sexta-feira, 29 de julho de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

O cobertor curto do Banco Central – e do governo

     O Banco Central – e, por que não dizer?, o governo - vive às voltas com um cobertor curto. Se aumenta os juros, para conter a inflação, atrai ainda mais dólares para o país. Mais divisas entrando significa valorização do real e perda de competitividade para a indústria nacional na disputa do mercado global.
     Aí o que faz o governo? Baixa um pacote de medidas, como fez esta semana (contidas na MP 539 e no Decreto 6.306), para segurar a queda livre do dólar. Efeito colateral provável, já avaliado por consultores e analistas: perda de investimentos e aportes financeiros para outros mercados no médio prazo. O que, evidentemente, também não é bom.
     A taxa de juro tem que ser elevada (e há muito é a mais alta do mundo) para conter os preços, ainda sob forte pressão do consumo. O objetivo é nobre, mas seus efeitos indesejáveis. A política monetária poderia ser mais branda se a política fiscal participasse do combate à inflação. Mas o governo é perdulário e não contém a expansão de seus gastos. Não na medida necessária.
     O Copom, Comitê de Política Monetária, decidiu-se pela conduta híbrida. Anuncia que busca a meta de inflação para 2012, mas, ao mesmo tempo, garante (última Ata) que o ciclo de alta da Selic (taxa básica) está se encerrando. Quer conter os preços mas sem ser muito rigoroso, aplicando o discurso da presidente Dilma Rousseff.
Ato contínuo, o mercado passa a especular que a meta de inflação (4,5%) não será mesmo alcançada em 2012, gerando expectativas que reforçam a possibilidade de uma “profecia auto-realizável”. Se a expectativa de todos é que a inflação suba ou se mantenha fora da meta até 2013, e o BC afrouxa o torniquete ou adota um discruso ambíguo, os preços acabam mesmo subindo.
Mas eis que a equipe econômica é otimista. Está convencido de que a péssima situação da economia global vai por si só contribuir para a desaceleração da economia interna. Além disso, acredita nas medidas de contenção do crédito já adotadas.
E, assim, continuamos a conviver com uma política fiscal frouxa. E com uma política monetária vacilante, pois impõe taxas altas, mas não segura a inflação. Enquanto isso, juros, inflação e câmbio continuam pressionados.
O câmbio, por sinal, merece uma nota à parte. Como está atrelado a fatores externos, em especial à forte expansão monetária dos Estados Unidos e a uma política cambial artificial chinesa, nada que se faça no Brasil – como o pacote recentemente lançado - poderá mudar substancialmente a desvalorização do dólar por muito tempo. E essa é uma tendência que deve perdurar, conforme alertam dez em cada dez analistas.
O que significa que a busca de competitividade terá que ser feita via outros esforços. Não custa lembrar: redução de tributos, desburocratização, desoneração da folha salarial, além de investimentos em infraestrutura e educação. Mas o governo prefere gastar em vez de investir.
O cobertor do governo é mesmo curto. Mas só é curto porque ele não toma as decisões certas.
Por Nilson Mello



E os investimentos...


E por falar em investimentos duas notícias chamam a atenção nesta sexta-feira (29/07). A primeira é que os projetos da área do Ministério dos Transportes – às voltas com irregularidades – frustraram as metas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
 Os jornais divulgam que o afastamento da cúpula do ministério por conta das denúncias de superfaturamento impediu a realização de leilões de concessão, autorização de obras e outras providências. Se a causa foi mesmo esta, melhor assim. Mas, convenhamos, não há o que comemorar.
A outra notícia é que a receita das companhias áreas brasileiras, em voos domésticos, é a que mais cresceu no mundo, segundo a Associação Nacional de Transporte Aéreo (Iata). O avanço foi de 19% no primeiro semestre no comparativo ao mesmo período do ano passado. No mundo, a média de crescimento foi de 4%.
O aumento de receita decorre do forte aumento de demanda. No ano passado 66 milhões de brasileiros viajaram de avião entre os estados, praticamente o mesmo número dos que utilizaram o ônibus (67 milhões).
O problema é que se a expansão persistir sem que ocorram os prometidos investimentos nos aeroportos, a tendência é de paralisação do setor e, num segundo momento, aumento de tarifas aeroportuárias e aéreas e a volta da “elitização” do transporte aéreo.
Estudo recente, encomendado pelo BNDEs, apontou que 13 dos 20 principais aeroportos brasileiros estão saturados. E que seriam necessários investimentos da ordem de R$ 35 bilhões para garantir o transporte de 310 milhões de pessoas até 2030 – projeção de crescimento tomando-se as taxas de crescimento médias anuais atuais.
Mas, onde estão as obras?

quarta-feira, 27 de julho de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

Hábitos escabrosos

     A rigor, notícia é sinônimo de novidade. Dentro de um conceito estritamente jornalístico, nada mais é do que a anti-rotina. Ora, o que é corriqueiro não merece as manchetes. Ninguém quer ler, assistir e ouvir o que é banal e freqüente. Isso explica, em parte, porque o jornalista acaba sendo um portador de “más notícias”. Infelizmente, o mundo não é azul.
Pois bem, a imprensa brasileira, sem perceber, está invertendo a lógica quando noticia casos de pessoas que acham carteiras de dinheiro na rua e procuram seus donos para devolvê-las. Aliás, quanto mais a mídia revela práticas elogiáveis desse tipo, mais nos coloca diante de nossa realidade corrupta. Porque, se a regra fosse a honestidade, tais condutas não seriam notícia.  

Reflitamos sobre o tema ao ler nos jornais reportagens apontando os serviços de excelência de um porto, rodovia, hospital, escola ou qualquer órgão público. O que era para ser regra vira exceção. E a exceção - que nada mais é do que o esperado dentro da rotina - se transforma em grande notícia. Um marketing cada vez mais eficiente dá conta do recado.
Toda uma estrutura que deveria funcionar a contento, cumprindo a sua função, trabalha de forma precária, em prejuízo do contribuinte, que a sustenta com pesados impostos. Quando alguma coisa vai bem, em caráter excepcional, ganha ares de um grande feito. Embuste do Poder Público, com nossa conivência e, muitas vezes, cumplicidade.
E o que dizer das recorrentes práticas de corrupção? Merecem ou não o desdém do noticiário por terem se transformado na mais trivial banalidade do cotidiano brasileiro? Do policial da esquina aos gabinetes próximos ou contíguos ao da Presidência da República, passando por instâncias do Judiciário, não se fala em (ou faz) outra coisa.
Noticiou-se esta semana que 12 governadores são réus em ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por compra de votos e outras irregularidades. Correm o risco de perder o mandato – e isso se a Justiça tardar, mas não falhar, pois as evidências levantadas pelo Ministério Público são impressionantes.
A corrupção tornou-se hábito tão trivial que chega a ser surpreendente o fato de ainda chamar a atenção e mobilizar a mídia – o que por si só já é uma trágica “notícia”. Mas é preciso reconhecer que a prática se supera e se aperfeiçoa numa velocidade e em grau inimagináveis.
Seis governadores eleitos em 2006 (a metade, portanto, dos eleitos no ano passado e que agora estão sob processo) já haviam perdido o mandato por abusos cometidos contra os eleitores. Agora são 12, nada menos que o dobro, os sujeitos a cassação. Trinta anos atrás ministro corrupto era o que metia 10% de comissão no bolso. O que são 10% para os padrões de hoje? Risível.
Portanto, leitor, quando se deparar com nova manchete sobre corrupção (e isso pode acontecer a qualquer momento) não tenha esperanças: a imprensa não está noticiando a simples rotina. Trata-se certamente de um episódio muito mais grave e surpreendente do que tudo já divulgado até então neste país de hábitos escabrosos.
    
Por Nilson Mello
           

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Artigo


Um “título” que mina a competitividade

     O assunto foi tema de comentário do dia 12 de julho neste blog e volta a ser pertinente no momento em que o governo estuda a desoneração da folha salarial dentro do que está sendo batizado de nova Política de Desenvolvimento Competitivo, um pacote de medidas a serem anunciadas no próximo mês.
Recente pesquisa da Federação das Indústrias de São Paulo (FIESP), em conjunto com o Bureau of Labor Statistics (BLS), dos Estados Unidos, confirma que o Brasil é o “campeão” em encargos trabalhistas - tributos pagos pelo empregador sobre a contratação e os salários de seus funcionários. O “título” é negativo porque impõe um lastro a nossa competitividade.
     Dos 34 países estudados pelo BLS o Brasil é o que apresenta o maior custo, com 11 pontos percentuais acima da média do grupo avaliado. Os encargos representam quase um terço (32,4%) do custo da mão de obra na indústria brasileira.
Na verdade, se computados todos os benefícios possíveis – e considerando os demais segmentos da economia, não apenas a indústria - os encargos podem representar mais de 100% dos salários, conforme já comprovaram inúmeros estudos, inclusive da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Pelo recente levantamento do BLS, na Europa, a média dos encargos na indústria é de 25%. Em relação aos emergentes e em desenvolvimento, concorrentes diretos das empresas nacionais no mercado global, a “dianteira” do Brasil ainda é maior. Na Argentina e na Coréia do Sul, por exemplo, os encargos correspondem a 17% dos custos com mão de obra; em Formosa (Taiwan), 14,7%.
O setor industrial brasileiro recolhe a título de contribuição para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) um valor que corresponde a 20% da folha salarial. Somam-se a isso os recolhimentos referentes a FGTS, risco de acidente, Salário Educação, SESI, SENAI e SEBRAE e outros benefícios, perfazendo 32,4%.
A repetição da conclusão do comentário do dia 12 deste Blog é oportuna:
(...) Uma reforma que venha a diminuir os custos da contratação teria efeito multiplicador na economia, com desdobramentos positivos sobre a renda e, por extensão, sobre a própria arrecadação, que sairia robustecida pelo aumento da formalidade decorrente de tal medida. A eventual perda de receita fiscal decorrente da redução de encargos estaria compensada pelo aumento da arrecadação provocado pela melhoria da massa salarial e pela redução da informalidade (...).
Infelizmente, não é certo que o governo faça o que é preciso fazer ao lançar o seu Pacote de Desenvolvimento Competitivo. Já se especula que será apenas mais uma peça de marketing, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que até hoje não equacionou os gargalos da infraestrutura brasileira.
Cabe salientar que, com tantos problemas relacionados à perda de competitividade – custos estruturais, custos trabalhistas, custos burocráticos, insegurança jurídica – passíveis de solução por conta de nossas próprias decisões, não adianta concentrar a atenção na questão cambial, pois, de todos esses fatores, é sobre o qual temos menos ingerência por força de circunstâncias externas excepcionais. (Ver tabela abaixo).
Por Nilson Mello

OBS: Sugestão de leitura técnica nos links:


1)http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/6091/Competitividade_e_Desoneracao_da_Folha
2)
www.grupoempresarial.adm.br/download/uploads/Encargos%20Sociais%20%20Trabalhistas_M4_AR.pdf .
Embora de posição mais conservadora em relação ao tema, o texto sugerido acima apresenta conceitos indispensáveis para se entender a diferença entre encargos sociais e obrigações trabalhistas. Peca, contudo, ao refutar a desoneração como fator que contribui para a geração de empregos.
ara leitura técnica de referência acessar o link do Grupo Empresaial ADM:

TABELA DE ENCARGOS SOCIAIS

GRUPO I
Verba %
Previdência Social 10,00
SESI ou SESC 1,50
INCRA 0,20
13o salário 0,75
Salário família 4,00
Salário maternidade 0,30
Assistência rural 2,40
FGTS 8,00
Seguro Acidente de Trabalho 2,50
Salário Educação 2,50
Subtotal 1: 32,65%

GRUPO II
Verba %
Repouso semanal remunerado 24,00
Férias e abono 16,10
Feriados 8,60
Auxilio Enfermidade 2,60
Aviso prévio 3,50
Semana inglesa / 44 horas 15,50
Subtotal 2: 70,30%

GRUPO III
Verba %
13o salário 13,10
Vale transporte 1,90
Depósito rescisório 4,90
Subtotal 3: 19,90%

TOTAL GERAL (1+2+3) 122,85%





quarta-feira, 20 de julho de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

      

Arrecadação e inflação

        A arrecadação federal bateu recorde no mês de junho, alcançando R$ 82,72 bilhões, o que significa uma alta de 23,07% acima da inflação na comparação com o mesmo mês de 2010, informam os jornais desta quarta-feira (20/07).
    Os brasileiros já pagaram mais de R$ 645 bilhões em tributos federais neste semestre, cerca de 13% a mais do que no ano passado. A Receita Federal prevê que a arrecadação este ano seja 10,5% maior do que no ano passado, numa prova de que o consumo continua aquecido.
    A notícia nos leva a retomar a reflexão da postagem de ontem deste blog. Ora, se o consumo continua aquecido (robustecendo a arrecadação), mas sem que haja contrapartida em aumento da produtividade, pois a despeito da carga tributária, os investimentos são tímidos, como será possível manter a estabilidade dos preços?
    Sobre o assunto, o analista Celso Ming, do jornal O Estado de S. Paulo, comenta em seu artigo de hoje (ver link logo abaixo) que as despesas correntes do governo vêm aumentando 10% ao ano, ajudando a empurrar o consumo. São despesas que - conforme comentado na última postagem - não garantem produtividade à economia e, como tal, geram risco à estabilidade.
    Celso Ming completa: “...O Banco Central entendeu que tinha de desistir de entregar a inflação na Meta em 2011. Assegurou que isso acontecerá em 2012. No entanto, está cada vez mais difícil cumprir a nova promessa”.
    O Brasil conseguiu melhorar a renda da população graças à estabilidade econômica – ou seja, o controle da inflação iniciado com o Plano Real, ainda na década de 1990. Agora que temos renda, estamos impulsionando o consumo. Mas um consumo sem produtividade. Se a tendência persistir, em breve não teremos mais estabilidade – e nem renda e consumo. É preciso ficar alerta!
   
Em tempo: A melhor maneira de fazer a arrecadação crescer de forma sustentável, sem sufocar o setor produtivo, e prevenindo evasão e informalidade, é reduzir e simplificar tributos. Custos tributários menores estimulam a produção, o comércio e a renda. Todos ganham.


terça-feira, 19 de julho de 2011

COMENTÁRIOS DO DIA

Marketing ou gestão



                               Paulo Sergio Passos está no crédito de Dilma




O problema do governo Dilma Rousseff não é a falta de rumo ou de gestão, tampouco as irregularidades e as ingerências fisiológicas (aquelas em grande medida decorrentes dessas) que comprometem o desempenho de Ministérios responsáveis por obras e projetos importantes, como o dos Transportes.
O problema, segundo recente diagnóstico dos senadores do PT, é de marketing. Ou - mas precisamente - de falta de marketing.
“Lula fazia propaganda sozinho, mas agora é preciso caprichar na divulgação”, avalia um dos próceres do partido, em tom que mescla lamúria, saudosismo e recomendação.
A presidente está distante da autopromoção que marcou o antecessor – o que é positivo. Ganhou pontos por atitudes firmes. Pesquisas de opinião apontam aprovação em relação às medidas adotadas para afastar a cúpula do Ministério dos Transportes sob suspeita de corrupção.
A presidente tem procurado agir de forma coerente com seu estilo – e com o seu discurso. Anunciou nesta segunda-feira (18/07) que o diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) Luiz Antonio Pagot, envolvido no noticiário sobre superfaturamento e cobranças de propina, voltará das férias, mas não ao cargo, a despeito da pressão feita por nomes de peso como o presidente do Senado, o vice-presidente da República e o ex-presidente Lula.
O DNIT é o órgão que elevou em 33% o valor dos contratos feitos com dispensa de licitação entre 2009 e 2010, de acordo com o TCU.
Em nome da coerência, também, seria oportuno saber se é razoável efetivar como ministro dos Transportes alguém que há anos ocupa cargos no primeiro escalão da pasta, convivendo com toda a ex-cúpula hoje sob suspeita. Como a presidente tem acertado na condução ética (bem mais, por sinal, do que na gestão), que possamos dar um crédito a sua convicção neste caso. Não – é claro - sem certa dose de ceticismo.
Quanto ao marketing mais agressivo reclamado pelos senadores petistas, haja vista que inevitável, que venha ao menos atrelado a providências concretas - e à comprovação de desempenho. Por enquanto, o que este governo esquartejado em 37 ministérios pela voracidade fisiológica dos partidos governistas tem feito é reagir aos escândalos.  Ao trabalho.

Inflação e infraestrutura

Véspera de reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM), o assunto inflação entra necessariamente na ordem do dia. A previsão da maioria dos analistas é de que o Comitê volte a puxar o juro básico (Selic) nesta quarta-feira em 0,25%.
Mas há desde já dúvidas se haverá mais altas nas próximas reuniões, tendo em vista os boatos de que o BC já está abandonando o objetivo de alcançar o centro da meta (4,5%) em 2012. O objetivo seria adiado para 2013. A inflação em 12 meses medida pelo índice oficial (IPCA) está em 6,7% (o teto da meta é 6,5%).
O governo ajudou a pressionar a inflação ao longo dos últimos anos com os aumentos de suas despesas. São gastos que não geraram produtividade. O governo também ajuda a pressionar os juros, indiretamente, por gastar muito e precisar recorrer ao mercado para rolar suas dívidas – encarecendo, assim, por tabela, os financiamentos para os tomadores privados.
A política monetária no Brasil – em suposta defesa da estabilidade de preços - tem tido que ser mais dura do que o desejável por conta da flacidez da política fiscal. Quando a autoridade monetária começa a sinalizar que seguirá uma política mais branda e flexível, a exemplo do que já ocorre na política fiscal, passa a insuflar as expectativas do mercado de que a inflação pode, de fato, sair de controle.
O Banco Central (e o COPOM) trabalha com expectativas. Reverter expectativas negativas – prevenindo a chamada profecia auto-realizável – é uma providência fundamental para conter as pressões sobre a inflação. Postergar metas, portanto, não parece ser algo compatível com o papel que o BC deve exercer.
Mas o que chama mais a atenção neste renitente dilema brasileiro entre estabilidade monetária e crescimento é que, embora os gastos públicos venham aumentando de forma significativa (sustentados por aumentos de impostos e do consumo), não se nota melhora correspondente nos investimentos em infraestrutura.
Não custa lembrar que esses investimentos são essenciais para tornar o país mais eficiente e produtivo, reduzindo as pressões sobre os custos e, por extensão, sobre os preços.
Pesquisa recentemente divulgada pela InterB Consultoria revela que o badalado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), apresentado pelo marketing oficial como o propulsor de uma nova era de desenvolvimento brasileiro, deu pífia contribuição aos investimentos em infraestrutura.
Para se ter uma idéia, em 2007 os investimentos em infraestrutura foram de 2,05% do PIB. Em 2010, o percentual subiu para 2,53%, ou seja, apenas 0,48% de avanço, apesar das intervenções do PAC. Os países emergentes – concorrentes diretos do Brasil - investem ao menos 5% do PIB em inraestrutura. Especialistas estimam que precisaríamos investir ao menos 6% ao longo de 20 anos para garantir eficiência a nossas estradas, ferrovias, portos e aeroportos, e obter crescimento sustentável a taxas em torno de 4% do PIB.
Os investimentos em infraesturua no ano passado somados totalizaram R$ 93 bilhões. Mas só os portos necessitam de R$ 40 bilhões no curto prazo – de acordo com estimativas do IPEA – para eliminar os gargalos que aumentam os custos da cadeia produtiva. Os navios que transportam 98% do comércio exterior brasileiro ficaram parados à espera de atracação nos portos nacionais por quase 4 mil dias no ano passado, de acordo com levantamento do Centro Nacional de Navegação (Centronave) – algo inadmissível quando se precisa ganhar competitividade.
 Por isso, quando parlamentares do governo clamam por um marketing agressivo, como o feito na época do lançamento do PAC (que, como se viu, não redundou em grandes avanços), é legítimo pôr em dúvida as chances de êxito deste governo. Sobretudo considerando que não há certeza de que um Ministério fundamental para o desenvolvimento - o dos Transportes – tenha se libertado do fisiologismo.
E deixemos de lado, por enquanto, o fato de a atual presidente da República ter sido ninguém menos do que a gestora do PAC.


           


sexta-feira, 15 de julho de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

Obstáculos nos caminhos dos Transportes










     A cúpula do Ministério dos Transportes, incluindo o ministro e diretores dos principais órgãos vinculados, foi afastada por suspeita de envolvimento em fraudes, superfaturamentos e cobranças de propinas.
Nada ficou comprovado, até porque falcatrua não tem recibo. (Ao menos não tinha até recentemente, mas acerteza da impunidade vem mudando sobremaneira a cultura da corrupção no país, haja vista pacotes de dinheiro encontrados em cuecas de suspeitos e outros escândalos mais). Mas se a própria presidente da República achou por bem fazer a “faxina” profilática, é porque os indícios são consistentes.
Assim, entende-se – e louva-se – a medida tomada.
O que permanece sem explicação, contudo, é a confirmação do então interino Paulo Sergio Passos como ministro. Ora, há anos ele também faz parte dessa cúpula hoje em suspeição. E já havia sido ministro interino no governo Lula.
Passos, porém, segundo se noticia, goza de plena e irrestrita confiança da presidente Dilma Rousseff. Ele era o secretário Executivo do ministério sob o comando de Alfredo Nascimento.
Empossado como titular, já avisou que pretende revogar a suspensão por 30 dias das licitações, obras e projetos do Ministério determinada há poucos dias por ninguém menos que a sua chefe. A justificativa prosaica é que esses projetos são politicamente importantes para governadores e parlamentares junto a suas bases.
O objetivo do Palácio do Planalto era aproveitar a suspensão para verificar a suspeição. A presidente usou o termo pente-fino para justificar a paralisação dos projetos. Mas ao que parece tudo ficará na mesma neste cada dia mais enigmático Ministério dos Transportes.
Mantêm-se as obras, apesar das suspeitas. Confirma-se o interino que participava da antiga cúpula. Na pasta responsável pela recuperação, ampliação e melhoria de nossa cada vez mais degradada malha rodoviária – entre outras competências igualmente relevantes – tudo ganha ar de enigma.
Agora noticia-se, também, que a mulher do diretor executivo do Departamento Nacional de Infraestrutura de transportes (DNIT), principal órgão do Ministério, é dona de empresa que mantém contratos com o governo de obras rodoviárias que somam R$ 18 milhões.
Luiz Antonio Pagot, por sua vez, foi afastado da direção-geral do DNIT, mas não caiu de vez. E ninguém menos que o vice-presidente Michel Temer defendeu que se espere ele votar de férias, para se explicar.
Ora, se ele está em Brasília, já esteve em audiência na Câmara esta semana, por que precisa voltar das férias para ser explicar? E para ser definitivamente defenestrado...
A conclusão é que tudo continuará como antes nos Transportes. Incluindo as rodovias em péssimo estado de conservação.

terça-feira, 12 de julho de 2011

COMENTÁRIOS DO DIA



Oferta e demanda sobre os salários

Melhores salários na indústria



      Prova de que uma desregulamentação do mercado de trabalho não traria prejuízo aos assalariados – muito ao contrário – pode ser extraída de recente levantamento que aponta aumentos salariais bem superiores aos índices de inflação na indústria por conta exclusiva da maior demanda por mão de obra.
    Não é novidade para ninguém que a nossa legislação trabalhista - originada na era Vargas e, por essa razão, protecionista - cria obrigações excessivs que encarecem o emprego. Contratar no Brasil é uma árdua tarefa. 
    A justificativa é proteger o trabalhador, visto como “hipossuficiente”, valorizando o emprego, mas o resultado é justamente o inverso: menos postos de trabalho ou salários mais baixos e, invariavelmente, a combinação de ambos, com aumento da informalidade, ou seja, um efeito colateral muito prejudicial à sociedade. 
     Pois bem, dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do governo federal revelam que os salários de contratação na indústria cresceram 12% nos últimos 12 meses, enquanto a inflação oficial (IPCA/IBGE) bateu 6,7% no período.
      Houve quem ficasse alarmado com esses números, sobretudo pelo impacto na inflação (ver nota abaixo). Contudo, aumento salarial decorrente de aumento de produção – ou para suportar o aumento da produção – é bem-vindo uma vez que contribui para o crescimento sustentável da economia. Significa que a necessidade de produzir supera os obstáculos legais impostos ao empregador.
      Diante desse contexto, o que o governo deveria fazer é criar mecanismos que estimulem a produção, eliminando os gargalos que pressionam os custos e, por conseqüência, geram inflação. Um desses gargalos é a legislação trabalhista.
       Aumento de salário deletério e perigoso é aquele atrelado à indexação, pois cria uma camisa de força para a economia – um artificialismo que conflita com a produtividade. Não é o caso dos aumentos identificados pelo Caged.
       Uma reforma trabalhista que venha a diminuir os custos da contratação teria efeito multiplicador na economia, com desdobramentos positivos sobre a renda e, por extensão, sobre a própria arrecadação, que sairia robustecida pelo aumento da formalidade decorrente de tal medida. A eventual perda de receita fiscal decorrente da redução de encargos estaria compensada pelo aumento da arrecadação provocado pela melhoria da massa salarial e pela redução da informalidade.
      Sim, porque num mercado de contratação livre, em economia estável, a demanda por mão de obra sobe. E com ela sobem os salários dos trabalhadores. O que não é mais possível é o empregador pagar tantos encargos sobre o salário e a economia permanecer ancorada na informalidade.
      Por Nilson Mello


Inflação


        O ritmo da inflação diminuiu nos últimos dois meses, se comparado às pressões do primeiro trimestre, mas os riscos ainda não estão afastados. (O assunto foi objeto de uma série de comentários e artigos neste blog desde o início de ano e podem ser acessados pela ferramenta de pesquisa na barra lateral direita).
     Os índices voltam a ser uma preocupação se considerarmos o alto grau de indexação da economia, bem como o calendário de ajustes salariais que aponta para a data-base de categorias com forte poder de negociação, como os bancários, a partir de agosto.
      O IPCA de junho ficou em 0,15%. Boa parte dos analistas não acredita que será possível voltar ao centro da meta de inflação, de 4,5%, já em 2012, com a economia crescendo a taxas superiores a 4% ao ano - projeções para 2011/2012. E é por isso que o governo deveria cada vez mais se preocupar em eliminar custos da cadeia produtiva - custos esses que impactam os preços.
      A inflação em 2011 está 0,13% mais alta do que em 2010. No acumulado dos últimos 12 meses, já estourou o topo da meta (6,5%), alcançando 6,5%. Isso significa que o Comitê de Política Monetária (COPOM) deverá manter o ritmo e alta dos juros (em 0,25%) nas reuniões de julho e agosto
       

quinta-feira, 7 de julho de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

Afastado do governo, de volta ao Senado

                          
   Clóvis Carvalho                                                           

     O ex-presidente Lula gostava de postergar decisões, principalmente se essas implicassem a troca de colaboradores amigos e integrantes de seu governo envolvidos em corrupção.
Dizia que não podia afastar ministro e assessor “apenas” porque a imprensa os associava a propinas, superfaturamentos e outros escândalos, como os que voltam a se repetir no início deste governo.
Na verdade a imprensa “apenas” noticiava os descaminhos que Ministério Público, TCU, Polícia Federal e outros órgãos investigavam.
     Os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Itamar Franco não tardaram a afastar assessores próximos quando surgiram suspeitas – não comprovadas – da participação deles em irregularidades.
     Num caso emblemático, Itamar Franco, falecido no último fim de semana, exonerou o seu amigo de juventude e fiel escudeiro Henrique Hargreaves da Casa Civil, até que sua inocência - em um desses recorrentes escândalos - fosse comprovada.
Consta que o próprio pediu ao chefe que o exonerasse, até o esclarecimento dos fatos. Hargreaves voltou fortalecido meses depois.
     FHC exonerou Clóvis Carvalho, também da Casa Civil.  Recentemente, por ocasião de seus 80 anos, reconheceu que o afastamento profilático do leal e fraterno amigo foi um dos momentos mais doloridos de sua passagem pelo Planalto, até porque os acontecimentos mostraram que “ele era inocente”.
Assim como no governo Itamar, prevaleceu a máxima segunda a qual a “mulher de César não basta ser honesta; tem que parecer honesta”.
     Até o início desta semana a presidente Dilma Rousseff dava sinais de fraqueza ao manter Alfredo Nascimento no cargo a despeito da enxurrada de denúncias contra alguns dos principais integrantes do segundo escalão no Ministério dos Transportes.
Ontem, por fim, o ministro pediu sua exoneração – pelo que se noticiou, por pressão e determinação da presidente. Dilma Rousseff não poderia ter dado melhor sinal à sociedade quanto aos compromissos éticos de seu governo – ainda que um sinal tardio.
Mas a notícia é apenas parcialmente boa. O ex-ministro está de volta ao Senado, como representante do Amazonas, gozando de imunidade parlamentar, e deve reassumir a Presidência do PR, legenda da base aliada que mantém outros representantes no governo. Alfredo Nascimento continuará à vontade para dar seqüência à sua “trajetória política”. E queiramos ou não, com influência no governo.
Em meio à segunda saída de ministro no prazo de seis meses - em razão de escandâlos de corrupção - é pertinente indagar se o governo continuará preso às amarras impostas pelo clientelismo de coalização. Ou se é possível governar sem se tornar refém de uma base aliada de interesses cada vez mais espúrios.
Eis o tamanho do desafio que qualquer governante comprometido com a ética e a boa gestão precisa enfrentar.
Boa sorte, Dilma!

Por Nilson Mello

Em tempo: sobre informação no artigo publicado ontem neste Blog, jornais do fim de semana informavam que Alfredo Nascimento era escolha pessoal da presidente, como forma de azeitar a relação com o PR. Os jornais de hoje, por outro lado, o colocam no espólio do ex-presidente Lula.

    

quarta-feira, 6 de julho de 2011

ARTIGO

Cinismo ou genuíno arrependimento e ingenuidade

Ministro Alfredo Nascimento

     O governador Sergio Cabral, cuja evolução patrimonial, embora possa ser lícita, exibe uma celeridade de fazer inveja ao ex-ministro Antonio Palocci - sobretudo se considerarmos que a profissão de jornalista e a função de parlamentar, respectivamente, escolhida e exercida por anos pelo governador, em condições normais, não fazem de ninguém um novo milionário - decidiu instituir um Código de Ética para o servidor público do Rio de Janeiro.
     A decisão foi tomada depois que Cabral reconheceu, timidamente, que manter ligações estreitas com empresários - em especial empreiteiros – não é conveniente. Sobretudo se os empreiteiros com quem mantém suas estreitas relações são recorrentes prestadores de serviços do governo que dirige.
     Sergio Cabral, que até pode ser considerado um governador razoável em relação a antecessores (ressalte-se a base comparativa sofrível), em particular se considerados os avanços obtidos na área de segurança, sentiu-se pungido a fazer a tímida mea culpa e a enquadrar todo o funcionalismo fluminense após a repercussão negativa de suas viagens em jatos executivos cedidos por empresários “amigos” do governo - ou “amigos pessoais”, com licença do pleonasmo.
     Não deixa de ser curioso que, depois de ter feito o que a Ética condena – sem necessidade de Código algum, mas apenas pelo bom senso – o governador seja tomado por um forte arrependimento. Mais curioso ainda é vê-lo dividir o foco e a culpa dos erros cometidos, ou seja, as estreitas e nada transparentes ligações com grandes fornecedores de seu governo, com todo o funcionalismo público. Pois ao lançar a idéia de um Código de Ética para enquadrar os servidores do Estado é exatamente o que faz.
     Seria extremamente injusto nomear a conduta de cínica, posto que todos, mesmo os piores réus (e nem é esse o seu caso, longe disso) merecem o benefício da dúvida. Creditemos, portanto, a medida ao genuíno arrependimento de Cabral. E ao seu ferrenho empenho em estabelecer uma administração pública transparente. Que tenha êxito! Afinal, nós, brasileiros, devemos ter fé. Mesmo, nós, brasileiros ateus.
     Genuína também foi a decisão da presidente Dilma Rousseff de determinar o afastamento de integrantes do segundo escalão do Ministério de Transportes, em função de evidentes indícios de superfaturamento em obras contratadas por órgãos vinculados à pasta. Genuína, porém, ingênua, para ficar no adjetivo mais benevolente, pois manteve no cargo o ministro Alfredo Nascimento (foto). O chefe não pode estar isento das faltas cometidas pelos auxiliares. Se é o chefe, é, em última análise, o responsável.
     Os auxiliares, no caso, teriam sido indicados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (logo ele, que tanto reclamava da herança maldita do antecessor), enquanto Alfredo é da cota pessoal da presidente. (É sempre válido lembrar que, no Presidencialismo de coalizão brasileiro, cada vez mais contrário aos verdadeiros interesses da sociedade, os cargos na máquina pública são loteados, ao arrepio da eficiência e da ética, de acordo com o quinhão de cada partido da base governista, com algumas escolhas de exclusividade do chefe do Executivo).
     A presidente Dilma Rousseff é uma figura pública digna. Nada tem de cínica. Aliás, o tom contundente, seco e direto, que fez sua fama na época da casa Civil, é sinal de franqueza e afasta qualquer suspeita de dissimulação.
Contudo, um presidente da República não tem o direito de ser ingênuo. Nem complacente. Pela mesma razão que um chefe não pode estar isento quando seus subordinados erram – e principalmente se erram tanto, com valores tão absurdos. Se não os coibiu e puniu, é igualmente culpado. Quando se trata de autoridade, a omissão é crime de responsabilidade.
Se a presidente não afastar o ministro, deixará de merecer o adjetivo benevolente para ser considerada conivente – e, portanto, responsável - com os descaminhos de um Ministério (dos Transportes) que há muito se tornou um foco de corrupção em meio a essa degradada, ineficiente e cada vez mais perdulária máquina pública federal.
Por Nilson Mello



terça-feira, 5 de julho de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

Ainda sobre a fusão

    O empresário Luiz Eduardo Simões Lopes enviou o seguinte comentário sobre o artigo de ontem deste blog, sobre a fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour:

"Pertinente e inquestionável. O BNDES vem prestando um deserviço concedendo crédito a quem não merece, e é clara a "motivação" política de tais empréstimos. Já concedeu um empréstimo de igual monta para que um frigorífico brasileiro "comprasse" um falido frigorífico norte americano, num mercado em que carne vem deixando o prato da população (não será mais possível criar um "novo hamburger"), para talvez agradar os
gestores da economia americana, criando empregos para os "pobres norte americanos".
Justificativa dos dirigentes do BNDES: 'O Brasil precisa ter empresas multinacionais'(talvez tenham citado, transnacionais)! Quem diria, o PT se empenhando em criar as - no passado - odiadas multinacionais (...)   
Enfim, é lamentável que o BNDES conceda empréstimos a empresas brasileiras, a taxas de juros subsidiadas (bem abaixo das taxas que o próprio Tesouro capta), a empresários que, teoricamente, não precisariam dessas benesses por serem ironicamente, competentes".

segunda-feira, 4 de julho de 2011

COMENTÁRIOS DO DIA

A fusão e a burocracia







     A onda de fusões e o maior grau de intervencionismo na economia brasileira estariam sendo promovidos por um esforço consciente de ressurreição do capitalismo de Estado? A pergunta – em claro tom de insinuação – é do economista Paulo Guedes, em seu artigo no jornal O Globo (ver link abaixo deste texto) desta segunda-feira (04/07).
O comentário da última sexta-feira deste blog salientava justamente o caráter nocivo das intervenções estatais na economia e da participação do Poder Público em iniciativas eminentemente privadas.
Em particular, criticava o despropósito da participação do governo, via aporte de até R$ 4,5 bilhões do BNDES, na possível fusão entre o Grupo Pão de Açúcar e o francês Carrefour.
A eventual fusão geraria concentração de mercado, o que vai contra os interesses de fornecedores, consumidores e, claro, da própria economia brasileira.
Sabe-se desde já que, se a união for efetivada, os dois gigantes dominarão 70% do varejo do Estado de São Paulo, o maior do país e referência para os demais estados. Todas as indústrias fornecedoras do setor varejista estão preocupadas com a operação, informa reportagem o jornal O Estado de S. Paulo deste domingo (03/07).
No que isso pode ser bom para a economia nacional é uma questão que o Dr. Luciano Coutinho, presidente do BNDES, deveria se preocupar. Burocrata tem mania de grandeza. Sobretudo burocrata de Brasília e de banco estatal.
Certo ministro disse que a fusão era necessária para aumentar o grau de inserção do Brasil na economia mundial. Seria uma “operação estratégica para o país”, portanto, justificando a liberalidade do BNDES com os recursos do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador. Ora, o Pão de Açúcar já tem um sócio estrangeiro (o grupo Casino) e não se tem notícia das vantagens dessa associação para o país.
Reconheçamos a capacidade de persuasão do empresário Abílio Diniz, controlador do Pão de Açúcar. Contra todas as evidências, convenceu o governo da “nobreza” da operação.
Mas, num cenário de forte concentração de mercado, como o que resultaria da fusão, os consumidores estariam mais ou menos protegidos? A economia sairia mais ou menos fortalecida? As respostas são óbvias.
E é por essas e outras que o Estado não deve ser aliado do capital. Até porque, se o ambiente legal for propício ao florescimento e o desenvolvimento da livre iniciativa, com regras claras, os benefícios para a economia serão indissociáveis. O Estado não precisa se intrometer ou participar.
O problema é que o ambiente no Brasil vai no sentido contrário, de desestímulo à livre iniciativa. Primeiro porque as regras, além de não serem claras, impõem injustificáveis obrigações ao empreendedor. Segundo, porque os contratos nem sempre são respeitados – como se observa no caso em questão. (Aliás, Roberto Campos costumava dizer que, num país onde os contratos não são respeitados, até o passado é incerto). Terceiro, porque a nossa precária infraestrutura impõe pesados custos às empresas, minando a sua eficiência e a sua competitividade.
A burocracia de Brasília, contudo, acha que colocar dinheiro público num negócio privado é promover a economia brasileira no exterior. Ainda que a operação seja questionável não apenas pelo aspecto concorrencial, mas pelos evidentes indícios de quebra de contrato.
O capitalismo de Estado, fruto desse planejamento burocrático, “elege” parceiros na iniciativa privada, em detrimento da ampla concorrência e da eficiência econômica.
Aumentar a participação de empresas brasileiras no mercado global deve ser, de fato, uma preocupação estratégica. Porém, para alcançar esse objetivo, basta o governo se empenhar em reduzir os custos da cadeia produtiva, dando-lhe condições de ser mais eficiente e competitiva. O objetivo passa pela redução de tributos, pela modernização da legislação trabalhista, pela eliminação da burocracia kafkiana e, sobretudo, por mais investimentos na infraesturuta logística.
O BNDES poderia, por exemplo, colocar esses R$ 4,5 bilhões reservados para o Pão de Açúcar a serviço da modernização dos saturados portos brasileiros.
Que tal, Dr. Luciano Coutinho?

Por Nilson Mello




Itamar Franco



A contribuição do ex-presidente Itamar Franco para o desenvolvimento do Brasil nas últimas duas décadas é inquestionável. O Plano Real, que controlou a inflação e lançou as bases para a estabilidade econômica, foi urdido em seu governo depois de décadas de crises e planos antiinflacionários fracassados.
A proeza foi ainda maior se considerarmos que o momento político era conturbado – na melhor das hipóteses, denso - em função do afastamento de Fernando Collor da Presidência, no que até então podia ser considerado um escândalo de corrupção sem precedentes no país (a trajetória republicana veio se superando nesse aspecto, infelizmente).
Itamar Franco enfrentava, portanto, um ambiente de desconfiança. Como fora eleito como vice na chapa de um presidente com quem tinha pouca ou nenhuma afinidade, sua legitimidade também chegou a ser questionada. Por tudo isso – e um certo receio de assumir desafios tão grandes – conta-se que pensou em antecipar as eleições, e a sua saída do governo.
Para completar, era visto com descrédito devido ao seu jeito arredio e meio matuto.
No final das contas, foi uma grata surpresa para o país; e a História, se justa, não deixará de lhe atribuir os devidos créditos. 

Por Nilson Mello

sexta-feira, 1 de julho de 2011

COMENTÁRIO DO DIA

Uma estranha fusão

       


Nada é mais prejudicial ao mercado, aos consumidores e, por conseqüência, à própria economia do que a ausência de concorrência. Sem ela não há garantia de que os produtos e serviços ofertados à sociedade terão a esperada qualidade. Nem de que seus preços não serão abusivos.
Eis porque as economias capitalistas procuraram estruturar sistemas e mecanismos de defesa do mercado, preservando um ambiente de ampla (ou mais ampla possível) competição.
O princípio básico que orienta esse sistema, no final das contas, é o mérito: obtém mais sucesso a empresa que oferece o melhor produto ou serviço pelo preço mais competitivo.
Se não fosse assim, essas economias capitalistas tenderiam à ineficiência tanto quanto uma economia planificada. Os países do antigo bloco soviético foram o “melhor” exemplo dessa ineficiência. E por isso seus regimes ruíram.
Contudo, interferências estatais que geram ineficiência não caíram em desuso com o fim da Era Soviética. E continuam trazendo malefícios à economia, justamente porque não valorizam regras claras de mercado que possam proteger os consumidores.
O anunciado apoio do governo brasileiro, com aporte de até R$ 4,5 bilhões do BNDES, à operação de fusão entre o Grupo Pão de Açúcar e o Carrefour é um exemplo dessas interferências estatais indevidas. 
O governo argumenta que o apoio é uma forma de estimular um grupo nacional a conquistar mercado no exterior. Alega ainda que é um bom negócio e que o BNDES terá lucro com a operação. Mas, na verdade, o melhor caminho para que empresas brasileiras aumentem sua presença no exterior é a adoção de medidas, pelo governo, que lhes permitam ser mais competitivas e eficientes.
Entre essas medidas estão a redução e a simplificação de tributos, bem como o aumento dos investimentos em infraestutura, eliminando os gargalos hoje existentes – gargalos de alto custo para a nossa cadeia produtiva.
O efeito colateral, no Brasil, dessa possível fusão é a concentração de mercado, o que evidentemente compromete a concorrência, com prejuízo direto para o consumidor.
Outra questão a avaliar é: se de fato a fusão é um bom negócio, por que os bancos privados não se interessaram por ela?
Em suma, eis aí mais um caso que reflete o modelo de desenvolvimento ultrapassado que o PT adotou para a economia do país. Um modelo que privilegia um capitalismo de Estado (o Poder Público elegendo os grupos que terão sua ajuda, tornando-se seu cúmplice nos negócios), em detrimento de um capitalismo de mercado, centrado na ampla liberdade de concorrência e, portanto, no mérito e na eficiência.

Em tempo: e aqui não se entra sequer no mérito se a fusão é ilegal, tendo em vista evidente prejuízo a um dos acionistas.