Depois de cinco anos,
o Brasil reassumiu em julho a Presidência do Mercosul com alguns desafios a
superar. A troca de comando acontece ao mesmo tempo em que alguns indicadores
nos permitem vislumbrar uma luz no fim do túnel, sem tirar os pés do chão.
Entre as boas notícias, talvez a principal delas seja o fato de os nossos
portos terem movimentado 420 milhões de toneladas de cargas de janeiro a maio
deste ano, um volume 2,3% superior ao mesmo período do ano passado. Esta é, sem
dúvida, mais uma prova do dinamismo do setor portuário em meio a um período de
lenta recuperação da economia.
Como mais de 95% de
nosso comércio exterior já passam pelos terminais portuários, contar com portos
eficientes e dinâmicos é uma condição não apenas necessária como indispensável
para a retomada perene do crescimento. Ainda que estejamos cientes de que hoje
nem tudo flui como deveria no setor - e que serão necessários mais
investimentos para evitar gargalos no momento em que o país voltar a crescer de
verdade -, constatar que nossos terminais têm dado resposta às demandas nos
autoriza a ter mais confiança no futuro.
Os possíveis avanços
a serem realizados na agenda do Mercosul a partir de agora podem abrir espaço
para novos investimentos e, com isso, para uma percepção ainda mais positiva
quanto à recuperação da economia, propiciando um novo ciclo virtuoso para o
qual os terminais portuários, claro, serão estratégicos. Dentro da agenda do
bloco de integração, a prioridade deve ser os processos de negociação de novos
acordos tarifários com outros blocos e países, como o firmado no último dia 21
de julho com a Colômbia, reduzindo a zero as tarifas de produtos
comercializados com o "vizinho".
Atenção especial deve
ser dada também à conclusão do acordo com a União Europeia, em negociação há
alguns anos. Sob a liderança do Brasil - a sétima maior economia do mundo e com
papel preponderante na região - este acordo poderá finalmente ser finalizado,
abrindo novos mercados para os produtores e exportadores brasileiros.
A conta corrente
brasileira encerrou o primeiro semestre com superávit de US$ 715 milhões, o
primeiro resultado positivo para o período de janeiro a junho desde 2007,
obtido graças ao bom desempenho das exportações. O indicador em si é bem vindo,
mas não pode mascarar desafios: o país precisa ser mais competitivo. O que
significa eliminar ineficiências, as quais, infelizmente, ainda se multiplicam.
"Velhas"
notícias seguem nos assombrando. A solução dos problemas de dragagens nos
principais portos do país, por exemplo, passa a ser prioritária quando se fala
em crescimento. De nada adiante termos terminais modernos e eficientes, se o
custo para a carga ser movimentada permanece elevado por conta de gargalos
estruturais, como as limitações de navegação nos canais de acesso - algo que
foge à área de ação dos terminais.
Recentemente, o Porto
de Santos, maior do país e da América Latina, precisou ter seu calado
(profundidade máxima em que um navio pode navegar) reduzido de 13,7 metros para
12,3 metros, devido ao assoreamento por falta de obras de dragagens adequadas.
Problemas deste tipo, que ocorrem nos diferentes portos do país, pressionam o
"custo Brasil", minando a eficiência da cadeia produtiva.
Basta dizer que a
cada centímetro a menos de calado deixa-se de embarcar até oito contêineres num
navio. Assim, calcula-se que o prejuízo em Santos, com a recente redução do
calado, possa ser de até US$ 1,6 milhão por navio - e isso sem contar a
incerteza que o problema gera para exportadores, importadores, operadores
portuários e empresas de navegação.
O excesso de
burocracia, decorrente do emaranhado de regras e normas e do grande número de
órgãos de diferentes esferas com ingerência nos portos, sem a necessária
padronização e coordenação, é outra questão recorrente que pressiona custos e
compromete a eficiência, e por essa razão deve ser enfrentada.
Por fim, nossas
autoridades não podem fechar os olhas à segurança, pois a falta dela tem
igualmente forte impacto sobre os custos. Quando se tem notícia de que o roubo
de carga, perpetrado por "piratas fluviais" do século XXI (O Estado
de S. Paulo de 23 de Julho), alcança R$ 100 milhões por ano nos rios da
Amazônia, temos a certeza de que o problema merece urgente atenção.
No avanço geral dos portos
no primeiro semestre, conforme mencionado acima, os terminais privados
responderam pela maior parcela do volume de carga movimentada (65,3% do total).
São dados que confirmam o empenho do setor privado e explicam por que
investidores estrangeiros começam a recalibrar as suas apostas no Brasil. O
governo e as empresas chinesas, por exemplo, aumentaram em 13% os seus investimentos
aqui em 2016, o que representou US$ 8,3 bilhões a mais em aportes, a maior
parte dos recursos em infra estrutura.
Mas, para que a confiança se
propague interna e externamente, e novos investimentos se confirmem, o governo,
nas diferentes esferas, não deve se omitir de fazer a sua parte. Entre as suas
atribuições diretas, no que toca os portos, estão a redução da burocracia, a
simplificação de procedimentos e regras para investimentos, o aumento da
segurança e a melhoria da infraestrutura, no que lhe cabe, como é o caso das
obras de dragagens.
Por Nilson Mello
(Obs: Este artigo foi publicado originariamente no jornal Monitor Mercantil, em 18 de agosto de 2017)
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