sexta-feira, 31 de julho de 2015

Anote:

Beatriz Catta Preta
Correr risco e enfrentar ameaças, na defesa de seu representado, é algo inerente à missão do advogado, principalmente de um ciminalista. Mais ainda de uma criminalista alegadamente experiente, com quase duas décadas de militância, Por exemplo: não se tem notícia de advogado que, durante o chamado regime militar, por medo, tenha renunciado à defesa de um preso político. Alguns nomes me vêm à lembrança, tais como Evandro Lins e Silva, Técio Lins e Silva, Sobral Pinto... Que advogado renuncia diante de uma ameaça velada, cujo autor não é identificado, e que teria sido proferida de forma genérica (insinuação?) durante a sessão de uma CPI?

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Artigo

O pior ainda está por vir



    Em recente palestra, durante seminário no Rio sobre a (pseudo) "Reforma Política" em trâmite no Congresso, o jurista Aurélio Wander Bastos lembrou, oportunamente, o conceito de Oclocracia, de Maquiavel.
    Não sendo propriamente uma forma de governo,  como as categorias aristotélicas, a Oclocracia (Oklos, de multidão, e Kratos, de poder) sobrevém quando as instituições perdem-se ao sabor do irracionalismo dos governantes ou quando - mais precisamente o nosso caso - os governantes adotam práticas degenerativas de administração, provocando a instabilidade do Estado.
    Ambição, patrimonialismo (pequenos grupos se apossando do que é público, em benefício próprio) e populismo, traços inerentes e marcantes da Tirania, da Oligarquia e da Demagogia, respectivamente, também são, portanto, ingredientes presentes na Oclocracia.
  O irracionalismo e as práticas degenerativas dos últimos anos lançaram o país no impasse econômico de hoje. O populismo demagógico tratou de turvar a realidade, embriagando os desinformados que compareceram às urnas.
   O governo girou 180o graus, mas a impostura intelectual persiste fora dele, em bastiões ideológicos: a forte recessão que o Brasil enfrenta - talvez a de mais difícil reversão de sua história - é falaciosamente atribuída ao ajuste  destinado a reverter o caos parido de uma política econômica irresponsável.
    Desafios conjunturais somam-se agora a obstáculos de ordem estrutural, cuja superação dependeria de condições presentes mais favoráveis, como capacidade de investimento. O tal ajuste, por sinal, pode nem mais acontecer, o que torna qualquer análise quanto às possibilidades de superação da crise - seja em curto, médio ou longo prazo - mero exercício de ficção.
    A meta de superávit primário, ponto central da reconquista da credibilidade, simplesmente deixou de existir.
    De 1,1% do PIB (algo como R$ 66 bilhões), conforme desenhada no início do ano pela equipe de Joaquim Levy, foi reduzida para menos de R$ 9 bilhões (ou 0,15% do PIB), diante da baixa arrecadação por força da recessão e da tímida contenção de gastos públicos obtida até aqui. Um recuo de quase 90% que nos leva a perguntar se, no embate do front fiscal, o ministro já não jogou a toalha ao ringue. E se, diante deste revés, há algo mais a fazer.
    O momento delicado exigiria união em prol do interesse geral, mas o que prevalece é a mais rasteira disputa entre poderes, sem que possa haver vencedores.
    Na impossibilidade de reduzir gastos, afrontado pelo Legislativo (devido à sua própria inabilidade e falta de liderança), isolado na luta do ajuste pretendido, restou ao governo se agarrar, contrariando o que fizera no passado, a uma política monetária restritiva. Tenta não perder de vista a promessa de retorno da inflação à meta (de 4,5%) ao término de 2016.
    Nesta sexta-feira (29), o Banco Central subiu a taxa básica de juros (Selic) em 0,50%, a sétima alta consecutiva, para 14,25% ao ano, o maior nível desde agosto de 2006. Juros mais altos aumentam os encargos da dívida, dificultando a retomada do próprio equilíbrio fiscal e do crescimento.
    A permissividade monetária do primeiro mandato, fruto do voluntarismo e do experimentalismo criminosos no campo econômico - e responsável pela persistente alta da inflação desde então - cobra agora o seu alto preço. O remédio ministrado em doses mais fortes, na tentativa desesperada de curar a doença, coloca o paciente em estado vegetativo.
    Tem sido repetido que "será preciso piorar para melhorar". Ao menos já sabemos que o pior ainda está por vir. Anote este nome: Oclocracia.

Por Nilson Mello

Em tempo:

    1. Com meta de superávit primário reduzida em cerca de 90%, equilíbrio fiscal distante, juros em elevação (aumentando os encargos da dívida) e governo sem qualquer credibilidade, por conta disso tudo, é de se estranhar a possibilidade de rebaixamento da nota de crédito do Brasil (e perda do grau de investimento)? Parlamentares ligados à base governista vieram a público protestar contra as agências de classificação de risco. Ingenuidade? Ignorância? Embuste?  
    2. Ainda que sistematizada, por conta de um projeto de poder - e, por isso, levada ao paroxismo - a corrupção não é nem de longe o maior problema que o país enfrenta. A inépcia administrativa, a incompetência técnica e a má gestão têm causado danos bem maiores.
    3. Artigo desta quinta-feira de José Roberto de Toledo em O Estado de S. Paulo informa que, pelo Índice de Confiança Social do Ibope, a presidente Dilma Rousseff e o Congresso empatam em 22 pontos, numa escala de 0 a 100. A confiança na presidente, caiu pela metade em um ano.
      
   



segunda-feira, 13 de julho de 2015

Artigo

O estelionato eleitoral, a Grécia e o Brasil

Hiperinflação alemã: carrinho com dinheiro para as compras do dia

    Após o Crash de 1929, que pôs fim aos Roaring Twenties e deu início à grande depressão da década seguinte, algo precisava ser feito para moralizar e regulamentar o mercado de ações. O democrata Franklin D. Roosevelt - que em 1933 substituíra o republicano Herbert Hoover na Presidência dos Estados Unidos - criou a SEC (Securities and Exchange Commission) para impedir que movimentos especulativos, pautados em práticas fraudulentas, voltassem a derrubar a economia americana - e, por tabela, a do mundo.
    Pragmático, Roosevelt colocou à frente da SEC ninguém menos que Joseph (Joe) Kennedy, justamente um dos maiores especuladores da Bolsa de Nova Iorque. Pai de John Kennedy, que viria a ser o 35o presidente norte-americano - Joe Kennedy fora dos poucos grandes investidores a não ir à bancarrota após a "Terça-Feira Negra" de 29 de outubro de 1929. Além de hábil na manipulação das ações, era também um talentoso comerciante de bebidas em plena vigência da Prohibition. A rigor, um traficante. Aliás, a Lei Seca, que perdurou de 1920 a 1933, consagrou a máxima segundo a qual a necessidade derruba a proibição.
    O relato dessas contradições no país que se orgulha de ter como um de seus valores fundamentais o respeito incondicional à Lei é o que há de mais saboroso na leitura de 1929 (A quebra da Bolsa de Nova Iorque: A história real dos que viveram um dos eventos mais impactantes do século), de Ivan Santa'Anna. Ora, não é apenas aqui que leis não pegam. Quando questionaram Roosevelt quanto à escolha de Kennedy - justo um especulador! - para chairman da SEC, a resposta foi óbvia. Somente quem conhecia a fundo as possibilidades de fraudes e as artimanhas envolvendo o mercado de ações poderia coibir futuras irregularidades. Deu certo.
    Para muitos historiadores, o Crash que provocou a depressão nos EUA criou as condições para a ascensão de Hitler numa Alemanha devastada pela crise econômica. Enfrentando uma recessão profunda, com taxa de desemprego de 25%, e soterrado por uma hiperinflação sem paralelo, por que o povo alemão não apostaria no discurso de um carismático Guia (Führer) que prometia prosperidade e empregos para todos? Mais uma vez seria o Estado mobilizando e dirigindo a economia para construir rodovias, ferrovias, fábricas... A exemplo do que ocorria nos EUA, a solução não viria pelo mercado. Mas excluiria a democracia.
    A "versão germânica" do New Deal, com seu fundamento racial e seu componente totalitário, arrastaria o Mundo para a Segunda Guerra em 1939, provocando a morte de mais de 60 milhões de pessoas em seis anos de trevas. Se o New Deal de Roosevelt teria ou não o mesmo êxito não fosse o esforço de guerra norte-americano contra o Nacional Socialismo é outra questão que segue intrigando estudiosos.
     A nós importa saber que, de lá para cá, o Mundo até conseguiu regular melhor seus mercados financeiros - não tão melhor a ponto de evitar outras bolhas, como a deste ano na República Popular da China (ironia das ironias!) ou a dos subprimes, em 2008, mas ainda assim consideravelmente melhor. Não se livrou, contudo, da ação irresponsável de líderes demagógicos e populistas. É o que lembra Mario Vargas Llosa, em artigo no Estado de S. Paulo deste domingo (12), fazendo referência à crise grega e mencionando, além de Perón, os contemporâneos Evo Morales, Rafael Correa e Daniel Ortega (a lista, sabemos, é mais extensa).
  Queremos um mundo no qual não estejamos irremediavelmente submetidos à égide dos valores financeiros, à ditadura das finanças, prega, por sua vez, Cacá Diegues, em comovente libelo no jornal O Globo, também neste domingo, e igualmente em alusão à crise grega. A melhor forma de uma sociedade se precaver contra a "ditadura das finanças" é escolhendo governantes responsáveis, que zelem pela boa gestão dos gastos públicos. Algo que a Grécia jamais fez.
    Para que a escolha dê certo, o Contrato Social (Deal, por que não?), firmado entre eleitor e governante, não pode ser objeto de um estelionato. Alexis Tsipras, o primeiro-ministro grego, promoveu uma consulta popular em torno de uma proposta que já não mais estava sobre a mesa. Agora vitorioso, tenta ajustar-se às regras que repelia, ciente de que, embora duríssimas, elas são imprescindíveis à sobrevivência econômica de seu país. Dupla fraude. Dilma Rousseff governa um país com distância galáctica daquele vendido em sua campanha eleitoral de 2014. E usando, para reverter erros do primeiro mandato, a política econômica de seu oponente, que tanto criticou.
    Nunca é demais lembrar que os subprimes que levaram à crise de 2008 foram estimulados por um espasmo de ativismo estatal em plena nação do capitalismo (outra ironia!). As agências que estimulavam as hipotecas imobiliárias de alto risco eram paraestatais. Financistas podem até ter se beneficiado delas (seria ingênuo pedir que não o fizessem, certo?), mas a sua criação partiu da burocracia governamental. Não foi obra do mercado.
    A propósito, nos meses de euforia que precederam o Crash de 1929, banqueiros como Amadeo Peter Giannini - fundador do Bank of America - eram vozes dissonantes quando alertavam para o fato de as ações, inclusive as de suas instituições, estarem sobrevalorizadas, impulsionadas pela especulação, recomendando cautela aos investidores. Foram tachados de perdedores e antipatrióticos pela propaganda oficial articulada de Washington.
    Ainda no rol de articulistas deste domingo, Veríssimo (O Globo) contesta a cobrança da dívida grega pelos alemães - justo os alemães que, assinala, tiveram a sua dívida perdoada após a guerra, beneficiando-se dos bilhões de dólares que o Plano Marshall canalizou para a reconstrução de seu país.
    Veríssimo esqueceu de dizer que à Alemanha do pós-guerra, com sua soberania mitigada, compartilhada pelos vencedores, não foi dada escolha a não ser cumprir o que determinava seus credores. Com disciplina, seguiu o manual e emergiu poucos anos depois mais uma vez como grande potência econômica, mais sólida do que nunca. Claro que o gênio empreendedor de seu povo contou para tanto. Mas isso é outra história.

Por Nilson Mello

Anote:

I - A crise grega prova que a Zona do Euro requer uma política fiscal unificada. Uma utopia por enquanto.

II - Parece contraditório, mas o maior beneficiário de um possível impeachment da presidente Dilma Rousseff seria o PT. Livrar-se-ia da crise e do ônus de recolocar o país de pé. De quebra, poderia voltar a posar de vítima junto ao eleitorado. 

III - E, por falar em impeachment, não há lei que proíba o presidente da República e o presidente do Supremo de se reunirem quando no exterior.

Em tempo:

    Este Blog tem devido ao leitor textos mais curtos, como já foi de seu padrão. Afinal, escrever é cortar palavras, como ensinava Machado de Assis.

   




segunda-feira, 6 de julho de 2015

Em tempo:


    Ao contrário da previsão deste Blog - e das sondagens feitas até a quinta-feira passada - os gregos rejeitaram, no plebiscito deste domingo, as medidas de austeridade exigidas pela União Européia em troca de mais ajuda financeira. A vitória da posição do governo de Alexis Tsipras, contrário à austeridade, foi por ampla margem: 61,32% dos eleitores disseram "não" às exigências contra 38,7% pelo "sim". O índice de comparecimento às urnas foi alto, de 62,5%.
    De qualquer forma, as linhas de empréstimos à Grécia estão por enquanto mantidas, segundo anúncio do Banco Central Europeu feito nesta segunda-feira. A questão agora é saber qual será a reação da União Europeia. Será possível a manutenção da Grécia na Zona do Euro com critérios para a política fiscal distintos daqueles adotados ou impostos pelos demais membros?

    Efeito colateral, já previsto pelo mercado financeiro (Bloomberg): "A vitória do 'não' levará a uma liquidação geral em ações globais, juntamente com pressões de preços sobre os títulos emitidos pela Grécia, por outras economias periféricas e pelos mercados emergentes. Títulos do governo alemão e dos Estados Unidos se beneficiarão de uma fuga para a qualidade". 

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Artigo

O esforço homérico


Homero e os desafios épicos de Brasil e Grécia

    O escárnio talvez explique a proposta de reajuste de até 78,56% concedido pelo Senado aos servidores do Judiciário na última terça-feira. Em pleno período de retração econômica, de desequilíbrio fiscal e de esforço - ainda longe de êxito - do governo para reorganizar as contas públicas, devastadas pela má gestão no primeiro mandato, a decisão dos senadores só pode ter sido um deboche com o contribuinte.
    Do "alto" de seus 9% de popularidade (ou, mais precisamente, dos 68% de rejeição) o pior desempenho de um governante em 30 anos, de acordo com pesquisa CNI-Ibope divulgada esta semana, a presidente Dilma Rousseff já anunciou que vetará a proposta. Não ter mais nada a perder torna-se  às vezes um estímulo para se tomar as decisões certas.
    Pouco se fala, mas foram brincadeiras deste tipo - ou seja, farras promovidas em detrimento do verdadeiro interesse da sociedade - que levaram à Grécia a uma situação fiscal insustentável e a uma dívida praticamente impagável, de 323 bilhões de euros, quase o dobro de seu PIB (de 179 bilhões de euros).
    A Grécia é hoje vítima de seu próprio desacerto fiscal, produto da demagogia e da irresponsabilidade de seus governantes.  
    Ciente disso, sua população tende agora a votar pela permanência na Zona do Euro no plebiscito que será realizado neste domingo (é o que prevêem as sondagens até aqui), mesmo certa de que o caminho implicará sacrifícios, como cortes de gastos sociais e mais aumento de tributos.
    A consulta popular convocada pelo governo de Alexis Tsipras (à frente de sua autodenominada coalizão radical de esquerda, a Syriza), visando a obter respaldo contra os credores, tende a ser, portanto, um tiro pela culatra. Os eleitores preferem assumir os ajustes necessários à alternativa pior, que seria a iminente exclusão da Zona do Euro.
    A esquerda liderada por Tsipras, a exemplo do que fazem seus equivalentes mundo afora, incluindo o Brasil, busca soluções que parecem fáceis, mas que, no final das contas, conduzem a impasses e retrocessos, com um custo ainda maior para a sociedade.
    O deficit da Previdência no Brasil foi de R$ 126 bilhões em 2014. O colapso do sistema é uma questão de tempo - cada vez menos tempo - que o Fator Previdenciário vinha postergando. Com o fim do mecanismo, no bojo da sanha revisionista e oportunista que acometeu o Congresso este ano, a conta chegará mais rápido - e será paga pelo conjunto da sociedade, mas com maior peso para aqueles que têm renda menor, como sempre ocorre.
     O rombo nas contas públicas brasileiras tem tomado proporções catastróficas, obrigando agora a esforços homéricos - já que estamos falando de gregos - em grande parte porque, no Brasil, se mantém a crença de que equilíbrio fiscal e responsabilidade orçamentária são coisas de "neoliberais" que não se preocupam com o povo.
    O capitalismo deu as respostas erradas, enquanto o comunismo não deu respostas aos desafios da humanidade, escreveu Cristovam Buarque, em artigo no último fim de semana. Lênin percebeu os limites do comunismo ainda em 1921, quando, diante da fome que matara mais de 6 milhões de pessoas na URSS, decidiu voltar atrás e reprivatizou a agricultura, a fim de pôr fim à escassez de alimentos. Foi a salvação.
    O regime soviético teve sobrevida de mais sete décadas, mas acabou ruindo devido à própria ineficácia de sua economia. A Syriza certamente faz outra leitura da história. Paciência. Quanto à observação de Cristovam Buarque, ela embute a expectativa de um novo caminho. Qual seria ele ainda não sabemos. Mas certamente não é o da irresponsabilidade fiscal.

Por Nilson Mello