro: a força do coletivo será quanto
maior quanto maior for a preservação de espaços vitais para a autonomia da
vontade, inclusive na esfera econômica.
Por Nilson Mello
Perfeito!
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