terça-feira, 27 de maio de 2014

Artigo - o posicionamento na mídia

            A imprensa como ringue

  Não é exagero dizer que mais de 98% das notícias que lemos nos jornais, ouvimos no rádio ou assistimos na televisão tiveram origem numa assessoria de imprensa.  A rigor, os meios de comunicação nada mais são do que um palco de confronto de ideias. Vamos além: os meios de comunicação nada mais são do que um ringue de embate de interesses.

  Lidas assim, de primeira, as afirmações acima podem parecer exageradas e ferir os mais românticos ou ingênuos. Contudo, elas sintetizam uma visão realista do papel desempenhado por jornais, revistas, TVs, rádios e, mais recentemente, portais, blogs e sites jornalísticos. 

  E é exatamente por isso que toda instituição, seja pública ou privada, deve procurar ocupar o seu espaço na “mídia”, fortalecendo a sua imagem e, com isso, fazendo a legítima defesa de seus interesses e do segmento que representa.

  Com esses esclarecimentos, já fica mais fácil entender por que se tornou tão relevante – por que não dizer decisivo? – para uma entidade sindical estabelecer um dispositivo de ação estratégica na área de comunicação.

  Se indivíduos têm interesses diversos, nada mais natural que empresas e entidades de classe também tenham divergências quanto a políticas públicas, projetos governamentais, marcos regulatórios etc.

  O embate, na verdade, nada tem de excepcional ou constrangedor – ele faz parte da vida democrática e, desde que travado dentro da lei, é bom que ocorra, porque contribui para o esclarecimento da sociedade. Mais que isso, pode contribuir para o aperfeiçoamento da sociedade.

  O próprio governo – ou os governos, em suas diferentes esferas e instâncias - saberá também, por meio dos instrumentos e sistemas de comunicação de que dispõe, participar das discussões, justificando, para a opinião pública, a decisão tomada. É claro que o embate seria ainda mais construtivo – e democrático – se, hoje, no Brasil, houvesse maior pluralidade de meios: os leitores, ouvintes e telespectadores brasileiros mereceriam ter mais (e melhores) opções.

  Afinal, concentração, em qualquer setor, tende a ser prejudicial. Se abordarmos a questão pelo enfoque estritamente econômico, considerando que vivemos num sistema capitalista, podemos até dizer que o segmento de mídia no país está precisando de um forte choque de mercado que garanta aos “consumidores” um leque maior de escolhas.

  Mas, como não podemos viver no Mundo ideal (que, no caso, seria a plena diversificação de meios e, por consequência, de visões do mundo), essa é mais uma razão para não deixarmos de expressar nossas opiniões e nos posicionarmos politicamente (na acepção ampla, mas também na estrita do termo) junto à opinião pública.

  Neste ponto, um alerta se faz necessário: quanto mais pró-ativa for a instituição, no sentido de se esforçar para ocupar um espaço positivo na mídia, divulgando suas atividades e conquistas, mais sucesso terá em defender os seus interesses, sejam eles institucionais ou mesmo comerciais, sobretudo nos momentos críticos, com noticiário adverso. Ou seja, não se pode deixar de participar desta “briga” e de se estar permanentemente pronto para ela. Até por que os adversários não abondarão o ringue – não deixarão o palco onde exibem suas “ideias”.

  
Por Nilson Mello
*Artigo publicado originalmente na Revista Unificar nº 39, resultado de consultoria em Comunicação Institucional e Política Setorial.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Artigo

Brasil, país pacífico?


As estatísticas brasileiras se equiparam à Guerra Síria


    De forma não tão sóbria e elegante como a relevância do assunto recomendaria, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o pré-candidato tucano à Presidência da República, Aécio Neves, trouxeram a segurança pública para o debate eleitoral.
Mais de 50 mil pessoas são assassinadas todo ano no Brasil. Para se ter a exata noção do grau de violência que essa estatística reflete, tomemos alguns exemplos, antes de retomarmos as considerações sobre o bate-boca entre o ministro e o senador.
Na guerra do Vietnã, na qual os Estados Unidos tomaram parte, com o efetivo envio de tropas, entre 1965 e 1973, cerca de 58 mil militares americanos, entre soldados e oficiais do Exército, da Marinha, dos Fuzileiros Navais e da Força Aérea, foram mortos. Ou seja, pouco mais de 7,2 mil por ano. Estamos falando de uma guerra emblemática, por todos os seus aspectos.
Na Guerra da Bósnia-Hezergovina, o pior conflito europeu desde a Segunda Guerra Mundial – e comparável àquela em grau de crueldade devido às execuções de caráter étnico-religioso (antagonismos entre sérvios ortodoxos, croatas católicos romanos e bósnios muçulmanos) - morreram 200 mil pessoas, entre civis e militares, no decorrer de seus três anos de duração. Ou seja, 66 mil por ano.
Na segunda Guerra do Golfo, ou Guerra de Ocupação do Iraque, entre 2003 e 2011, na qual esteve em ação uma poderosa coalizão militar liderada pela potência hegemônica (EUA), com o decidido apoio do Reino Unido, entre outras nações importantes, morreram 500 mil pessoas, entre civis e militares. Ou seja, 55 mil por ano.
Um paralelo mais recente. Na absurda Guerra Civil da Síria, com seus pouco mais de três anos de duração, foram ceifadas 150 mil vidas (das quais 51 mil civis, entre eles 8 mil crianças e adolescentes, segundo as Nações Unidas). Ou seja, uma dantesca média de 50 mil mortos por ano – equivalente à estatística brasileira, um país que não está em guerra, ao menos não oficialmente.
Voltemos ao bate-boca. Cardozo acha que Aécio não pode falar de política de segurança, porque, como parlamentar, seu curriculum na área foi “pífio”. Aécio acha que o ministro lhe dirigiu “grosserias” e não deveria atuar como “militante”. Imagens de dois assaltantes - um ao guidão outro na garupa de uma moto - pilhando sua vítima, esta dentro de um automóvel, em plena luz do dia, numa movimentada avenida do Rio de Janeiro, foi recorde de audiência nas redes sociais esta semana.
    O episódio é apenas mais um na violentíssima rotina carioca – não muito diferente da de outras metrópoles brasileiras. Não estamos em guerra, mas é como se estivéssemos. Nossas estatísticas de homicídio são dignas do triste “título” ou “rótulo”. Portanto, é bom que o assunto tenha entrado na pauta da campanha. Só falta agora qualificar o debate, em busca de políticas à altura de um problema que há muito é tratado com displicência e irresponsabilidade, para dizer o mínimo.

Por Nilson Mello

Em tempo: Se eleito, Aécio Neves promete mudar o nome do Ministério da Justiça para Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Deveria ir além e tirar a Justiça do nome. Pois da Justiça, cuida (ou deveria cuidar) o Judiciário.

Obs: O Link para o vídeo do assalto no Rio está abaixo:

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 Euclydes da Cunha

Grande escritor, mau amante - Li a matéria sobre os manuscritos deixados por Anna de Assis, publicada em O Globo desta quinta-feira 22, com especial interesse. Considero Os Sertões a mais importante obra da literatura brasileira, não apenas como ensaio histórico e geográfico (categoria a que pertence), mas de forma geral, englobando os romances de ficção. A princípio um tanto difícil de ler, porque o estilo científico e detalhista do positivista Euclydes requer absoluta concentração, Os Sertões é desses livros fundamentais para entender o Brasil. Tanto quanto ou até  mais do que Casa Grande e Senzala (GF) e Os donos do Poder (RF), ou ainda O povo brasileiro (DR).... Euclydes, erudito de rara cepa, não foi certamente bom marido (muito menos bom amante), mas foi sem dúvida o maior escritor brasileiro pela capacidade de destilar conhecimento científico por meio da literatura. Um trecho de Os sertões: "Predestianamo-nos à formação de uma raça histórica em futuro remoto, se o permitir o dilatado tempo de vida nacional autônoma. Invertemos sob este aspecto, a ordem natural dos fatos. A nossa evolução biológica reclama a garantia de evolução social... Estamos condenados à civilização...Ou progredimos ou desaparecemos" ... Em outro trecho, uma sentença categórica: ”O sertanejo é, antes de tudo, um forte”.  

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Anote

Teori Zavascki – Há motivos de sobra para achar que o ministro Teori Zavascki acabou se atrapalhando nas decisões que tomou esta semana em relação ao inquérito da Operação Lava-Jato. Isso para dizer o mínimo. O assunto justificaria um texto mais extenso neste Blog, mas acho que todas as especulações possíveis – irrefutáveis, diga-se de passagem – já foram feitas em artigo de Reinaldo Azevedo (ver link abaixo). A propósito, evito comentar textos de Azevedo porque o vejo como crítico sistemático do governo e do PT.E entendo que a crítica sistemática, em torno de objetos preferenciais e recorrentes, tende a ser facilmente desqualificada. Mas, no caso em questão, o articulista aponta, cirurgicamente, todas as “incoerências” que saltaram aos olhos do mais crédulo e passivo dos observadores.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Comentário do dia

Perguntas para a presidente Dilma

Política do apadrinhamento - O fracasso econômico do governo Dilma Rousseff se traduz pela ênfase excessiva no consumo, derrubada voluntarista dos juros e desvalorização do real, além de fartos gastos públicos, lembra Celso Ming, em sua coluna desta terça-feira 20 em O Estado de S. Paulo (o link com o texto completo segue abaixo deste post), numa análise convergente com artigos e comentários deste Blog.
   O colunista acrescenta que os equívocos da política econômica tiveram como cúmplices lideranças empresariais que abocanharam benesses para determinados setores. E está certo. Este Blog criticou o capitalismo de Estado (ou de apadrinhamento), com seu viés patrimonialista, em várias postagens, entre elas nas de 02 de maio deste ano, 01 e 04 de julho de 2011 e 11 de maio de 2012 (pesquisa na barra à direita).
    Sobre o fraco crescimento que resultou da “nova” matriz econômica engendrada pela presidente Dilma e o ministro Guido Mantega (assunto do artigo da sexta-feira passada, entre outros posts deste Blog), vale dizer que a média do crescimento brasileiro nos últimos três anos foi de 1,9%.
   O desempenho do governo Dilma é o terceiro pior da história da República, salientou José Casado, em artigo, também nesta terça-feira, em O Globo (link igualmente abaixo), citando o livro “Desenvolvimento às avessas”, do economista Reinaldo Gonçalves.
Gonçalves, por Casado, vai além: o crescimento médio do país nos últimos anos ficou abaixo da média (4,3%) dos 152 países em desenvolvimento, entre os 188 acompanhados pelo Fundo Monetário Internacional. Mais: os 32 países da América Latina cresceram, na média, 3,2% - bem acima do Brasil. Com a palavra a candidata Dilma Rousseff.

Link para artigo de Celso Ming:

Link para artigo de José Casado:

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Artigo



           A nova matriz macroeconômica 



    “O amor é uma verdade efêmera”, sentenciou Gabriel Garcia Marquez. Tem peso absoluto, incontestável e preponderante sobre outros valores – se é que ainda cabe interpretação diante da já pujante síntese – só que com prazo de validade improrrogável e irrecorrível. É “eterno enquanto dura”, exaltou o poeta brasileiro, com diagnóstico idêntico ao Nobel colombiano, recentemente falecido.
    Na economia, nem todas as verdades são perenes, mas boa parte dos fundamentos é imutável. O hibridismo é fruto da “interseção” da vontade humana com os pressupostos da ciência exata. Se uma equação matemática pode ser universal e insuperável, as manifestações humanas são imprevisíveis e irremediavelmente condicionadas ao tempo e às circunstâncias.
Na condução da política econômica, fatores imponderáveis, relacionados à ação ou omissão do homem, podem e devem ser considerados no seu contexto, sem que, contudo, se sobreponham a verdades matemáticas. Essas não são passíveis de mudança via vontade política.
Não se pode, por exemplo, decretar o fim da lei da oferta e da demanda, por considera-la prejudicial à sociedade, assim como seria inócuo combater a lei da gravidade. Aqui as razões políticas, ideológicas ou religiosas pouco importam – ainda que sejam elevadas, o que nem sempre ocorre.
Pode-se e deve-se reduzir a pobreza e melhorar o acesso dos mais pobres aos bens de consumo, e é o que as pessoas de boa-fé esperam que o governo faça (todos os governos!). O problema é quando, para levar adiante esse objetivo ou qualquer outro, tenta-se recriar uma “ciência econômica”. Verdades matemáticas, ao contrário dos sentimentos humanos - tão bem captados por Vinícius e Garcia Marquez - não são volúveis.
    Processos criativos na esfera econômica têm trajetória errática, evidenciada pela rotina de tentativas e erros, e invariavelmente conduzem um país a desequilíbrio fiscal, descontrole inflacionário, redução do crescimento e perpetuação do atraso e da pobreza que se pretendia combater.
    Tudo considerado é preciso dizer que o atual governo foi ao extremo da criatividade com a sua “nova matriz macroeconômica”, sob a batuta do ministro Mantega.

  Por Nilson Mello

Anote
Os números não mentem, mas é possível mentir com eles, ou dizer apenas parte da verdade. Foi o que fez o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, ao afirmar (jornais desta sexta-feira dia 16) que a inflação no Brasil está há 15 anos sob controle. O IPCA tem se mantido persistentemente acima do centro da meta de inflação no governo Dilma Rousseff. Nos últimos 12 meses registra 6,28% e caminha célere para superar o teto da meta (de 6,50%). Tombini não mentiu, mas disse apenas parte da verdade.

             
Em tempo:
    Quando Garcia Marquez diz que o amor é uma verdade efêmera, não devemos nos frustrar ou desesperar: com sorte, sobreviverá à nossa existência. O que, na prática, equivale à própria eternidade.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Artigo




Amadurecimento político

Copa sem ilusões


O marciano que desembarcasse esta semana em São Tomé das Letras ou em Varginha, no Sul de Minas, certamente desconfiaria dos registros de seu banco de dados e se perguntaria se o plano de voo de seu disco voador não estaria errado. Afinal, a pouco mais de um mês da Copa, este não parece ser “o país do futebol”.
Do Sul de Minas - região que se orgulha dos “avistamentos” de OVNIs e de seus contatos com extraterrestres e, portanto, local óbvio para o seu pouso – nosso visitante sairia para inspecionar outros pontos do país, sem, contudo, reverter a impressão inicial.
Ao contrário das edições anteriores do Mundial, o clima nas cidades é de frieza, quase indiferença, sobretudo se considerarmos o padrão de comportamento nacional, sempre efusivo.
Alguém precisaria informar ao alienígena que o Brasil, além de ser “o país do futebol - ou “um país do futebol”, como tantos outros - é também um lugar de paradoxos. A boa notícia é que, na Terra (como, provavelmente, no restante do Universo), paradoxos também se explicam. Na pior das hipóteses, permitem conjecturas.
A mais óbvia delas nos diz que a frieza da população em relação à Copa do Mundo que será realizada aqui (depois de 64 anos!) é um contundente sinal de desaprovação aos governantes. Claro que todos queriam a Copa, mas não com os gastos exorbitantes e questionáveis com que as obras programadas foram executadas - boa parte delas ainda inacabada ou descartada, por “decurso de prazo”. Aliás, gastos tão exorbitantes que autorizariam até o mais lunático e alienado dos turistas interplanetários a suspeitar de desvios e superfaturamentos.
A questão vai um pouco além, sem se distanciar a linha de conjectura. A população queria a Copa e gosta de ter belos estádios, desde que, no entorno deles, se tenha também um país decente para viver, como lembrou um locutor dias desses, com segurança e serviços de educação e saúde de qualidade, além de uma infraestrutura eficiente.
O marciano deveria ser alertado que o desânimo geral pode ser também indício de uma vergonha coletiva. Vergonha pelos compromissos assumidos e não cumpridos, pelas promessas esvaziadas pela incompetência administrativa e pela total falta de organização e planejamento. Um constrangimento de proporções galácticas!
Então, se ainda não há bandeiras nas janelas e sacadas ou se ruas e muros não estão pintados de verde, amarelo, azul e branco, é porque o brasileiro cansou das ilusões e não se contenta mais em compensar as suas recorrentes frustrações com as efêmeras alegrias que o futebol proporciona.
O que não deixa de ser – e aqui vai mais uma conjetura – um indício de amadurecimento político, cujos reflexos poderão ser aferidos, em maior ou menor grau, nas próximas eleições.
Por Nilson Mello


EM TEMPO
    Não faltaram paradoxos nos últimos dias:
Ø Noticia-se (Clarissa Thomé, Estadão) que o tenente-coronel reformado Paulo Malhães, torturador confesso de militantes de esquerda durante o regime militar, morto durante um assalto a seu sítio em Nova Iguaçu (RJ), era candidato a vereador pelo PDT, numa frente “democrática” com o PCdoB.
Ø Em nome da Justiça, uma turba espanca até a morte uma dona de casa no Guarujá (SP). Se ela era ou não inocente, nem vem ao caso. Na verdade, era inocente, mas ainda que fosse culpada, o linchamento já seria bárbaro.
Ø A arrecadação de tributos foi recorde no primeiro trimestre (R$ 293,4 bilhões), a despeito do baixo crescimento da economia brasileira na “Era Dilma” e do quase retrocesso do setor industrial.
Ø O ministro da Economia volta a afirmar que a inflação está sob seu absoluto controle. Alô, alô, Marciano...!

ANOTE
    Para entender o processo de aparelhamento da máquina pública promovido pelo PT, dentro de sua estratégia de perpetuação no Poder, bem como os movimentos nas entranhas do partido, tendo em vista as próximas eleições, recomenda-se a (re)leitura de dois artigos publicados esta semana no jornal O Globo, cujos links seguem abaixo.
“Adeus, PT”, de Marco Antonio Villa, em http://oglobo.globo.com/opiniao/adeus-pt-12388207
“PT Conspira contra Dilma”, de José Casado, http://oglobo.globo.com/opiniao/pt-conspira-contra-dilma-12388820