O Rubicão é o limite
Presidente da República não deve convocar ou
mesmo estimular manifestação popular contra um poder constituído. Configura
ofensa à Constituição. O Congresso, eleito pelo povo, é soberano em suas
decisões. Tem autonomia e deve ser respeitado pelo Executivo. Ao eleitor, nas
urnas, caberá o julgamento de seu desempenho e de seus integrantes (senadores e
deputados), se de acordo ou não com os verdadeiros interesses da sociedade.
Mas não é dado ao chefe do Executivo ou a seus
auxiliares mais próximos o direito de apoiar uma manifestação contra o
Legislativo, tampouco contra o Judiciário, representado pelo seu órgão de
cúpula - o Supremo Tribunal Federal (STF). No regime democrático, os três Poderes da
República funcionam como freios e contrapesos entre si. Devem atuar de forma
independente, porém, harmônica, o que pressupõe a permanente busca de diálogo,
em especial sobre temas controversos que mobilizam a opinião pública. O
Executivo não é o detentor da verdade absoluta.
Se a atitude de
confronto se confirmasse, o presidente poderia incorrer em crime de
responsabilidade, sujeitando-se a processo de impeachment. Os problemas do
Brasil devem ser resolvidos por meio da política - por meio do processo
político - e não contra a política. Dá muito trabalho, mas é a via mais segura.
Porque o caminho contra a política, que a muitos agrada, de incitação da
população contra um dos Poderes ou contra os seus integrantes, é o caminho do autoritarismo.
Ainda que com apoio popular (e sempre começa
assim), o caminho do autoritarismo é a pior alternativa, porque no presente
pode atender a nossos interesses pontuais, mas amanhã pode ir contra todos os
nossos interesses. Nunca é demais lembrar que democracia não é apenas a vontade
da maioria, mas a vontade da maioria com respeito aos direitos da minoria.
O “Rubicão”[i] é o limite, não
deve ser ultrapassado. Se Júlio César tinhas suas razões, o Senado estava no
seu direito. Dois mil anos depois, não se pode aceitar um confronto deletério
entre poderes, em que todos podem sair perdendo. O governo perderia, porque se
tornaria inviável. Mas perderia principalmente o país, com o clima de
instabilidade institucional e o comprometimento das importantes reformas em
curso, imprescindíveis para a reestruturação da máquina pública e a retomada do desenvolvimento. O nosso Rubicão hoje é a Constituição, que delimita de
forma clara o que os agentes públicos, em especial os chefes de Poderes, podem
ou não fazer e dizer.
Por Nilson
Mello
[i]
Na volta da campanha de conquista da Gália (hoje os território da França,
Bélgica e parte de Alemanha e Suíça), em 49 A/C, a qual deu início sem
autorização dos senadores, Júlio César atravessou com suas legiões o Rubicão, pequeno curso d’água ao Norte de
Roma, o que era proibido por Lei, em atitude de confronto ao Senado, que lhe
censurara, dando início assim a uma
guerra civil que se estenderia por alguns anos.
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