quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Em tempo

                                                                Marco Aurélio Garcia


Sem pé nem cabeça – Que interesse pode ter o Brasil em condenar ações internacionais que visam a combater o grupo terrorista que eufemisticamente se autoproclama Estado Islâmico, quando o mundo inteiro se une para repudiá-lo, é uma questão que desafia a razoabilidade.  A presidente Dilma Rousseff afirmou, no discurso de abertura da Assembleia Geral da ONU ontem, que intervenções militares como a recém-iniciada na Síria esta semana, sob a liderança dos Estados Unidos, só levam a mais “barbárie” – e defendeu o diálogo. O EI, antes denominado Isil ou Isis, a julgar pelos métodos que adota, pelo discurso que emprega e pelas ações emblemáticas – entre as quais as decapitações de reféns inocentes transmitidas via satélite e as sumárias execuções de pessoas pela simples razão de não compartilharem a sua crença, seja essa qual for – não dá sinais de querer resolver divergências na base do bate-papo. O horror não é o seu meio, mas a sua própria finalidade. O grau de demência religiosa e ideológica que inspira o grupo não tem precedente. Em todo caso, para que a fala da presidente não caia (mais uma vez) no ridículo e no vazio diplomático, talvez seja o caso de enviar o assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, o historiador Marco Aurélio Garcia, para um tète-à-tète com os líderes do EI, no Levante. Quem sabe se com esta iniciativa não teremos, finalmente, uma boa notícia vinda do Oriente Médio.

 
Choque de concorrência – No artigo desta quarta-feira 24 (O papel da imprensa, mais abaixo) foi dito que os meios de comunicação precisam de plena liberdade para exercer a sua função de “Quarto Poder”, como definiu Bobbio, e atuar como o “olhar onipresente dos cidadãos sobre os seus líderes e governantes”, como ressaltou Marx.
 
 
          Se a imprensa cometer abusos, no livre exercício desta função – que, vale lembrar, é primordial para a democracia – estará sujeita às penalidades previstas em Lei. O Judiciário decidirá, respeitando, claro, os princípios do contraditório e da ampla defesa.

O que não se pode é, em nome do falso intuito de se estabelecer uma cobertura jornalística perfeita, livre de erros (e, portanto, inatingível), submeter jornalistas e meios de comunicação a regras de conduta, cerceando o seu trabalho. Disciplinar a liberdade de expressão é eufemismo da palavra censura.

Repassado este ponto, é preciso abordar outro aspecto da questão. A plena liberdade para jornalistas e meios de comunicação atuar é indispensável, porém, não é o suficiente. Para que haja uma imprensa livre e democrática é necessário que exista também pluralidade de opiniões.

Neste sentido, não há como negar que falta, no Brasil, um choque regulatório que ponha fim à grande concentração de mercado que hoje prevalece no segmento de empresas jornalísticas. Um choque de mercado que amplie o número de veículos de informação independentes, diversificando e multiplicando opiniões e visões de mundo.

Um único grupo de comunicação não pode concentrar TV aberta em nível nacional, TV por assinatura, rede de emissoras de rádio AM e FM, três grandes jornais de circulação diária, além de revista semanal e uma série de outras publicações.

Por mais que reconheçamos que esta concentração decorreu da competência de seus artífices e dos profissionais que ajudaram a construir e consolidar o grupo jornalístico, ela não faz sentido do ponto de vista regulatório. E não é compatível com a democracia, na medida em que compromete a diversificação de opiniões. O segmento de comunicação no Brasil merece sofrer um choque regulatório que promova a ampla concorrência, a exemplo do que ocorre nos demais segmentos da economia. (NM)

 

 

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