A
Venezuela e o Iluminismo de Burke
No
momento em que assistimos às trapalhadas produzidas pela ambígua Constituição
venezuelana, impossível não dar razão a Edmund Burke. O filósofo irlandês, que
contribuiu com suas ideias para as grandes transformações iluministas sem
deixar de reprovar os excessos revolucionários, sobretudo os da França de 1789,
dizia que os costumes saxões funcionam melhor do que as leis positivadas.
Burke,
liberal para uns, conservador para outros, acreditava na geração espontânea das
normas, a partir das tradições sociais e culturais, e também como expressão
genuína da natureza. E temia o que na prática de fato ocorre: o artificialismo sobrepondo-se
aos verdadeiros anseios de uma comunidade, na medida em que a política, como
arte do possível, impõe um meio termo para
acomodar visões e projetos de “mundo” distintos.
Afirmava
que, embora o racionalismo e a “matemática” política, principalmente a
francesa, fossem capazes de idealizar constituições e declarações de direitos,
por vezes com padrões simples e até claros, esse caminho tornava-se inadequado
porque as “geometrias morais” e as constituições simétricas não são capazes de
corresponder ao caos da vida.
Dizia
mais: “A prudência política computa, equilibra e funciona a partir de
compromissos, cálculos e exceções; requer habilidades delicadas e sutis (não
cálculos geométricos), um discernimento aprimorado por meio de extensas
experiência e prática, não por meio de pensamento abstrato e estudo de tratados”.
Enquadrar
uma sociedade num projeto racional de Estado que contemple liberdades
individuais e coletivas, e que ainda promova o desenvolvimento material a
partir da eficiência econômica, é o desafio das democracias de massa, fenômeno
surgido no século XX que encontra a sua exacerbação neste início de terceiro
milênio.
A Venezuela
e a polêmica em torno da impossibilidade de posse de seu líder bufão reeleito
expõem a complexidade do problema. Que um estatuto costurado de forma a acomodar
correntes divergentes potencialize situações críticas de conflito é
circunstância inerente aos regimes democráticos. Mas a ambiguidade
constitucional venezuelana gerou uma excrescência jurídica.
Um vice não
eleito, mas escolhido pelo presidente, este sim, ungido pelo voto – e impedido
de assumir o cargo por questões de saúde - exercerá o poder, de início, em
mandato tampão. Se as circuntâncias exigerem a posse defintiva, o que tudo leva
a crer que ocorrerá, os embates acirrar-se-ão.
De qualquer
forma, o povo foi às ruas de Caracas apoiar a solução jurídica insólita. Não se
pode questionar a vontade popular, sobretudo se o próprio comando constitucional
é ambíguo. No caso da Venezuela, a única coisa que se pode fazer com segurança
é repetir a velha máxima: “cada povo tem o governante que merece”. O que também vale para nós, brasileiros.
Por Nilson Mello
Comentário
I
Nas
tragédias sazonais das chuvas de verão no Rio de Janeiro, temos a combinação de
má gestão com corrupção (desvios de recursos públicos) e um ingrediente
macabro: a falta de educação e civilidade da população, que lança lixo nas
encostas e nos cursos d’água, além de construir casas e barracos em área de
risco. No Brasil, como na Venezuela e no restante da América Latina, a educação,
ou a falta dela, está no origem de todos os males. A população fluminense é
algoz e vítima ao mesmo tempo. Sendo que é duplamente algoz: ao fazer o que não
deve e ao escolher os que não merecem a confiança. Reiteradamente.
Comentário
II
No julgamento
do mensalão no Supremo em dezembro, a ministra Rosa Weber arguiu, de forma, digamos, jovial, que só o
Congresso poderia cassar os mensaleiros condenados, porque o mandato pertence aos
eleitores. Mas os eleitores sabiam que seus escolhidos eram corruptos? Teriam
escolhido corruptos? Não caberia à Corte Constitucional agir, neste caso, em
nome do eleitor, reparando o equívoco? (NM)
Todos criticam a falta de educação do povo, mais principalmente do humilde que joga lixo em qualquer lugar nas favelas, nas regões da baixada etc. A questão é que os sucessivos governos liberais, inclusive os atuais, não fazem campanhas educativas pela televisão, em horário nobre. Dizem que ficaria caríssimo. Nada disso! Teria de ser de graça, por lei, e a Globo e outras deveriam ser voluntárias. Queremos evolução? Então temos de cobrar ações. A inércia tem sobrevivido às críticas inócuas.
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