terça-feira, 7 de junho de 2016

Artigo

A importância dos portos


(Obs: Este artigo foi publicado originalmente no jornal Monitor Mercantil e nos sites especializados Conexão Marítima e Fator Brasil)

    A despeito da crise que o Brasil enfrenta, é interessante verificar a forma dinâmica e vigorosa como o setor portuário se comporta. A constatação, amparada em estatísticas, não significa dizer que não haja problemas - alguns, diga-se, bastante críticos - neste segmento, mas simplesmente que os portos exercem uma importância para a economia e para o nosso país muito maior do que a que lhe é comumente atribuída.
    Recapitulemos alguns resultados recentes que apenas reforçam o que há muito se fala, mas nem sempre se cumpre à risca, ou seja, que, para o Brasil, torna-se imperativo que adotemos uma visão estratégica para a logística portuária, desenvolvendo ações e programas de longo prazo,  apartidários e que possam ter continuidade governo após governo. Pois os portos são uma questão de Estado.
    Para começar, é preciso dizer que o movimento de contêineres nos portos brasileiros em 2015, embora tenha caído por força da recessão, apresentou um desempenho muito melhor do que todas as previsões. De acordo com a Abratec, a entidade que representa os terminais de contêineres, a queda foi de 3,3%, quando as projeções eram de um recuo de até 30% - ou queda de 25% nas melhores hipóteses.
    Os resultados esperados para o primeiro trimestre deste ano, considerando todos os segmentos, e não apenas o de contêineres, também são estimulantes. A previsão é de crescimento da ordem de 3,64% na movimentação de cargas, de acordo com a Secretaria Especial de Portos (SEP), respaldada por números de entidades do setor.
    No primeiro bimestre, conforme balanços publicados na imprensa em meados de abril, os portos já registravam um avanço de 3,48% na movimentação de carga, num total de 146 milhões de toneladas importadas e exportadas em janeiro e fevereiro. Para se ter ideia da evolução em meio à crise, em 2015 o movimento nos dois primeiros meses do ano não chegou a 142 milhões de toneladas.
    O mercado exterior ajuda a explicar o desempenho. As exportações por via marítima já cresceram 10,17% - para pouco mais de 100 milhões de toneladas - até o final de fevereiro deste ano, contra 91,35 milhões no mesmo período do ano passado.
    Um dado importante na evolução do movimento dos portos em 2015, e que deve embasar diagnósticos, políticas e novas ações para o setor, é o fato de os TUPs (Terminais de Uso Privado) terem apresentado um desempenho superior aos portos públicos. Segundo números divulgados pela SEP, os TUPs respondem por 67% do total de cargas transportadas e armazenadas em terminais portuários.
    Por que terminais privados apresentam desempenho melhor do que os Portos Públicos é uma pergunta que todos os envolvidos no setor devem procurar responder de forma transparente, para que tenhamos diagnósticos corretos dos entraves que devemos remover visando a gerar mais desenvolvimento portuário.
    Neste sentido, é impossível não reconhecer que o modelo de contratação de mão de obra que ainda prevalece nos terminais públicos gera custos desnecessários, comprometendo a eficiência. A burocracia, que em menor grau também afeta os TUPs (haja vista que esses estão igualmente sujeitos à ingerência de uma série de órgãos públicos, sem a necessária padronização dos procedimentos de fiscalização), é outro problema a ser decisivamente enfrentado.
    Mas, retornemos ao desempenho. Outro dado que revela o vigor do setor é o fato de o Porto de Santos, com todos os seus terminais, responder hoje por nada menos que 30,8% de toda a balança comercial brasileira. Numa frase, podemos dizer que o PIB brasileiro se movimenta pelos nossos portos, e eis aí a razão para darmos atenção especial ao setor. A eliminação da burocracia e a mudança de modelos de mão de obra contraproducentes e anacrônicos, conforme mencionado acima, são alguns dos alvos a serem atacados.
    Porém, devemos ainda melhorar em muito as infraestruturas nas quais os portos estão inseridos, aperfeiçoando, em terra, as conexões intermodais (com rodovias e ferrovias) e, no mar, melhorando os canais de navegação, realizando novas obras de dragagens, tanto as emergenciais como as de manutenção. As defasagens das obras de dragagem seguem sendo um forte entrave à eficiência.
    O que não podemos mais tolerar são as filas de navios à espera de "janela" para atracação, devido ao excesso de burocracia e às deficiências estruturais. Tais gargalos, com efeito negativo se propagando por toda a cadeia econômica, minam a competitividade da economia brasileira. O PIB brasileiro, que logo voltará a crescer, não pode ficar engasgado nos nossos terminais.

*Por Nilson Mello

Em tempo:

O pessoal de Curitiba é estratégico e paciente, vai comendo pelas beiradas, etapa a etapa. Janot foi por atacado. Não teria sido mais eficaz começar por uma unanimidade (Cunha)? Para não comprometer todo o esforço....

sábado, 4 de junho de 2016

Artigo

Onde está a força da democracia


    Uma das discussões que tomaram conta das redes sociais em meio ao processo de impeachment é se valeu a pena substituir um governo fraco, acusado de desvios, por outro que pode igualmente se revelar inepto e corrupto. A questão ganhou força com o afastamento do Ministro Romero Jucá há alguns dias. E mais ainda nesta última segunda-feira (dia 30) com a queda de Fabiano Silveira, do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle, após divulgação de áudio em que ele aparenta delinear estratégias contra a Operação Lava Jato.
    Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que a rapidez com que se operou as saídas desses ministros, em menos de 24 horas, contrastando com as práticas do governo anterior, já foi algo salutar a se comemorar.
    Quanto à oportunidade ou não do processo de impeachment tendo em vista as incertezas quanto ao novo governo, a resposta é simples: não se deve manter um governo ruim, contra o qual há fortes indícios de crime de responsabilidade a serem comprovados no julgamento no Senado (afora outros, ainda não devidamente investigados e comprovados), pela simples hipótese de o substituto vir a ser igual.
    Embora sofra influência do ambiente político - razão pela qual é denominado um processo "político-jurídico" -, o impedimento de um presidente da República condiciona-se às regras previstas na Constituição e na Legislação infra-constitucional (mais especificamente, Lei 1.079, de 1950), não a um cenário conjuntural hipotético.
    Se o presidente substituto for pior do que o (a) anterior legalmente impedido, contra ele se comprovando crime de responsabilidade ou outras irregularidades, que seja igualmente afastado pelas vias legais. Nada mais coerente do ponto de vista político e jurídico. Porém, devemos considerar que são mínimas as chances de o governo provisório de Michel Temer se mostrar pior do que aquele de Dilma Rousseff. Seria um feito e tanto.
    Na esfera econômica, é forçoso reconhecer que tivemos um grande avanço com a nomeação de equipes capacitadas para a Fazenda, o Banco Central e importantes estatais. E isso aumenta as esperanças de que possamos sair mais rápido do que o previsto da crise à qual a má gestão nos conduziu.
    Contudo, se o governo interino tiver que ser afastado devido a desvios, que o seja. A força da democracia brasileira e de suas instituições está justamente aí onde as pessoas têm visto fraqueza. Estamos depurando governantes e quadros políticos pela via legal, graças ao trabalho independente da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário. O apoio da sociedade a todo este processo é inquestionável, como demonstram as manifestações que tomaram as ruas desde as jornadas de junho e julho de 2013 até março deste ano.
    Em meio à convulsão social e política provocada pela falência de um governo, não houve "quarteladas", cassação de mandatos parlamentares ao arrepio da Lei, fechamento do Congresso, presos políticos ou censura à imprensa. Não houve ruptura institucional. Mais importante: durante toda a crise política, as manifestações deste ano foram livres e pacíficas, salvo incidentes isolados.    
    Isso tudo nos dá a certeza de que, se os últimos anos foram difíceis - sobretudo pelo desmonte perpetrado na economia por um governo irresponsável na condução da questão fiscal -, a democracia brasileira sairá fortalecida de 2016. Que fique claro: vivemos uma crise política, não uma crise institucional.

*Por Nilson Mello


quinta-feira, 2 de junho de 2016

Artigo

O PIB e o ponto de inflexão


    Dois anos de recessão, oito trimestres seguidos sem crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Economia em retrocesso, com elevado índice de desemprego (quase 12% dos trabalhadores ativos) e baixo nível de investimentos.
    De acordo com dados divulgados nesta quarta-feira (01/06) pelo IBGE, a queda do PIB no primeiro trimestre do ano, em relação ao último trimestre de 2015, foi de 0,3%. Em relação ao mesmo período do ano passado, o recuo é de 5,4%. A queda acumulada da economia em 12 meses é de 4,7%.
    As medidas "anticíclicas" adotadas pelo governo Dilma Rousseff em mais de seis anos, em especial as desonerações seletivas a setores produtivos, não apenas foram insuficientes para estancar a crise como a retroalimentaram na medida em que aumentaram o déficit público e fomentaram a ineficiência.
    Entre as distorções do modelo, a chamada "nova matriz macroeconômica", está a inflação persistentemente alta, além do próprio desequilíbrio fiscal, que causa incertezas, inibe investidores e engessa as ações do Estado, comprometendo até programas sociais relevantes.
    Nada do previsto e prometido na política econômica da dupla Dilma Rousseff-Guido Mantega foi efetivamente entregue, e é preciso que isso fique bem claro para a sociedade.
    Cabe lembrar que o Brasil retrocedeu num momento em que mundo voltava a crescer, com desempenho especialmente vigoroso de países emergentes, exceção feita, é claro, àqueles que desenvolveram políticas heterodoxos e intervencionistas semelhantes à do PT, como a Venezuela. Num ranking de 31 economias, o Brasil está na rabeira em termos de crescimento do PIB.
    Alguns economistas - os otimistas entre os otimistas - conseguiram enxergar algo de positivo nos números divulgados pelo IBGE. Estaríamos chegando a um ponto de inflexão. É que o desempenho de -0,3% do PIB no trimestre passado foi o melhor resultado desde dezembro de 2014. Estamos comemorando uma degradação menor do que a esperada, que era em torno de -0,8%. A que ponto chegamos!
     A queda menor pode significar que uma retomada virá mais cedo do que o previsto. Mas, de qualquer forma, quando ocorrer, será cíclica. Porque a verdadeira recuperação da economia, capaz de levar o país ao crescimento sustentável de longo prazo, tem como pressuposto uma série de reformas estruturantes - a tributária envolvendo a trabalhista, a previdenciária, a administrativa, e mesmo a político-eleitoral -  que, dada a conjuntura, ainda estão longe de acontecer.
    Então, o que se tem para o momento é a forte possibilidade de retomada da confiança graças à credibilidade que a nova equipe econômica transmite. E isso já não é pouca coisa tendo em vista o desastre da "gestão" anterior.
    Tudo isso considerado, podemos dizer que o verdadeiro ponto de inflexão não está na economia nem na política, mas no Judiciário. É por via da Justiça, com o apoio da sociedade, que o país e sua democracia estão sendo depurados para poder viver dias melhores. Nunca antes na história tantos governantes, dirigentes políticos, banqueiros e empresários corruptos foram processados e punidos por seus desvios.

Por Nilson Mello