segunda-feira, 22 de julho de 2019

Artigo



Os patinetes e os juros bancários


    A taxa Selic* caiu mais de 54% de 2016 para cá, mas os juros para os correntistas nos bancos continuam na estratosfera. As instituições financeiras argumentam que não houve transferência dos benefícios da redução para o público devido à alta tributação a que o setor está submetido e aos “custos administrativos”, porém, seus lucros também têm crescido, conforme demonstram seus balanços.
    Onde está o gargalo?
    O gargalo está na concentração do setor: a relação de poucos fornecedores (meia dúzia de bancos, conforme já apontou o ministro Paulo Guedes) para um grande número de demandantes (correntistas) enseja um mercado imperfeito. Mercados imperfeitos, com predominância de oligopólios ou carteis, são, por definição, perversos (Equilíbrio de Nash) -e o prejuízo é sempre do consumidor, do público final.
    Nessas condições de desequilíbrio, quem faz o preço do serviço/produto (no caso dos bancos, o preço do dinheiro, ou seja, o juro) é o fornecedor, e não raro, de forma abusiva, como vemos, porque não há efetiva competição. E por que o setor financeiro é tão concentrado? 
    Uma das principais razões é porque foi excessivamente regulamentado ao longo dos tempos, sob a justificativa de que era preciso “proteger o correntista e o sistema”, o que resultou no desestímulo - ou mesmo no impedimento expresso, devido ao excesso de exigências - ao ingresso de outras instituições no mercado, na contramão do que se pretendia. Sempre que há excesso de regulamentação ou de regulação, quem perde é o consumidor e a sociedade, justamente o objeto da pretensa proteção estabelecida.
    Basta vermos o exemplo das novas regras - ou projetos de leis - que tentam neste momento disciplinar o uso de patinetes no Rio e em São Paulo. Como as novas regras parecem excessivas (ao menos, até aqui), não apenas inviabilizarão um negócio lucrativo, como já está acontecendo na capital paulista - e, para se desenvolver, um país precisa de empreendimentos que gerem lucro** e com ele empregos e renda - como tendem a frustrar a demanda do consumidor por um meio de transporte barato, simples e “limpo”.
    O ativismo estatal e o seu excesso de intervenção no mercado - seja qual for - é contrário ao interesse do cidadão e da sociedade. É oportuno lembrar que o intervencionismo econômico e o dirigismo estatal representam, em seus variados graus, uma linha de ação governamental adotada por partidos e grupos políticos que hoje seguem uma orientação de "esquerda", da social democracia ao socialismo propriamente dito, embora, no passado, aqui mesmo no Brasil, governos e regimes de direita foram fortemente intervencionistas***.
    A tendência das "esquerdas" ao ativismo estatal explica, no grau maior, a hecatombe venezuelana e o colapso do Bloco Soviético e, no grau menor (de intervenção e dirigismo), o “andar de lado” da economia brasileira, com taxas de crescimento medíocres nas últimas décadas e sem grandes avanços  na área social, a despeito do grande déficit governamental.
    Tudo considerado, não é exagero dizer que o Brasil precisa de um choque de capitalismo para gerar desenvolvimento social. Mas de um capitalismo legítimo, de mercado, não o de Estado.

Por Nilson Mello

*A Selic é a taxa básica de juros, definida pelo Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central. Em linhas gerais, quanto mais baixos são os juros, maior  é o estímulo ao consumo e à economia. Contudo, a redução dos juros depende de um ambiente de estabilidade monetária, sob o risco de descontrole inflacionário.  Se houver forte expansão fiscal (gastos governamentais) e/ou problemas de oferta de mercadorias e serviços, a redução dos juros pode propiciar o aumento da inflação (governo Dilma), fazendo com que a volta do controle da inflação exija, em momentos seguintes, um rigor ainda maior na política monetária, sem que haja garantia de sua eficácia no curto prazo.
** O lucro é a mola propulsora do desenvolvimento econômico, sem o qual não se gera desenvolvimento social. É uma saudável decorrência de um ambiente de maior liberdade econômica. Nos países em que prevalece a maior liberdade econômica (Europa Ocidental, incluindo países escandinavos, Canadá, Japão, Austrália, Nova Zelândia),  os indicadores de desenvolvimento econômico são mais elevados.
*** O governo Geisel, na década de 1970, durante o período militar, foi nitidamente intervencionista e dirigista, embora, evidentemente, não fosse de esquerda. Também durante o período militar prevaleceu o "Conselho Interministerial de Preços", para definir, na contramão das leis de mercado (oferta e demanda), preços de determinados serviços e produtos considerados essenciais para a população.

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